O que esconde o nacionalista austríaco atrás do seu sorriso perfeito?

O candidato do partido nacionalista austríaco está prestes a agarrar a presidência. Norbert Hofer diz-se e comporta-se como um moderado, mas promete também travar a "invasão de muçulmanos" no país.

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O candidato nacionalista quer “dedicação ao povo e cultura alemã” GEORG HOCHMUTH/AFP

A segunda volta das eleições presidenciais na Áustria disputa-se este domingo entre dois extremos e um deles está já a ser proclamado vencedor. A acreditar nas sondagens, o candidato nacionalista islamofóbico Norbert Hofer vencerá sem dificuldades o septuagenário ex-líder do partido ecologista austríaco, Alexander Van der Bellen, que no último fim-de-semana surgia a seis pontos de distância do homem que muitos antecipam vir a ser o primeiro chefe de Estado europeu de extrema-direita depois da Segunda Guerra Mundial.

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A segunda volta das eleições presidenciais na Áustria disputa-se este domingo entre dois extremos e um deles está já a ser proclamado vencedor. A acreditar nas sondagens, o candidato nacionalista islamofóbico Norbert Hofer vencerá sem dificuldades o septuagenário ex-líder do partido ecologista austríaco, Alexander Van der Bellen, que no último fim-de-semana surgia a seis pontos de distância do homem que muitos antecipam vir a ser o primeiro chefe de Estado europeu de extrema-direita depois da Segunda Guerra Mundial.

Norbert Hofer não concorda com esse epíteto. Ele reclama-se — e ao seu Partido da Liberdade — à esquerda dos Democratas norte-americanos e diz-se “abençoado” por não existir na Áustria uma força extremista como os neonazis gregos do Aurora Dourada. A sua imagem de marca é a de um homem polido — é muitas vezes saudado pelo seu “sorriso perfeito” — que apela ao consenso com os partidos tradicionais austríacos e promete devolver o país à trajectória de crescimento e criação de emprego que o iludiu na última década.  

O crescimento do Partido da Liberdade (FPÖ) de Hofer começou em 2002, muito antes da crise de refugiados atingir a Europa e ferir de morte o chanceler social-democrata Werner Faymann, que inverteu a sua resposta inicial de acolhimento, ergueu vedações no Sul do país e liderou o movimento de fecho da rota dos Balcãs que isolou a Grécia — demitiu-se este mês, depois da primeira volta das presidenciais. “O FPÖ capitalizou sobretudo com a posição anti-sistema”, argumenta Gustav Gressel, do think tank European Council on Foreign Relations.

Os resultados da primeira volta parecem apoiar esta tese. Hofer venceu com 35% dos votos, seguido de Van der Bellen com 21% e Irmgard Griss, uma independente que financiou a sua campanha principalmente com crowdfunding e atingiu os 19%. Cada um dos partidos centristas que governam a Áustria desde a Segunda Guerra Mundial não foi para além dos 11%. “Os partidos convencionais nunca pareceram mais distanciados e vazios de ideias do que hoje”, escreve Paul Hockenos na Foreign Policy.

Mas esta é apenas uma das faces de Norbert Hofer e do seu Partido da Liberdade. Uma outra é abertamente islamofóbica, anti-imigração e alimenta-se da mesma base de apoio que os seus partidos irmãos no grupo Europa para as Nações e Liberdade, criado pela líder nacionalista francesa Marine Le Pen. “Temos de travar esta invasão de muçulmanos”, afirmou Hofer, cujos cartazes de campanha prometem ser “o único capaz de parar os imigrantes”. “Não serei o Presidente da Áustria, serei o Presidente dos austríacos”, prometeu no seu último comício.  

Pele de cordeiro

A Áustria foi um dos países mais atingidos pela vaga de refugiados e imigrantes na Europa. Registou mais de 90 mil pedidos de asilo, o que fez dela o segundo país europeu com maior volume de requerentes de asilo per capita em 2015, atrás apenas da Suécia. O número de ataques xenófobos e racistas aumentou na ordem das centenas nos últimos dois anos e uma parte importante do eleitorado está “preocupada com os imigrantes que querem mudar a nossa cultura [e] a nossa sociedade”, como explicava um militante nacionalista à BBC.

Hofer promete reforçar os controlos fronteiriços introduzidos pelo ex-chanceler e acabar com o plano de livre-comércio transatlântico que está a ser negociado com os Estados Unidos. Não é certo que o consiga fazer. A Áustria é um regime semi-presidencialista e a posição de chefe de Estado é sobretudo de representação, mesmo que Hofer prometa vigiar mais atentamente os passos do Governo de coligação, que até muito recentemente admitia destituir para convocar eleições antecipadas — o seu próprio partido lidera as sondagens para as legislativas de 2018.

Muitos duvidam de uma presidência activista de Hofer. “Se pressionar demasiado, pode desmascarar-se, fazendo com o FPÖ perder apoio antes das eleições parlamentares”, escreve Gustav Gressel. Mas muitos sublinham também o passado do candidato nacionalista para deixar entrever um Hofer menos moderado e mais próximo da imagem tradicional do seu partido, fundado em parte por sobreviventes nazis no pós-guerra. “É um lobo com pele de cordeiro”, disse um antigo militante nacionalista ao Guardian.

Hofer tem um longo registo de declarações polémicas num país consciencioso sobre o seu passado nazi. Ao reescrever o manifesto do FPÖ em 2011, introduziu a promessa de “dedicação ao povo e cultura alemã” — segundo ele, a “Áustria é uma nação”, não um país. Mas é nas suas críticas passadas à onda moderadora do partido na década de 80 que Hofer mais se denuncia — nesses anos, os nacionalistas abandonaram a sua encarnação racista. “Parece estranho quando as pessoas negam as suas próprias raízes”, disse Hofer em 1999.