Ex-ministro Rui Pereira diz que processo contra Salvato Trigo não devia existir

Parecer pedido pela defesa está anexo ao recurso. Em causa está o facto de o crime imputado ao reitor da Universidade Fernando Pessoa depender de queixa e esta não ter sido feita pela administração presidida pelo próprio Salvato Trigo.

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Rui Pereira é ex-ministro e professor universitário especializado em Direito Penal Daniel Rocha

O ex-ministro Rui Pereira, professor do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa e especialista em Direito Penal, defende, num parecer pedido pela defesa do reitor da Universidade Fernando Pessoa, que o processo-crime em que Salvato Trigo foi acusado por um crime de infidelidade nem sequer devia ter sido instaurado pelo Ministério Público (MP).

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O ex-ministro Rui Pereira, professor do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa e especialista em Direito Penal, defende, num parecer pedido pela defesa do reitor da Universidade Fernando Pessoa, que o processo-crime em que Salvato Trigo foi acusado por um crime de infidelidade nem sequer devia ter sido instaurado pelo Ministério Público (MP).

Tendo o MP avançado com a acusação, o processo devia ter sido arquivado quando o conselho de administração da fundação que detém a universidade — controlado ainda hoje pela família Trigo — aprovou, em Janeiro de 2017, a desistência de queixa.

Em causa está o facto de Salvato Trigo ter sido acusado de um crime de infidelidade, um ilícito que depende da queixa da entidade lesada, neste caso a fundação Fernando Pessoa. Salvato Trigo foi condenado por ter montado para desviar dinheiro da fundação através de uma empresa familiar da qual era gerente.

Acontece que até hoje o conselho de administração da Fernando Pessoa é presidido por Salvato Trigo, o que levou o MP a avançar com a acusação, invocando o interesse público. Rui Pereira admite no seu parecer, anexo ao recurso, que existe um regime especial que permite ao MP instaurar o procedimento criminal mesmo sem a queixa, quando este direito “não pode ser exercido porque a sua titularidade caberia apenas ao agente do crime”.

No entanto, sustenta, que, neste caso, o direito de queixa não é de Salvato Trigo, que preside ao conselho de administração da fundação, mas desse órgão colegial. Omitindo que os outros dois membros da administração são a mulher e a filha do reitor, que também chegaram a ser arguidas neste caso, Rui Pereira defende: “O presente procedimento criminal nem sequer devia ter sido instaurado, na medida em que o presidente do conselho de administração da Fundação Ensino Cultura Fernando Pessoa não era titular exclusivo do direito de queixa." E completa: “Na verdade, nem sequer era titular desse direito, atribuído ao conselho de administração."

Mas tendo o processo sido instaurado pelo MP, diz Rui Pereira, o tribunal devia ter aceitado a desistência pedida pela própria fundação, que se constituiu assistente neste caso. Tal aconteceu tanto na fase de instrução, em que um magistrado decidiu levar a julgamento o reitor da Fernando Pessoa, como durante o julgamento, tendo em ambas as situações os juízes recusado o pedido. Tal motivou dois recursos da defesa para a Relação do Porto, ainda sem decisão.

A questão volta a ser levantada no recurso da condenação. Rui Pereira destaca que o conselho de administração da fundação, em Janeiro de 2017, “decidiu por unanimidade” e, na ausência de Salvato Trigo que se considerou impedido de participar na votação, desistir do procedimento criminal. Ou seja, a mulher e a filha de Salvato Trigo decidiram desistir da queixa contra o familiar. E que, por isso, o caso deveria ter sido encerrado.

Uma interpretação das normas do Código Penal que contrarie esta tese, defende o professor universitário, viola várias normas da Constituição, nomeadamente o princípio da legalidade. Estas alegações abrem a porta a que a defesa, se perder o recurso na Relação do Porto, ainda tenha possibilidade de recorrer para o Tribunal Constitucional.