Fundação Cupertino de Miranda dá passo em frente com a sua colecção do surrealismo

Centro Português do Surrealismo é inaugurado esta sexta-feira em Famalicão com uma selecção de obras da colecção da Fundação Gulbenkian. Com novo espaço e ambição renovada.

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Não é ainda o edifício “Romeu & Julieta” que Eduardo Souto de Moura desenhou em 2011, e que a Fundação Cupertino de Miranda (FCM) não conseguiu concretizar, até ao momento. Mas enquanto espera a reunião das condições materiais e orçamentais para esse fim, a fundação famalicense avança agora um novo passo na inscrição da sua colecção dedicada ao surrealismo na cena artística nacional.

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Não é ainda o edifício “Romeu & Julieta” que Eduardo Souto de Moura desenhou em 2011, e que a Fundação Cupertino de Miranda (FCM) não conseguiu concretizar, até ao momento. Mas enquanto espera a reunião das condições materiais e orçamentais para esse fim, a fundação famalicense avança agora um novo passo na inscrição da sua colecção dedicada ao surrealismo na cena artística nacional.

Esta sexta-feira, a fundação inaugura o Centro Português do Surrealismo (CPS), localizando-o num novo (e maior) espaço no seu edifício-sede no centro de Famalicão. E fá-lo com a exposição O Surrealismo na Colecção Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, que associa 67 obras desta instituição a outra selecção de meia centena de peças do acervo da FCM.

A própria criação do Centro Português do Surrealismo é já “um passo em frente sobre o Centro de Estudos do Surrealismo, um projecto com quase vinte anos e uma estrutura que tem vindo a consolidar-se ao longo do tempo”, diz ao PÚBLICO António Gonçalves (n. Famalicão, 1975), director artístico do CPS, num intervalo da montagem da nova exposição.

O curador e também artista – que há cerca de um ano mostrou a exposição Tentações de Santo Antão no CCB, em Lisboa – nota que a designação anterior “era ainda uma construção humilde”, mas “o novo nome tem outra força, outra ambição, e pode ajudar na continuação do trabalho” que a FCM vem fazendo desde que, em 1994, aí foi inaugurada a exposição Surrealismo (e não).

Até agora, a colecção de arte da fundação famalicense – que reúne desde o famoso tríptico A Vida, de António Carneiro, até valiosos acervos de figuras como Mário Cesariny de Vasconcelos, Cruzeiro Seixas ou Fernando Lemos – vinha sendo exibida no percurso em espiral da torre do edifício projectado pelo arquitecto Charters de Almeida. A partir desta sexta-feira, o novo CPS está instalado no primeiro piso, que para o efeito foi adaptado pelo arquitecto João Mendes Ribeiro – o autor da Casa da Escrita e da reabilitação da estufa tropical do Jardim Botânico, ambos em Coimbra, e co-autor, com o atelier Menos É Mais Arquitectos, do Arquipélago – Centro de Arte Contemporânea, em São Miguel, Açores.

A nova galeria, com uma área de cerca de 400 metros quadrados, significa um ganho em espaço bruto e mais ainda em espaço museológico, além de melhores condições de mobilidade para o visitante.

Cruzar duas colecções

É aí que António Gonçalves se preocupou em fazer a ligação d’O Surrealismo na Colecção Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian com peças da colecção da casa, cruzando obras dos mesmos artistas em ambos os acervos.

Referindo-se ao acervo da Gulbenkian agora reunido para ser mostrado em Famalicão, o curador considera que estas 67 obras representam “um estímulo à investigação e compreensão, quer de atitudes, quer de pensamentos, levados a cabo por autores que desafiaram a situação social e política da época, demonstrando audácia, inteligência e liberdade”.

O percurso da exposição abre com cinco obras de António Pedro, dos anos 1940-50, e a ligação das duas colecções é feita, curiosamente, com dois quadros, de 1932 e 1933, do surrealismo mais abstracto de Júlio (o artista que também foi o poeta Saúl Dias, e de quem o CPS recebeu recentemente uma doação de 400 peças).

Pelo meio, visitam-se obras de Cândido Costa Gomes, Ernesto Sampaio, Fernando Azevedo, António Maria Lisboa, Marcelino Vespeira (deste artista é mostrada a frágil e icónica escultura O menino imperativo, de 1952, mas também um cadavre exquis que realizou com Fernando Azevedo), além de colagens de Mário-Henrique Leiria, trabalhos menos conhecidos de António Dacosta, e, naturalmente, uma curta selecção dos já citados “artistas da casa” Cesariny, Cruzeiro Seixas e Fernando Lemos.

A acompanhar a exposição (que vai ficar patente até 8 de Setembro), o CPS edita um catálogo que irá documentar um espectro mais alargado relativamente às obras exibidas, com referências a artistas como Gonçalo Duarte, António Areal e Paula Rego, que, "não estando representados na mostra, nem tendo feito parte do movimento surrealista”, manifestam nas suas criações significativas ligações àquela corrente estética.

“Não queremos fechar a gaveta do surrealismo, nem o surrealismo numa só gaveta”, acrescenta António Gonçalves a justificar o sentido desta exposição, que se propõe também abrir caminho a futuras relações e parcerias com outras colecções de instituições portuguesas e estrangeiras – de resto, a mostra que irá seguir-se, em Setembro, dará a ver um conjunto de revistas nacionais e internacionais de surrealismo reunido por um coleccionador privado português.

A inauguração do CPS e da exposição O Surrealismo na Colecção Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian está marcada para as 17h30, será presidida pelo Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa e o programa inclui um pequeno espectáculo de circo, Resiliência: as partes 3 e 4 vão bem juntas, por artistas do Instituto Nacional de Artes do Circo (INAC), com sede em Famalicão.