Presidente da Câmara de Gaia condenado por difamar e injuriar ex-adjunto

Na base da condenação estão dois textos insultuosos que Eduardo Vítor Rodrigues publicou no Facebook, em Agosto de 2016.

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Eduardo Vitor Rodriguesé membro do secretariado nacional do PS Joana Goncalves

O autarca socialista Eduardo Vítor Rodrigues, que preside à Câmara de Vila Nova de Gaia, foi condenado nesta quarta-feira pelo Tribunal de Gaia a 90 dias de multa, a dez euros por dia, pela prática dos crimes de difamação e injúria, na sequência de uma queixa-crime que o seu ex-adjunto Bruno Santos apresentou no Ministério Público (MP), em 2016. O presidente de Câmara de Gaia terá também de pagar ao seu antigo adjunto uma indemnização de 1200 euros, apurou o PÚBLICO. 

Em causa estão dois textos com insultos que o autarca publicou no Facebook, em Agosto de 2016 e que, na opinião de Bruno Santos — e do MP — tinham como alvo este ex-colaborador, que Eduardo Vítor Rodrigues demitira um mês antes.

A Câmara de Gaia não se quis pronunciar sobre a decisão judicial.“[Não há] nada a comentar, pois a decisão ainda não transitou em julgado. Está a ser analisada para efeitos de recurso”, diz fonte do gabinete do comunicação da autarquia. Pouco tempo depois desta resposta, Eduardo Vitor Rodrigues escrevia no Facebook que tinha recorrido da sentença. “Quem diz a verdade não merece castigo. O senhor pedia 50 mil euros para repor a honra. A tal honra valeu 1200 euros. Mesmo assim é muito! Recorri para reavaliar o teatro e mentira que aconteceu no tribunal. Prefiro ser chateado por dizer umas verdades a um tratante do que ser corrupto”, escreve o autarca.

Eduardo Vitor Rodrigues acrescentou sobre o queixoso: "O senhor em questão está a ser investigado pelo Ministério Público por alegada falsificação de assinatura e terá ainda que explicar um alegado recebimento ilícito de subsídio de desemprego, quando recebia umas massas de uma câmara do norte (coisa descoberta durante o processo)”.

Já Bruno Santos mostra-se “satisfeito por ter sido feita justiça”. “O presidente da Câmara de Gaia foi condenado pelo tribunal, na sequência da queixa que apresentei no Ministério Público, e isso não pode deixar de me dar satisfação, mas, por outro lado, também não deixo de ficar apreensivo e triste por termos à frente de uma das maiores câmaras do país um condenado”, afirmou.

O ex-adjunto do autarca diz esperar que “esta condenação constitua um sinal para as pessoas que estão em cargos de poder tenham comportamentos compatíveis com as responsabilidades públicas que desempenham. “Numa democracia, numa República não podem caber comportamentos de prepotência de ataque pessoal a adversários políticos, como foi o caso", diz, acrescentando que esta "sentença fique como exemplo para todos aqueles que se consideram acima da lei e que podem pôr e dispor do poder em que estão investidos de qualquer maneira”.

Pouco depois das eleições autárquicas de 2013, Bruno Santos foi nomeado para adjunto do gabinete de apoio à presidência, sendo responsável pela área da cultura, relações internacionais e comunicação, além de algum trabalho mais quotidiano ligado ao atendimento dos munícipes. Um ano depois, as relações entre os dois socialistas começaram a degradar-se e Eduardo Vítor acabou por afastá-lo, transferindo-o para o gabinete do vereador da Cultura, Delfim Sousa, onde Bruno Santos ficou um mês e meio, até ser exonerado a 25 de Julho de 2016.

Na véspera do afastamento, o antigo colaborador chegou a ser impedido pela segurança da autarquia de entrar na Casa da Presidência do município, para participar numa reunião de trabalho. Dias antes, Bruno Santos publicara no blogue Aventar um texto no qual se insurgia contra a “distinção bizarra” concedida pelo município a Marco António Costa, o ex-vice-presidente da Câmara de Gaia a quem foi atribuída a medalha de mérito profissional. “É um erro político clamoroso e um gesto em tudo contraditório com os valores e os princípios de que o PS é digno baluarte”, escreveu Bruno Santos.

A partir do dia 28 de Agosto tudo se complicou. Eduardo Vítor Rodrigues publicou no Facebook um texto intitulado Gollum ou culambismo, propondo-se “ajudar a operacionalizar empiricamente uma suposta categoria social criada pelo ‘grande Miguel Esteves Cardoso’. A categoria social designada ‘lambe-cus’”. Dois dias depois, o autarca assinou um segundo texto, também no Facebook, no mesmo registo. São estas publicações que dão origem à queixa-crime apresentada em Setembro.

“O culambismo é uma vigarice intelectual e uma sacanice operacional que prolifera nas instituições, massajando o ego dos chefes que gostam disso. É apenas um pedaço de gente mal formada e que ocupa lugares importantes por efeito de escolhas mal feitas (mea culpa)”, escrevia Eduardo Vítor, que faz parte do secretariado nacional do PS.

O autarca do PS usava termos como “vigarista” e “corrupto” para atacar o seu alvo, dizendo que “o lugar dos lambe-cus oportunistas e desleais (…) é na rua”. E defendia que “os impostos (…) não podem pagar desleais massagistas de hemorróidas dos chefes”. “Preciso de quem trabalhe pelo município de forma competente, crítica e solidária venha de onde vier. Quem não o fizer, mesmo sendo socialista, não tem lugar e vai para a rua”, acrescentava.

“Parasitas modernos, sabonetes de banho”

O nome de Bruno Santos nunca é referido nos textos, mas o autor assume que “é dedicado" a alguém "em concreto” e que ele sabe quem é. “Mas para já não identifico a criatura”, escreve.

No dia seguinte ao primeiro texto do autarca, o seu antigo adjunto usa o blogue Aventar para o acusar de não ter coragem de escrever o seu nome. “Toda a gente do meio político e municipal percebeu que o texto se dirigia a mim, mas o professor doutor Eduardo Vítor Rodrigues foi capaz de montar um ataque pessoal e político do mais violento e ignominioso que tenho visto, sem ter tido a coragem mínima de dar nome ao alvo da sua fúria, sem ter escrito uma única vez o meu nome”.

O presidente da câmara, que é membro do secretariado nacional do PS, chegou mesmo a desafiar o seu antigo adjunto para um confronto cara a cara: “Se tudo isto não chegar, (…) espero pela próxima comissão política concelhia [do PS]. Se o tratante aparecer aí, desafio-o para um debate a dois (…) é só aceitar e marcar dia e hora”.

A leitura da sentença foi feita na manhã desta quarta-feira, mas Eduardo Vítor Rodrigues não esteve presente, apenas o seu advogado, Carlos Dias.         

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