Costa já lá esteve e Marcelo também vai, porque Perguntar não Ofende

É jornalismo? É opinião? É uma entrevista? É uma conversa? Um debate de ideias? O podcast de entrevistas da autoria de Daniel Oliveira é tudo isto e ocupou com sucesso um espaço que não tinha senhorio em Portugal.

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Daniel Rocha

Não é jornalismo, tal como os códigos o definem, mas não deixa de ser jornalismo. É uma entrevista, mas não é só uma entrevista, é também um debate com confronto de ideias e opiniões. É uma conversa viva e sem jogo escondido em que o entrevistador quer perder sempre para o entrevistado. E isso acontece quando o desafiador consegue que o convidado diga o máximo sobre um tema que domina. Perguntar não Ofende, o podcast de Daniel Oliveira, é também um sucesso. Pelos convidados que conseguiu e pelas audiências obtidas em apenas três meses.

Começou em Maio, com António Costa como entrevistado, e vai para férias no final deste mês. Regressa em Setembro, com Marcelo Rebelo de Sousa. Um projecto inédito em Portugal, que se pode gabar de, pela primeira vez, conseguir que um primeiro-ministro e um Presidente da República dêem uma entrevista em formato podcast (programa áudio distribuído pela Internet).

O jornalista Daniel Oliveira tinha saudades de ser jornalista. Ainda que regresse à profissão de tempos a tempos, a sua ocupação quase diária era (e é) a de comentador político. E, confessa, “estava farto de ser só isso”. Gosta do que faz, mas faltava-lhe o jornalismo. Em Maio encontrou a solução e avançou com um podcast de entrevistas, quase sempre sobre política, mas investindo também em outras áreas, disponível às quartas-feiras.

Estabeleceu balizas: que os convidados fossem pessoas que ele próprio tivesse “interesse em ouvir sobre determinado tema”; conseguir um diálogo em que o entrevistador fosse o mais longe possível num tema que domina, “exibindo os seus melhores argumentos”, e que fosse “um debate sem rasteiras” e sem “objectivos demagógicos”, como “demonstrar que estamos rodeados de aldrabões”.

Por isso, garante ao PÚBLICO, todos os seus convidados, concordando ou discordando deles, foram pessoas que considera “não serem aldrabões e que tinham algo a dizer com interesse para os ouvintes”.

Pelos dez programas do Perguntar não Ofende já passaram António Costa, o também socialista e secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares Pedro Nuno Santos, o dirigente do CDS Adolfo Mesquita Nunes, a coordenadora do BE Catarina Martins, o jornalista e director da SIC Ricardo Costa, o humorista e escritor Ricardo Araújo Pereira e o escritor e politólogo Jaime Nogueira Pinto, entre outros.

Objectivos cumpridos

Com a primeira série do programa a chegar ao fim, Daniel Oliveira diz-se “muito satisfeito” com os resultados obtidos, porque, acima de tudo, “cumpriu os objectivos traçados.”

“É um espaço de jornalismo com opinião, mas não deixa de ser jornalismo. O facto de o entrevistado conhecer a minha opinião enquanto comentador liberta-o para ir mais longe no tema abordado. Tudo feito às claras, [num formato] em que as opiniões não estão escondidas atrás das perguntas. Não tenho por objectivo entalar ninguém, mas também não é um programa fofinho. Muitas vezes faço o papel de advogado do diabo. Procuro ser uma espécie de lebre que tenta levar os convidados mais longe do que costumam ir num tema que dominam”, explica o autor.

Também não é um programa “contra a comunicação social", mas parte da ideia de que havia espaço para esta “nova forma de fazer jornalismo” que, “por ser feito por um jornalista que está fora de uma redacção”, lhe permite “ser diferente”. E o ser “independente de uma redacção” permite-lhe liberdades a que um órgão de comunicação social está obrigado, como “ser pluralista nas pessoas que escolhe para entrevistar.”

Dos programas que já foram para o ar, Daniel Oliveira diz que não gostou muito do que teve como convidado António Costa – “foi o primeiro e, por minha culpa, ficou muito em forma de entrevista”. Acha que no de Ricardo Araújo Pereira “o entrevistador falou de mais”, mas o mais difícil foi com Catarina Martins. “É uma pessoa que não conhece só as minhas ideias. Fui dirigente no Bloco de Esquerda com ela como líder e ela conhece-me muito bem. Por isso, até tive um discurso mais à esquerda do que o do BE, que ela sabia que não era verdadeiro, mas que foi uma forma de soltar mais a conversa.”

Oitenta mil downloads

A lista de convidados que aceitaram ir ao Perguntar não Ofende e a repercussão que este tem tido, nomeadamente nas redes sociais, revelam o seu sucesso. Mas este êxito é também atestado pelos números, com as entrevistas a terem já mais de 80 mil downloads, um número raro em Portugal em matéria de podcasts.

O mais ouvido foi o de Ricardo Araújo Pereira (cerca de 20 mil downloads) e o menos procurado foi o que teve como entrevistados os políticos e activistas brasileiros Tarso Genro e Guilherme Boulos (cerca de 9000).

Quando lançou o Perguntar não Ofende, Daniel Oliveira queria também avaliar até que ponto é possível desenvolver projectos independentes “de forma minimamente sustentável”. Criou a figura do “patrono” que, graças à contribuição de um, dois ou três euros, tem recompensas como poder ouvir as entrevistas com uma semana de antecedência ou ter detalhes de bastidores do trabalho.

A primeira série chega ao fim sem conseguir o objectivo da sustentabilidade, embora já consiga contributos de cerca de 300 euros por mês.

Este facto não impediu Daniel Oliveira de decidir já avançar para uma segunda temporada, que começa em Setembro com mais um convidado ilustre: o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. O objectivo passa agora por conseguir uma velocidade cruzeiro em termos de audiências, que permita a Daniel Oliveira convidar personalidades menos conhecidas, mas com ideias capazes de, semana a semana, o derrotarem.

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