Viver para lá dos 100

Em Portugal, o número de centenários quase triplicou numa década, estimando-se que existam hoje mais de 4000 pessoas nestas circunstâncias. Manter-se activo, física e socialmente, com apoio da rede familiar, são factores determinantes para a longevidade avançada.

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O mundo está a envelhecer e o número de pessoas a chegar aos 100 anos de idade tem vindo a aumentar significativamente nos últimos anos. Dados apresentados no relatório Envelhecimento no Século XXI: Celebração e Desafio, publicado pelas Nações Unidas em 2012, dão-nos a indicação de que alguns países vão quadruplicar o número da população muito idosa (80+ anos), estimando-se que o número de centenários aumente globalmente de 316.600 em 2011, para 3.2 milhões em 2050. Em países como o Reino Unido, por exemplo, projeções apontam para a existência de meio milhão de centenários em 2066 e que um terço dos bebés nascidos em 2012 chegue a celebrar o seu centésimo aniversário. Na China, existem actualmente cerca de 12.300 centenários, e no Japão o número actual situa-se nos 49.500, esperando-se o seu aumento para 617.000 em 2050. Concretamente em Portugal, e de acordo com os dados censitários, o número de pessoas centenárias quase triplicou em 10 anos de 589 (2001) para 1526 (2011), estimando-se que hoje existam mais de 4000 pessoas nestas circunstâncias no nosso país.

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Longevidade excepcional

Sabendo-se que a biologia tende a favorecer as mulheres já que constituem a grande maioria da população centenária, muito se tem especulado sobre os contributos da genética, dos estilos de vida e de outras dimensões psicossociais para uma vida longa. Algumas zonas do mundo conhecidas por apresentarem uma grande concentração de casos de longevidade excepcional (as denominadas Longevity Blue Zones), dão-nos conta da importância das relações de solidariedade familiar, da manutenção de hábitos saudáveis como não fumar e uma dieta rica em vegetais, da prática regular de actividade física e de um envolvimento activo com a comunidade como grandes eixos estruturantes da longevidade avançada. 

O Ikigai japonês

Numa recente publicação orientada para o grande público e resultante de várias entrevistas conduzidas, numa perspectiva jornalística, a 100 idosos residentes em Ogimi, Okinawa [IKIGAI. Viva bem até aos 100 anos, por Héctor García e Francesc Miralles], é dado destaque a uma variável de foro psicológico tida como de crucial importância na sabedoria popular japonesa: o Ikigai. Reconhecido por investigadores japoneses como aspecto bem presente na descrição das ocupações do quotidiano do centenários também por eles entrevistados, o Ikigai define-se como “a razão por que todas as manhãs a pessoa se levanta da cama”, aspecto traduzível num sentido de vida, raison d’être, que coloca em evidência a importância de nos mantermos envolvidos com a vida à medida que envelhecemos e de mantermos o foco em objectivos, em algo a fazer a cada novo dia. Será muito provavelmente este propósito e desejo de viver, de saber-se em relação permanente consigo e com o mundo, que contribuirá para uma longevidade excepcional com sentido, apesar das múltiplas adversidades e perdas experienciadas por esta população.

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Qualidade de vida aos 100

Além da saúde e do estatuto socioeconómico, reconhecidos como importantes preditores de qualidade de vida e felicidade ao longo da vida, vários investigadores têm vido a colocar em destaque características que poderão contribuir para uma vida satisfatória aos 100 anos de idade. Apesar da falta de informação sobre o que será ter qualidade de vida numa idade tão avançada, de acordo com um relatório inglês publicado em 2011 pelo International Longevity Centre – UK (ILC-UK), existe crescente evidência sobre a importância da manutenção das redes sociais, da independência e da autonomia, bem como de uma atitude pessoal positiva em relação à vida. Sobre esta última, o relatório reforça a importância de se ter um propósito de vida capaz de prover à continuidade de actividades do quotidiano. O papel da espiritualidade/religiosidade neste domínio estima-se que tenha um contributo determinante, mas ainda escasseiam resultados conclusivos sobre esta dimensão.Oscar Ribeiro

Psicólogo e investigador (UNIFAI-ICBAS e CINTESIS.UP)

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