Uma fotografia, uma história

O fotojornalista Eric Gaillard estava em casa de férias quando um colega lhe ligou a dizer que um camião tinha atropelado pessoas no centro de Nice. “Quando estava a estacionar vi um corpo no chão. Depois vi os corpos todos atrás de mim. Cerca de 12 corpos, alguns já cobertos com toalhas de mesa dos restaurantes. Algumas pessoas ficaram agressivas. Eu entendo, a situação era caótica. Esta imagem com a boneca tornou-se viral, muitas vezes mal legendada, porque dizia tratar-se de uma criança. Na verdade não sabemos a idade da vítima. Fiquei muito abalado. Naquela noite o horror chegou à minha cidade." REUTERS/Eric Gaillard
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O fotojornalista Eric Gaillard estava em casa de férias quando um colega lhe ligou a dizer que um camião tinha atropelado pessoas no centro de Nice. “Quando estava a estacionar vi um corpo no chão. Depois vi os corpos todos atrás de mim. Cerca de 12 corpos, alguns já cobertos com toalhas de mesa dos restaurantes. Algumas pessoas ficaram agressivas. Eu entendo, a situação era caótica. Esta imagem com a boneca tornou-se viral, muitas vezes mal legendada, porque dizia tratar-se de uma criança. Na verdade não sabemos a idade da vítima. Fiquei muito abalado. Naquela noite o horror chegou à minha cidade." REUTERS/Eric Gaillard

11 fotojornalistas da Reuters olham para o ano que agora acaba e contam as histórias de 11 fotografias que marcam 2016. Dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, à guerra na Síria, dos protestos contra a discriminação racial nos EUA aos ataques de Nice, em França. É o caso do fotojornalista francês Eric Gaillard, que relata o dia em que um ataque terrorista chegou a 500 metros de sua casa. "Estava em casa, de férias (depois de ter feito uma "cansativa" cobertura do Euro2016), quando um colega me ligou a dizer que um camião tinha atropelado várias pessoas no centro de Nice. Assumi que era um acidente, nada que valesse a pena fotografar", recorda Eric. "Mas depois recebi um alerta no meu telemóvel em que as autoridades diziam tratar-se de um ataque. Peguei nas minhas máquinas e na minha mota", conta. Eric percebeu depois que um camião tinha avançado contra a multidão no Passeio dos Ingleses em Nice, enquanto festejavam o dia nacional de França, o Dia da Bastilha. Morreram 84 pessoas. A imagem que Eric Gaillard fez do corpo de uma das vítimas, estendido no chão com uma boneca ao lado, foi partilhada em todo o mundo. "Fiquei muito abalado, porque naquela noite o horror chegou à minha cidade, Nice", conta o fotojornalista. 

No início de Julho, Arlon Sterling, um homem negro de 37 anos, era abatido por polícias na cidade de Baton Rouge, capital do estado da Luisiana. A contestação à actuação da polícia nos EUA saía novamente à rua. Num dos protestos, uma mulher tornou-se um símbolo da tomada de posição da comunidade negra. A fotografia de Ieshia Evans, a mulher de postura serena no momento em que é detida pela polícia, correu mundo. “Momentos antes de captar esta imagem, estava de costas a fotografar os confrontos entre a polícia e os manifestantes", explica Jonathan Bachman. "Ouvi alguém atrás de mim dizer: "Não fique aí, estão a prender pessoas na rua!" Olhei sobre o meu ombro direito e vi esta mulher de pé na estrada. Soube imediatamente o que estava prestes a acontecer. A polícia ia prendê-la. Virei-me e disparei. Quando revi as fotografias soube que tinha uma imagem forte. Mas não podia prever que se iria tornar viral. Estou feliz por ter estimulado uma discussão sobre uma questão importante neste país ".
