Sobrecarga dos cuidadores é equivalente ao desgaste dos médicos e enfermeiros

No dia em que se celebra o Dia do Cuidador, o presidente da Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos alerta para as dificuldades e falta de apoio que cuidadores informais de doentes sentem.

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Portugal tem a maior taxa de cuidados continuados e paliativos, prestados por pessoas sem preparação nem qualificação MS MIGUEL SILVA - PòBLICO

O presidente da Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos defendeu, esta sexta-feira, que a sobrecarga dos cuidadores informais de doentes "é equivalente" ao burnout (desgaste) dos médicos e enfermeiros e advertiu que aqueles não podem substituir os profissionais de saúde.

"É muito fácil tirar os doentes do hospital e entregá-los à família, mas é preciso ter atenção ao impacto que isto gera nas famílias", disse Manuel Luís Capelas, na véspera de se assinalar o Dia do Cuidador. Apesar de ser "um dos grandes defensores" da ideia de cuidar dos doentes em casa, Manuel Capelas disse que para isso acontecer têm de estar reunidas as "condições adequadas". Os cuidadores "precisam de um apoio muito permanente" para evitar que atinjam "um ponto de ruptura, de desespero total, porque já não aguentam", sublinhou.

Manuel Capelas equiparou a sobrecarga dos cuidadores à síndrome de burnout dos profissionais de saúde, uma reacção ao stress crónico no trabalho caracterizado por exaustão, despersonalização e não realização profissional. "Um profissional em burnout acaba por pensar egoisticamente no seu bem-estar, é uma máquina", mas "quem está em casa a uma dada altura rebenta e é preciso ter atenção a esta situação", alertou.

O especialista em cuidados paliativos observou que muitos cuidadores passam 24 horas por dia com o doente, um tempo que os profissionais de saúde acabam por não estar. "Nós saímos dos nossos turnos e temos outros escapes", mas os cuidadores não têm, disse, alertando que "não se pode deixar em cima dos cuidadores toda a responsabilidade" sobre o doente. Eles "não podem substituir os profissionais de saúde", porque senão "estamos a aliviar" o sistema de saúde, mas a colocar "uma sobrecarga nestas famílias e nestas pessoas que precisam de continuar a ser apoiados".

E, defendeu, devido ao trabalho "extremamente importante" que fazem para o sistema de saúde e para as suas famílias, que precisam de ter apoio social, laboral e psicossocial. Por outro lado, os profissionais de saúde "continuam a ter de ser os alicerces do sistema" e destas pessoas, para que "possam cuidar dos seus familiares, dos seus amigos, mas continuarem a ser pessoas". "Um apoio não é largar os familiares numa guerra, num pântano, numa selva muito complicada", frisou, defendendo que os cuidadores precisam de formação, capacitação e apoio psicossocial para tratar do doente.

No início de Outubro, o secretário de Estado da Saúde, Manuel Delgado, disse que, a partir de 2018, os cuidadores vão ser compensados com apoios que ainda não estão definidos, mas que poderão passar por regalias sociais, fiscais ou financeiras. Para Manuel Capelas, a legislação nesta área "é importante e precisa", mas não chega. "As equipas também têm de ter capacidade" de identificar as necessidades dos cuidadores" e ajudá-los com formação específica. Também devem estar atentas "aos mínimos sinais de sobrecarga para que nessa altura seja possível encontrar uma estratégia que permita aliviar a sobrecarga em que estão", frisou.

Segundo um estudo da Entidade Reguladora da Saúde, Portugal tem a maior taxa de cuidados continuados e paliativos prestados por pessoas sem preparação nem qualificação para tal, e uma das mais baixas taxas de cobertura de cuidados prestados por profissionais em toda a Europa.

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