BCP formaliza travão nos empréstimos ao futebol

Parceiro histórico do Sporting já tinha instruções para não aumentar exposição aos clubes. Agora, acaba de vez com os financiamentos a todo o sector.

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NUNO FOX

Depois de vários anos a financiar de forma expressiva vários clubes de futebol, o Millennium BCP já não o poderá fazer. Miguel Maya, o novo presidente-executivo, acaba de inscrever no regulamento interno que o banco não pode voltar a conceder empréstimos a clubes de futebol, não só pelo risco que incorporam, mas por não serem o seu core business (actividade estratégica).

Aliás, quando, em 2012, o BCP pediu três mil milhões de euros de fundos públicos para se capitalizar através da linha da troika, uma das condições impostas pelas autoridades europeias (em concreto, a DGComp) foi, precisamente, que o banco não aumentasse a sua exposição a clubes de futebol. Entretanto, em Fevereiro de 2017, o BCP liquidou a sua dívida ao Estado e as imposições de Bruxelas foram levantadas.

A decisão de Miguel Maya de inscrever agora no regulamento do BCP a proibição de dar financiamento aos clubes surge numa altura em que a relação do Sporting com a banca portuguesa se tornou explosiva.

Em Setembro de 2017 as responsabilidades do Sporting perante terceiros atingiam 330 milhões de euros. Deste bolo 220 milhões de euros eram dívidas da SAD (Sociedade Anónima Desportiva) leonina ao BCP e ao Novo Banco. A maior parte da exposição da SAD à banca, cerca de 130 milhões de euros, está relacionada com os VMOC (Valores Mobiliários Obrigatoriamente Convertíveis), enquanto os restantes 95 milhões de euros são empréstimos puros. Já as dívidas à banca do clube de Alvalade totalizam 80 milhões de euros.

Os VMOC são instrumentos criados no âmbito da reestruturação financeira da SAD que, segundo revelou o presidente do clube, Bruno de Carvalho, vão agora ser transformados em acções através de uma operação que retira os bancos do horizonte da SAD e coloca o clube com mais de 90% do capital. Uma conversão que se traduz num relativo perdão de dívida, dado que o valor na criação dos VMOC pressupunha que a cada euro de dívida correspondia um euro de capital (acção da SAD). Contudo, como o valor das acções tido em conta nesta conversão é inferior (30 cêntimos), essa diferença — de 130 para 40 milhões de euros — é o que representa o efectivo desaparecimento do valor inicial em dívida à banca. Uma operação que gerou críticas generalizadas e a que Nuno Amado, ex-CEO do BCP, respondeu: “O nosso critério é a defesa dos interesses do BCP”.

O BCP e o Novo Banco são os principais credores do Sporting com uma exposição idêntica, de cerca de 150 milhões de euros cada. A 30 de Abril de 2018, em artigo de opinião, o dirigente leonino Bruno de Carvalho revelava que o activo da Sporting SAD ascendia a 287 milhões de euros. Os 330 milhões de euros de responsabilidades assumidas perante terceiros incluem um empréstimo obrigacionista de 30 milhões de euros cujo pagamento foi adiado para Novembro, perante o actual cenário de turbulência no clube.

Já este mês foi tornado público que a SAD estava com dificuldade em levantar fundos no mercado, através da emissão de um empréstimo obrigacionista colocado junto do público em geral (com maturidade de dois anos e meio e uma taxa de juro proposta de 6%). Os 15 milhões de euros destinavam-se a financiar a actividade corrente, mas também investimentos na Academia Sporting, em Alcochete. A situação veio acentuar a pressão de tesouraria.

É neste quadro de maiores dificuldades financeiras que o Sporting vai celebrar, dentro de 12 dias, o seu 112.º aniversário. Entretanto, na semana passada, o auditor do Sporting, a PwC, informou a Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, que, na sequência das sucessivas rescisões de contrato por parte dos jogadores, a SAD entrara em situação de falência técnica: nove milhões de euros de capitais próprios negativos, decorrentes de redução do valor do plantel de cerca de 17 milhões de euros. 

Ontem, o Sporting tornou públicas as conclusões da PwC sobre o “impacto na gestão do risco de liquidez da SAD” das rescisões de vários jogadores da equipa principal, que foram consideradas pela PwC como “uma ameaça concreta em relação à continuidade das operações” da sociedade. A Sporting SAD considera, no entanto, que a “continuidade das operações da sociedade se encontra assegurada, encontrando-se a trabalhar para promover as operações necessárias à melhoria da performance económico-financeira”.

Refira-se que não é só a relação entre Sporting e BCP que chegou ao fim, em termos de novos financiamentos. Também o Benfica e o FC Porto têm estado sob pressão para liquidar financiamentos bancários do Novo Banco, Caixa ou BPI, cuja substituição tem sido assegurada através de emissões obrigacionistas ou pela simples amortização dos créditos através da utilização de receitas com vendas de jogadores ou antecipação de contratos com patrocinadores ou parceiros. com P.F.E.

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