No início de Julho, Arlon Sterling, um homem negro de 37 anos, era abatido por polícias na cidade de Baton Rouge, capital do estado da Luisiana. A contestação à actuação da polícia nos EUA saía novamente à rua. Num dos protestos, uma mulher tornou-se um símbolo da tomada de posição da comunidade negra. A fotografia de Ieshia Evans, a mulher de postura serena no momento em que é detida pela polícia, correu mundo. “Momentos antes de captar esta imagem, estava de costas a fotografar os confrontos entre a polícia e os manifestantes", explica Jonathan Bachman. "Ouvi alguém atrás de mim dizer: "Não fique aí, estão a prender pessoas na rua!" Olhei sobre o meu ombro direito e vi esta mulher de pé na estrada. Soube imediatamente o que estava prestes a acontecer. A polícia ia prendê-la. Virei-me e disparei. Quando revi as fotografias soube que tinha uma imagem forte. Mas não podia prever que se iria tornar viral. Estou feliz por ter estimulado uma discussão sobre uma questão importante neste país ". REUTERS/Jonathan Bachman
Gleyse da Silva com a filha de três meses, Maria, um dos milhares de bebés que nasceram com microcefalia no Brasil devido ao vírus Zika. Uslei Marcelino, fotojornalista da Reuters, passou algum tempo com esta família no Recife. "Eles tratam a Maria como qualquer outro bebé. Eu chegava sempre com a minha máquina para baixo e falava com as pessoas primeiro. Mantive-me em contacto com eles nos meses seguintes. Gleyse deixou o trabalho para cuidar da filha a tempo inteiro, mas o corte no rendimento familiar dificulta o acesso a cuidados de saúde de que o bebé necessita."
Gleyse da Silva com a filha de três meses, Maria, um dos milhares de bebés que nasceram com microcefalia no Brasil devido ao vírus Zika. Uslei Marcelino, fotojornalista da Reuters, passou algum tempo com esta família no Recife. "Eles tratam a Maria como qualquer outro bebé. Eu chegava sempre com a minha máquina para baixo e falava com as pessoas primeiro. Mantive-me em contacto com eles nos meses seguintes. Gleyse deixou o trabalho para cuidar da filha a tempo inteiro, mas o corte no rendimento familiar dificulta o acesso a cuidados de saúde de que o bebé necessita." REUTERS/Ueslei Marcelino
Em Janeiro deste ano, o fotojornalista Brian Snyder acompanhou um comício de Donald Trump Lowell, Massachusetts. "Para alguns, era como se ela tivesse conhecido uma celebridade. Para os outros, aquela mulher parecia terrivelmente aterrorizada”, explica Snyder. Na verdade, era uma apoiante entusiasta de Trump: "Nós percebemos que Trump era um de nós e ele não escondeu esse facto. Ele é perfeito? Não, mas ele parece preocupar-se com as pessoas “, explicou a mulher.
Em Janeiro deste ano, o fotojornalista Brian Snyder acompanhou um comício de Donald Trump Lowell, Massachusetts. "Para alguns, era como se ela tivesse conhecido uma celebridade. Para os outros, aquela mulher parecia terrivelmente aterrorizada”, explica Snyder. Na verdade, era uma apoiante entusiasta de Trump: "Nós percebemos que Trump era um de nós e ele não escondeu esse facto. Ele é perfeito? Não, mas ele parece preocupar-se com as pessoas “, explicou a mulher. REUTERS/Brian Snyder
O fotojornalista alemão Kai Pfaffenbach  captou esta imagem nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. "Quando Usain Bolt se preparou para a meia-final dos 100 metros, decidi brincar com uma velocidade de obturador baixa. Estava à espera do momento em que ele passasse por mim. No momento exacto, ele olhou para a esquerda com o sorriso orgulhoso e o meu primeiro pensamento foi: ‘espero ter isto focado’. Tive sorte, mas não podia imaginar que esta imagem teria tanto reconhecimento internacional”.
O fotojornalista alemão Kai Pfaffenbach captou esta imagem nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. "Quando Usain Bolt se preparou para a meia-final dos 100 metros, decidi brincar com uma velocidade de obturador baixa. Estava à espera do momento em que ele passasse por mim. No momento exacto, ele olhou para a esquerda com o sorriso orgulhoso e o meu primeiro pensamento foi: ‘espero ter isto focado’. Tive sorte, mas não podia imaginar que esta imagem teria tanto reconhecimento internacional”. REUTERS/Kai Pfaffenbach
"Estava a fotografar a em Ahmedabad [Índia] quando vi trabalhadores a puxar cabos eléctricos”, conta Amit Dave. “Filhos dos trabalhadores brincavam à beira da estrada, mas havia uma criança que estava sentada sozinha. Shivani, de quinze meses, estava presa a uma fita de plástico que a mãe tinha enrolado no tornozelo da menina, amarrada a uma pedra junto às obras. Passava nove horas por dia presa, descalça, com temperaturas que chegavam aos 40 graus. A mãe disse não ter outra opção senão amarrar Shivani enquanto ela e o marido trabalham para ganhar algo como quatro euros por turno”. “Amarro-a para que ela não vá para a estrada”, explicou a mãe. Os patrões fecham os olhos: "Eles não se importam connosco ou com os nossos filhos, só estão preocupados com o trabalho."
