Rodrigo Gomes vence Prémio Sonae Media Art com escultura audiovisual

Com 26 anos, o artista recebe um prémio no valor de 40 mil euros.

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Rodrigo Gomes com a escultura Estivador de Imagens na exposição do Museu do Chiado Ricardo Lopes

Rodrigo Gomes, com uma escultura audiovisual, é o vencedor do Prémio Sonae Media Art 2017. A obra foi escolhida por "unanimidade" entre cinco finalistas que mostram actualmente os seus trabalhos numa exposição no Museu Nacional de Arte Contemporânea (MNAC), em Lisboa, anunciou Filipa Oliveira, presidente do júri, que além da directora artística do Fórum Eugénio de Almeida, em Évora, inclui ainda Nuno Crespo, professor universitário e crítico do PÚBLICO, e Ramus Vestergaard, director do dinamarquês Digital Interactive Art Space. 

No valor de 40 mil euros, esta acção de mecenato do grupo Sonae (proprietário do PÚBLICO) numa colaboração com o MNAC é o maior prémio artístico português na área do multimédia e um dos mais relevantes no domínio da cultura.

Filipa Oliveira sublinhou ao PÚBLICO que o artista revelou "um bom entendimento" do que é a exibição de uma peça de novos média num espaço museológico como o Museu do Chiado, aspecto igualmente destacado pelo júri. A obra, intitulada Estivador de Imagens, trabalha "o encontro entre imagem, som, movimento e matéria, numa instalação escultórica que é muito bem conseguida", explicou a curadora durante o anúncio. O júri salientou também o modo como Rodrigo Gomes estabelece uma relação importante com a história do cinema, nomeadamente com a obra do realizador alemão Harun Farocki, e "temas actuais como a vigilância, o terror e a guerra".

Naquela que é a segunda edição do prémio Sonae Media Art (Tatiana Macedo ganhou em 2015), Filipa Oliveira destacou a importância desta iniciativa para os jovens criadores – o prémio é bienal e só podem concorrer artistas até aos 40 anos –, bem como para "o desenvolvimento da new media art no contexto português", ainda sem o reconhecimento e a atenção dados a esta área noutros países.

Num tempo de excesso de produção de imagens, quase “uma esquizofrenia”, nas palavras de Rodrigo Gomes, Estivador de Imagens reflecte, como o nome sugere, sobre a dificuldade de construção de novas imagens. "Pego numa imagem e ofereço um corpo físico a essa imagem", explicou o artista ao PÚBLICO em frente à sua obra depois do anúncio do vencedor. "Nós quase que podemos tocar nessa imagem. Há uma proximidade porque o observador rodeia a imagem física." Rodrigo Gomes explora a contaminação da obra escultórica pelas imagens digitais: a forma como a projecção de uma imagem bidimensional sobre uma escultura consegue transformá-la numa imagem tridimensional. 

No seu discurso de agradecimento, o artista contou uma história de infância, porque, como disse, não tinha um discurso preparado. Recordou que gostava de brincar com todo o tipo de tendas, desde as que desenhava em folhas de papel às que montava na sua casa e partilhava com as irmãs, como “forma de reduzir o mundo à sua escala”, de criar um espaço de diálogo. “É preciso criar diálogos para não cairmos no erro da banalização das imagens.” Porque – e voltamos à herança de Farocki – diante das imagens de guerra, o espectador transforma-se num técnico da guerra. 

Um cenário de guerra

Numa sala obscurecida do Museu do Chiado, Estivador de Imagens constrói-se como uma escultura feita em acrílico e espelhos, composta por vários planos, sobre a qual são projectadas imagens de um território. Rodrigo Gomes parte dos drones para recuar até aos primeiros satélites espiões, integrados no Projecto Corona da CIA, lançado em plena Guerra Fria, e que realizaram um exaustivo levantamento fotográfico da superfície da Terra. No seu arquivo pessoal de imagens, encontrou uma vista área de uma mina abandonada em Casa Grande, no Arizona (EUA), que o artista manipula e a que adiciona miras e som, transformando-a num cenário de guerra. 

Agindo remotamente, o artista é, assim, capaz de alterar a nossa percepção da escultura através das imagens digitais. Aos vários planos, à modelação da escultura, "adiciona-se uma pele que o vídeo oferece à escultura", explica o artista aos jornalistas. "Camadas sobre camadas que constroem uma narrativa que permite depois criar meta-narrativas." 

Antes de ouvirmos o discurso improvisado de Rodrigo Gomes, o co-CEO da Sonae, Ângelo Paupério, recordou Belmiro de Azevedo, antigo presidente da empresa, que morreu recentemente. “Foi o grande dinamizador da nossa relação com a arte”, “precisamente através das ideias de inovação e criatividade” que o prémio estimula. Lembrou que Belmiro gostava de falar “da destruição criativa”, “dessa capacidade de aprendermos com quem está a pensar de uma maneira diferente”.

Aos jornalistas, Rodrigo Gomes disse que o Prémio Sonae Media Art lhe vai permitir ganhar escala: “Não só física mas também a escala da imaginação. Partimos do princípio de que a imaginação não tem limites mas construir uma obra requer tempo.” 

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