Ex-presidente e juízes do Supremo defenderam Neto de Moura no processo disciplinar

Noronha Nascimento e outros juízes conselheiros sustentaram que Conselho Superior de Magistratura não pode punir magistrados por conteúdo de uma decisão judicial. O argumento é usado pela defesa de Neto de Moura no recurso apresentado esta quarta-feira no Supremo.

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Noronha Nascimento, o antigo presidente do Supremo, foi um dos defensores do juiz Neto de Moura Nuno Ferreira Santos

Cerca de uma dezena de magistrados das mais altas instância judicial, incluindo do Supremo Tribunal de Justiça, uns aposentados, outros no activo, depuseram a favor de Neto de Moura, no âmbito do processo disciplinar que condenou o juiz da Relação do Porto, que ficou conhecido pelo acórdão da “mulher adúltera”, a uma pena de advertência registada. Alguns, como o antigo presidente do Supremo Noronha Nascimento, sustentaram que Conselho Superior de Magistratura não tem competência para punir os juízes, que gozam de independência, pelo conteúdo de uma decisão judicial.

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Cerca de uma dezena de magistrados das mais altas instância judicial, incluindo do Supremo Tribunal de Justiça, uns aposentados, outros no activo, depuseram a favor de Neto de Moura, no âmbito do processo disciplinar que condenou o juiz da Relação do Porto, que ficou conhecido pelo acórdão da “mulher adúltera”, a uma pena de advertência registada. Alguns, como o antigo presidente do Supremo Noronha Nascimento, sustentaram que Conselho Superior de Magistratura não tem competência para punir os juízes, que gozam de independência, pelo conteúdo de uma decisão judicial.

Este é um dos argumentos usados pela defesa de Neto de Moura no recurso apresentado esta quarta-feira no Supremo, onde pede que seja invalidada a sua punição. “Estes juízes ofereceram-se para depor porque ficaram muito incomodados com o primeiro impacto que teve este caso”, explicou ao PÚBLICO o advogado de Neto de Moura, Ricardo Serrano Vieira.

Noronha Nascimento e mais cinco juízes de tribunais superiores - quatro aposentados e dois no activo - divulgaram em Novembro de 2017, menos de um mês após o início da polémica do acórdão da “mulher adúltera”, uma carta aberta intitulada “As exigências da independência do poder judicial”. Os quatro conselheiros e dois desembargadores insistiam que a “independência dos juízes não é um privilégio destes, mas uma garantia dada aos cidadãos” sobre a imparcialidade e a isenção do poder judicial. “Qualquer sentença ou acórdão (quer na motivação quer na decisão) só é atacável por via de recurso não sendo sindicável por qualquer outro meio”, defendiam os juízes. Os magistrados diziam ainda que ao tomar uma decisão o juiz não precisa de ser politicamente correcto, mas tem de “usar particulares cautelas nas suas formas de expressão não exorbitando os princípios constitucionais e legais a que está vinculado”. Terminavam defendendo que a liberdade de expressão consagrada na Constituição não é ampla para os cidadãos e restrita para os juízes, mas alertando os magistrados judiciais de que na sua actuação e decisões têm de ser comedidos “por forma a gerar confiança na Justiça a todos que a ela recorrem e aos cidadãos em geral”. 

A defesa do magistrado da Relação do Porto, que, entretanto, foi transferido de uma secção criminal para uma cível, considera igualmente que houve uma violação do princípio da igualdade, já que os dois acórdão relatados por Neto de Moura visados pelo processo disciplinar foram assinados, cada um, por mais um juiz e nenhum deles foi punido. “Se os juízes que co-assinaram os acórdãos não foram punidos, o juiz Neto de Moura também não pode sê-lo”, argumenta Ricardo Serrano Vieira.

O advogado queixa-se que as declarações consideradas violadoras dos deveres do juiz foram descontextualizadas, tratando-se de referências genéricas feitas no âmbito do dever de fundamentação e que não se dirigem para as duas vítimas dos dois casos de violência doméstica que estavam em análise. Ricardo Serrano Vieira fala, por isso, num erro na apreciação da matéria de facto analisada no processo disciplinar. “Não houve erro nem negligência grosseira do senhor juiz, logo não pode haver sanção disciplinar”, defende o advogado.

Bíblia, adultério, moca com pregos

O caso da “mulher adúltera” remonta a Junho de 2015, altura em que depois de sequestrar a vítima, um homem com o qual mantivera uma relação extraconjugal chamou o ex-cônjuge desta para a confrontarem os dois. Acabaram por a agredir com uma moca com pregos.

“O adultério da mulher é uma conduta que a sociedade sempre condenou e condena fortemente (e são as mulheres honestas as primeiras a estigmatizar as adúlteras), e por isso vê com alguma compreensão a violência exercida pelo homem traído, vexado e humilhado pela mulher”, escreveu Neto de Moura no polémico acórdão, também assinado por Luísa Arantes.

“O adultério da mulher é um gravíssimo atentado à honra e dignidade do homem. Sociedades existem em que a mulher adúltera é alvo de lapidação até à morte. Na Bíblia, podemos ler que a mulher adúltera deve ser punida com a morte. Ainda não foi há muito tempo que a lei penal [de 1886] punia com uma pena pouco mais que simbólica o homem que, achando a sua mulher em adultério, nesse acto a matasse”, diz o magistrado na mesma decisão, que desencadeou manifestações públicas de repúdio quando se tornou conhecida.