"Estava a fotografar a em Ahmedabad [Índia] quando vi trabalhadores a puxar cabos eléctricos”, conta Amit Dave. “Filhos dos trabalhadores brincavam à beira da estrada, mas havia uma criança que estava sentada sozinha. Shivani, de quinze meses, estava presa a uma fita de plástico que a mãe tinha enrolado no tornozelo da menina, amarrada a uma pedra junto às obras. Passava nove horas por dia presa, descalça, com temperaturas que chegavam aos 40 graus. A mãe disse não ter outra opção senão amarrar Shivani enquanto ela e o marido trabalham para ganhar algo como quatro euros por turno”. “Amarro-a para que ela não vá para a estrada”, explicou a mãe. Os patrões fecham os olhos: "Eles não se importam connosco ou com os nossos filhos, só estão preocupados com o trabalho." REUTERS/Amit Dave
Mahmoud Barakeh, 11 anos, morreu num bombardeamento em Douma, na Síria, em Outubro deste ano. Bassam Khabieh fotografou o seu corpo momentos antes do funeral: “Estava sozinho ali naquela mesa, com as roupas manchadas de sangue. A mãe e o irmão também ficaram feridos. O pai e os tios morreram nos ataques do ano passado. Estavam à espera que aparecesse um familiar para assistir ao funeral.  Um vizinho tentou encontrar o avô. Acabaram por levá-lo para a casa da família e o avô estava incrédulo. Os miúdos da vizinhança rodearam o corpo para ver o amigo pela última vez.”
Mahmoud Barakeh, 11 anos, morreu num bombardeamento em Douma, na Síria, em Outubro deste ano. Bassam Khabieh fotografou o seu corpo momentos antes do funeral: “Estava sozinho ali naquela mesa, com as roupas manchadas de sangue. A mãe e o irmão também ficaram feridos. O pai e os tios morreram nos ataques do ano passado. Estavam à espera que aparecesse um familiar para assistir ao funeral. Um vizinho tentou encontrar o avô. Acabaram por levá-lo para a casa da família e o avô estava incrédulo. Os miúdos da vizinhança rodearam o corpo para ver o amigo pela última vez.” REUTERS/Bassam Khabieh

Souad Hamidi despe o seu niqab (lenço que cobre o cabelo e o rosto, deixando apenas os olhos a descoberto) depois das Forças Democráticas Sírias terem recuperado o controlo na sua aldeira, nos arredores da cidade de Manbij, na província de Alepo. “A jovem de 19 anos rasgou rapidamente o niqab que tinha sido forçada a usar desde 2014 e sorriu”, recorda o fotojornalista Rodi Said. “Com o Estado Islâmico, a vida era estritamente controlada, incluindo o modo de vestir, contou-me Hamidi. Para mim esta fotografia expressa a força da sua personalidade, o reclamar da liberdade, o momento em que se ultrapassa o medo da perseguição religiosa”.
