Eco2blocks: a startup que quer usar lixo para limpar a indústria do cimento

A Eco2blocks nasceu na UBI e quer tornar a indústria do cimento "mais limpa". Como? Com blocos de construção feitos a partir de resíduos e água não potável. A ideia ganhou agora o Prémio Manuel António da Mota e valeu a entrada num programa de startups da UPTEC.

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João Castro Gomes e Pedro Humbert DR

Substituir recursos naturais por resíduos para obter resultados semelhantes. É o que propõe Pedro Humbert, estudante de doutoramento da Universidade da Beira Interior (UBI), com a Eco2Blocks: um projecto que cria uma alternativa — ou um complemento — ao cimento. É entre a UBI e o Parque da Ciência e Tecnologia da Universidade do Porto (UPTEC) que, por estes dias, a Eco2Blocks divide o trabalho, agora que a empresa está inserida no programa Escola de Startups, depois de ter vencido o ClimateLaunchpad e, mais recentemente, o Prémio Manuel António da Mota.

A ideia surgiu no âmbito do doutoramento na área de desenvolvimento de materiais ambientalmente sustentáveis. Pedro, natural de Salvador, Brasil, e em Portugal desde 2016, e o orientador, João Castro Gomes, professor catedrático do departamento de Engenharia Civil e Arquitectura da UBI, decidiram “estudar materiais que podiam endurecer" na presença de dióxido de carbono [CO2]. E juntos chegaram à conclusão que podiam criar um material semelhante ao cimento, mas mais sustentável e menos poluente.

“O processo produtivo do bloco de cimento tradicional consome bastante energia e emite muito CO2, ao mesmo tempo que usa matérias-primas naturais como a água potável, a areia de rios, por exemplo, e a brita”, explica o investigador de 27 anos. Por seu turno, o material que desenvolveram utiliza “apenas resíduos industriais, que são misturados com água não potável — residual ou do mar”. Para se transformar num bloco de construção, o composto é colocado num ambiente criado especificamente para o fazer endurecer, onde o CO2 é predominante: “É um processo de carbonatação, ao contrário do cimento, que endurece a partir de um processo de hidratação.”

Pedro sublinha que as vantagens não são só ambientais, mas também económicas: “O custo de produção é cerca de 50% mais barato quando se trata especificamente de blocos. Quando são materiais de construção com mais demanda técnica, como vigas, pilares ou lajes, o custo de produção pode ser ainda inferior.” Actualmente, os blocos existem apenas num formato reduzido, mas o investigador prevê que o primeiro protótipo industrial esteja pronto nas próximas semanas.

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O produto final é “semelhante” a um bloco de cimento convencional. As diferenças residem na cor, densidade e resistência. “Inicialmente, a densidade era um pouco maior", diz o jovem brasileiro, o que fazia com que o novo bloco pesasse mais do que o cimento. No entanto, sublinha Pedro, "a resistência era cinco vezes maior do que a do tradicional”. Estes factores permitiram que os investigadores fizessem alterações na espessura, fazendo com que o bloco ficasse com o mesmo peso que o bloco de cimento, a mesma aplicação técnica e mantivesse uma resistência maior. “Os blocos resistem a temperaturas até 900ºC, enquanto o cimento suporta até 400ºC”, conclui.

O objectivo dos criadores não é, contudo, assumirem-se como competidores da indústria do cimento, mas sim como parceiros. “Queremos complementar, tornar a indústria do cimento mais limpa e encontrar nela um potencial parceiro para nos ajudar a desenvolver a nossa tecnologia”, afirma Pedro. Até porque não é possível — para já — fazer uma construção completa com os blocos: “Tudo o que dá para ser pré-fabricado pode ser construído com a nossa tecnologia mas, por exemplo, a argamassa que junta um bloco ao outro tem que ser de cimento”, explica. “Actualmente trabalhamos apenas com aplicações não estruturais, mas estamos a desenvolver investigação para o ramo das peças estruturais, que têm mais detalhes técnicos e demoram mais a ter certificação.”

startup já recebeu várias distinções: no final de Novembro veio o Prémio Manuel António da Mota, no valor de 50 mil euros, e para trás ficou a vitória na edição nacional e internacional do programa ClimateLaunchpad de 2018, o que lhes valeu 15 mil euros. “Com o montante vamos começar a realizar etapas como a produção-piloto e vamos poder aprofundar investigações necessárias para melhorar”, refere o investigador. O ClimateLaunchpad garantiu-lhes também o acesso à Escola de Startups da UPTEC e a um programa de aceleração — o Climate-Kic — que lhes vai proporcionar assessoria e mentoria para acelerar e impulsionar a startup no mercado. 

Pedro acredita que no início do próximo ano, “por volta de Março”, a produção-piloto já estará pronta e certificada. Depois da certificação, "o material vai começar a ser comercializado e utilizado na indústria". E, quem sabe, a torná-la "mais limpa".

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