A paz que o menino Salvador traz ao pesadelo de Sobral

Um dos desafios que o novo paradigma de comunicação (social media vs. mass media) e os novos comportamentos de visionamento (ativo vs. passivo) provoca no único formato audiovisual que, tendo nascido no velho paradigma, vive e triunfa no novo — o videoclipe —, é o facto de o espetador atual não querer só ver. Melhor, já não querer apenas apreciar umas soltas e bonitas imagens ao som da música. Ele quer afetar-se e, sobretudo, ligar-se. Ou seja, sentir-se impulsionado a partilhar/comunicar socialmente. Quer isto dizer que, hoje, uma mais efetiva significação das imagens e das suas narrativas, assim como o seu aparato lúdico ou surpreendente, ativam tanto ou mais que o gosto musical no contexto social. Posto isto, três dos videoclipes que esta semana chegaram a VIDEOCLIPE.PT, seriam o exemplo do velho paradigma, ao proporem dispersos, embora bonitos, quadros visuais para a figura dos interpretes: de Elisa Rodrigues, de Lince, e de Salvador Sobral, com este Cerca del Mar aqui destacado – apesar de o menino que protagoniza se chamar Salvador Ferraz. No entanto, este último, além da encantatória beleza das imagens de referência cinematográfica (é inevitável invocar o icónico sonho no final do filme A Infância de Ivan), que se cola perfeitamente à leveza deste tema e ao liberto esvoaçar do canto de Salvador, ainda doseia alguns segmentos em função das vagas emocionais da música, permitindo uma leitura narrativa. Isto porque os seus autores (a própria companheira de Salvador, a atriz Jenna Thiam, e o realizador Daniel Mota — este já aqui destacado com uma evocativa ficção), desenlaçam o vídeo com uma das mais belas imagens dos videoclipes nacionais recentes, a qual pacifica e dá sentido onírico a toda a desordem anterior. Ou não fosse isso também uma bela metáfora da modernidade e do sentido de improvisação do jazz.

Texto escrito segundo o novo Acordo Ortográfico, a pedido do autor.

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