PSD diz que a lei da Caixa é inconstitucional. E apanha Marcelo na polémica

Argumentos dos sociais-democratas em defesa da tese da inconstitucionalidade suscitam a questão: fez bem o Presidente da República ao promulgar o diploma do Governo? BE, PCP e CDS também querem mudar a lei.

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Miguel Manso

O PSD considera "inconstitucional" o decreto aprovado pelo Governo que retira a CGD da lei que define o estatuto de gestor público - liberalizando assim os salários no banco público e abrindo espaço a que os seus gestores não apresentem no Tribunal Constitucional (TC) as suas declarações de património.

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O PSD considera "inconstitucional" o decreto aprovado pelo Governo que retira a CGD da lei que define o estatuto de gestor público - liberalizando assim os salários no banco público e abrindo espaço a que os seus gestores não apresentem no Tribunal Constitucional (TC) as suas declarações de património.

O PÚBLICO confirmou que os sociais-democratas admitem pedir a fiscalização sucessiva desse decreto, mas vão aguardar, para já, o resultado das votações que se seguem no Parlamento, com a intenção de anular essa lei. "Uma fiscalização sucessiva demora oito meses", estima um membro da direcção parlamentar do PSD. Mas todos no partido sabem qual será o destino dessa proposta que foi apresentada na sexta-feira - o chumbo, já que à esquerda ninguém aceita que os valores dos salários se mantenham como estavam. Pelo que o passo seguinte deve ser esse mesmo: o envio do decreto para o TC.

Para isso, a bancada "laranja" é auto-suficiente. De acordo com a Constituição, basta que sejam recolhidas as assinaturas de 23 deputados para o fazer. Mas, lançando o processo, não é só o Governo que o PSD põe em xeque: "Não se consegue perceber como é que o Presidente da República aceitou isto", anota a mesma fonte, a propósito da promulgação de Marcelo ao decreto do Governo. No dia em que deu luz verde ao documento, Marcelo publicou uma justificação onde alegava ter tido em conta "o facto de a não promulgação equivaler à não entrada em funções do novo Conselho de Administração, com o agravamento do risco de paralisia da instituição". Na SIC, este domingo, o conselheiro de Estado Marques Mendes acrescentava - sem falar de Marcelo - que o Governo tinha escondido de todos a questão da transparência quando aprovou o decreto. 

O que pode estar em causa

Nas redes sociais, um outro dirigente da bancada do PSD antecipou já a batalha jurídica. "Levanta-se sempre a constitucionalidade da alteração ao estatuto do gestor público feita pelo Governo para facilitar a vida à administração da CGD", escreveu Hugo Soares, explicando que essa inconstitucionalidade deriva de existir outra lei, de valor reforçado (o decreto-Lei 133/2013), que diz só poderem ser admitidos "a prestar funções como titulares de órgãos de administração de empresas públicas" indivíduos com determinadas características, acrescendo-se nesse ponto que a estes será "aplicável o disposto no Estatuto do Gestor Público, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27 de Março". O argumento do PSD é, desta forma, sintetizável assim: se esta lei vale mais do que o decreto do Governo, este decreto não pode anular o que ela diz (e tirar uma administração de empresa pública da égide do estatuto).

Hugo Soares termina o seu texto assim: "Se nos termos da lei, quem administra empresas públicas são gestores públicos, se a CGD é banco público, António Domingues e seus pares são gestores públicos. Ponto."

O PSD deverá apresentar os dois projectos de lei – um sobre os limites dos salários e o outro sobre a transparência – fora do âmbito do Orçamento do Estado, o que remete a discussão só para Dezembro. Até lá, a Assembleia da República está inteiramente dedicada ao debate da proposta orçamental. A apresentação de dois projectos diferentes tem como objectivo poder captar votos do PCP e do BE no diploma da transparência, já que aqui estão todos de acordo, o que não acontece relativamente aos tectos salariais.

 O CDS não irá puxar pelo argumento constitucional mas antes pelo aspecto ético do problema. “O facto de ser constitucional ou inconstitucional não é indiferente, mas não é o mais importante. O mais importante é a transparência política e se os actores respondem ou não aos órgãos de soberania que tem de responder”, afirmou ao PÚBLICO Nuno Magalhães, líder da bancada do CDS. A questão está por isso em saber “se é ou não eticamente aceitável” que o presidente da CGD não tenha de mostrar a sua declaração de rendimentos ao Tribunal Constitucional. 

Tal como o PSD, também o CDS vai apresentar dois projectos de lei, um sobre a questão da transparência e outro sobre a limitação dos salários dos gestores. O projecto centrista aponta  para, “num tempo de excepção”, a fixação de um tecto do salário do primeiro-ministro com a possibilidade de um prémio “ligado a objectivos concretos que venham a ser definidos pelo Governo”, segundo a líder do CDS, Assunção Cristas. Em declarações à Lusa, Cristas identificou a situação de excepção com o processo de recapitalização da CGD e também com a “austeridade” do Orçamento do Estado para 2017.

Tal como o PSD, também o CDS vai apresentar dois projectos de lei, um sobre a questão da transparência e outro sobre os salários. O Bloco de Esquerda pretende, com uma única norma, em sede de discussão do OE, impor o vencimento do primeiro-ministro como tecto dos salários dos gestores da Caixa e obrigar estes últimos à entrega de declarações no TC. E até o PCP, que viu um projecto chumbado há menos de 15 dias, justamente pela questão do limite dos salários dos administradores da Caixa, admite nova iniciativa legislativa.