Souad Hamidi despe o seu niqab (lenço que cobre o cabelo e o rosto, deixando apenas os olhos a descoberto) depois das Forças Democráticas Sírias terem recuperado o controlo na sua aldeira, nos arredores da cidade de Manbij, na província de Alepo. “A jovem de 19 anos rasgou rapidamente o niqab que tinha sido forçada a usar desde 2014 e sorriu”, recorda o fotojornalista Rodi Said. “Com o Estado Islâmico, a vida era estritamente controlada, incluindo o modo de vestir, contou-me Hamidi. Para mim esta fotografia expressa a força da sua personalidade, o reclamar da liberdade, o momento em que se ultrapassa o medo da perseguição religiosa”. REUTERS/Rodi Said
Jennilyn Olayres, 26 anos, ampara o corpo do companheiro, morto numa rua das Filipinas. “A fotografia tornou-se viral nas Filipinas e o presidente Rodrigo Duterte descreveu-a como melodramática”, explica o fotojornalista Czar Dancel. “Naquela noite, seis pessoas foram assassinadas em Manila. Durante vários meses cobri os homicídios de suspeitos de tráficos de droga”, conta. Duterte venceu as eleições presidenciais em Maio, depois de uma campanha em que prometeu abater dezenas de milhares de traficantes de droga. “É sempre chocante chegar a um local onde há mortos”, recorda o fotógrafo da Reuters. Tirei algumas fotografias até reparar na Jennilyn, que me disse que o companheiro era consumidor de droga mas não traficante porque eles eram pobres. Quando lhe perguntaram se tinha uma mensagem para o Presidente Duterte ela respondeu: ‘matem as drogas, não as pessoas’”.
Jennilyn Olayres, 26 anos, ampara o corpo do companheiro, morto numa rua das Filipinas. “A fotografia tornou-se viral nas Filipinas e o presidente Rodrigo Duterte descreveu-a como melodramática”, explica o fotojornalista Czar Dancel. “Naquela noite, seis pessoas foram assassinadas em Manila. Durante vários meses cobri os homicídios de suspeitos de tráficos de droga”, conta. Duterte venceu as eleições presidenciais em Maio, depois de uma campanha em que prometeu abater dezenas de milhares de traficantes de droga. “É sempre chocante chegar a um local onde há mortos”, recorda o fotógrafo da Reuters. Tirei algumas fotografias até reparar na Jennilyn, que me disse que o companheiro era consumidor de droga mas não traficante porque eles eram pobres. Quando lhe perguntaram se tinha uma mensagem para o Presidente Duterte ela respondeu: ‘matem as drogas, não as pessoas’”. REUTERS/Czar Dancel
O fotojornalista Goran Tomasevic captou esta imagem após um ataque aéreo a forças do Estado Islâmico em Mossul, no Iraque. “Já cobri muitos conflitos mas o que mais me impressionou em Mossul foi o número de atentados com carros bomba. Quando os ataques acalmaram, captei um grupo de civis a tentar sair para a rua. De repente, mais um ataque aéreo, a poucos metros deles. Instalou-se o pânico. Estas coisas acontecem rápido e temos de agir rapidamente. Primeiro temos de assegurar que estamos a salvo e depois mantermo-nos focados para podermos trabalhar. Preparamos as lentes e ficamos calmos”.
O fotojornalista Goran Tomasevic captou esta imagem após um ataque aéreo a forças do Estado Islâmico em Mossul, no Iraque. “Já cobri muitos conflitos mas o que mais me impressionou em Mossul foi o número de atentados com carros bomba. Quando os ataques acalmaram, captei um grupo de civis a tentar sair para a rua. De repente, mais um ataque aéreo, a poucos metros deles. Instalou-se o pânico. Estas coisas acontecem rápido e temos de agir rapidamente. Primeiro temos de assegurar que estamos a salvo e depois mantermo-nos focados para podermos trabalhar. Preparamos as lentes e ficamos calmos”. REUTERS/Goran Tomasevic
O fotojornalista Toby Melville detesta voar. “Quando me perguntaram se queria fazer uma viagem de uma base da força aérea norte-americana em Inglaterra até à Crimeia - para fotografar o reabastecer de aviões de combate em pleno ar – hesitei”, recorda. “Mas a oportunidade de fotografar deste ponto de vista único acalmou-me. Esta imagem mostra o piloto pronto para receber o combustível. Felizmente consegui manter a postura.”
O fotojornalista Toby Melville detesta voar. “Quando me perguntaram se queria fazer uma viagem de uma base da força aérea norte-americana em Inglaterra até à Crimeia - para fotografar o reabastecer de aviões de combate em pleno ar – hesitei”, recorda. “Mas a oportunidade de fotografar deste ponto de vista único acalmou-me. Esta imagem mostra o piloto pronto para receber o combustível. Felizmente consegui manter a postura.” REUTERS/Toby Melville