Espanhóis lançam OPA para ficar com 100% do BPI

O preço de 1,113 euros por acção, oferecido pelo Caixabank, é inferior à última cotação do banco e fica 16% aquém da OPA de Fevereiro de 2015.

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PÚBLICO/Arquivo

Depois de os dois maiores accionistas do BPI terem rompido o acordo anunciado ao mercado no passado dia 11 de Abril, e que permitira reduzir a exposição do banco ao mercado angolano, os espanhóis do Caixabank resolveram passar ao ataque e avançaram nesta segunda-feira com uma oferta pública de aquisição (OPA) para passar a controlar 100% do capital da instituição bancária liderada por Fernando Ulrich.

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Depois de os dois maiores accionistas do BPI terem rompido o acordo anunciado ao mercado no passado dia 11 de Abril, e que permitira reduzir a exposição do banco ao mercado angolano, os espanhóis do Caixabank resolveram passar ao ataque e avançaram nesta segunda-feira com uma oferta pública de aquisição (OPA) para passar a controlar 100% do capital da instituição bancária liderada por Fernando Ulrich.

Os espanhóis propõem-se em pagar 1,113 euros por cada acção que não controlam do BPI, e justificam o preço como sendo a média da cotação do banco nos últimos seis meses. No entanto, este valor é 6,5% abaixo da última cotação de fecho do BPI, de 1,191 euros.  Os títulos do banco já não transaccionam em bolsa desde 8 de Abril, por determinação do regulador.

A contrapartida também fica 16% aquém dos 1,329 euros a que o Caixabank avaliou cada acção do BPI em Fevereiro de 2015, naquela que foi a primeira OPA lançada pelo grupo catalão. Na altura, o preço também representava a média ponderada da cotação dos seis meses anteriores à data da oferta, mas significava um prémio de 27% face à avaliação do banco na altura.

Depois da OPA de Fevereiro de 2015, a administração do banco, tal como manda a lei, foi chamada a pronunciar-se sobre o valor da oferta, tendo dito na altura que o valor de 1,329 euros não reflectia “o valor actual do BPI, pelo que não recomenda aos seus accionistas que aceitem aquela oferta".

Na altura, a administração liderada por Fernando Ulrich defendia para o banco um preço justo de 2,26 euros por título. “Este valor divide-se em 1,12 euros pela actividade doméstica e 0,92 pela internacional, o que totaliza 2,04 euros. Depois, há ainda  que contar com 0,22 euros do valor das sinergias anunciadas pelo oferente. Assim, chega-se aos 2,26 euros”, ou seja, 70% acima do valor por título oferecido pelo CaixaBank na OPA de Fevereiro de 2015, ou 103% acima do valor da oferta que foi feita esta segunda-feira.

Oferta condicionada à desblindagem dos estatutos

A OPA de Fevereiro de 2015 acabou por terminar sem sucesso, já que a holding de Isabel dos Santos, a Santoro Finance, que controla directamente 18,58% BPI, inviabilizou a proposta de desblindagem dos estatutos feita na assembleia-geral do banco em Junho do ano passado.

Os estatutos do BPI não permitem que nenhum accionista vote com mais de 20% do capital nas assembleias-gerais, independentemente da quantidade de acções detidas. Esta limitação impedia o CaixaBank, que detém 44,10% das acções, de votar com mais do que 20% do capital.

Por isso é que os espanhóis voltam agora a condicionar o sucesso da OPA anunciada hoje à desblindagem dos estatutos. No comunicado enviado à Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) diz que a oferta “está condicionada à eliminação do limite de direitos de voto do Banco BPI, a adquirir mais de 50% do capital do Banco BPI e a obter as autorizações regulatórias aplicáveis”.

Só que, ao contrário do aconteceu no ano passado, nesta altura o Caixabank poderá contar com um aliado de peso, já que na semana passada o Governo enviou para promulgação à Presidência da República um diploma que altera o Código de Valores Mobiliários e que coloca um fim à regra da blindagem dos estatutos nas empresas cotadas. Caso Marcelo Rebelo de Sousa dê luz verde à nova lei, na prática Isabel dos Santos perde a espécie de direito de veto que detém no BPI, já que os espanhóis do Caixabank poderão, sem nenhuma limitação, votar com os 44,10% de capital que detêm.

Espanhóis pedem tolerância adicional ao BCE

Com esta solução, o Caixabank fica com o caminho aberto para mandar no BPI e também fica com o poder para resolver sozinho o problema do banco em Angola.

Como o Banco Central Europeu (BCE) não reconhece a supervisão angolana, obrigou o banco de Fernando Ulrich a reduzir a sua exposição a esse mercado, onde o BPI controla 50,1% do capital do Banco de Fomento Angola (BFA). Os restantes 49,1% são detidos pela Unitel, operadora angolana controlada pela empresária Isabel dos Santos.

No dia 11 de Abril, os dois maiores accionistas do BPI comunicaram ao mercado ter chegado a acordo para resolver este problema que há muito se arrastava, (provavelmente com a venda de parte do BFA a Isabel dos Santos e com a saída desta do BPI), mas este fim-de-semana a administração do BPI anunciou o rompimento das negociações.

Tal como o PÚBLICO noticiou este domingo, o rompimento das negociações deveu-se ao facto de o Banco de Portugal ter negado dar à empresária angolana o registo de idoneidade para exercer funções na administração do BIC Portugal, onde é a maior accionista. Nos planos dos angolanos estaria uma eventual junção do BFA com o BIC e a eventual cotação desta nova instituição na Bolsa de Valores de Lisboa.

No comunicado enviado hoje ao mercado, o CaixaBank diz que manteve conversações com o BCE para mantê-lo informado da oferta, tendo solicitado ao banco central “a suspensão de qualquer procedimento administrativo contra o Banco BPI relativamente à sua situação de excesso de concentração de riscos com o intuito de permitir ao CaixaBank encontrar uma solução para a referida situação no caso de que finalmente adquira o controlo do Banco BPI”. É que a violação da ordem do BCE para redução da exposição a Angola poderia representar uma multa diária de 162 mil euros a serem pagos pelo BPI.

Caso esta OPA tenha sucesso, e os accionistas do banco levantem a limitação à contagem dos votos, o CaixaBank poderá já não precisar de um acordo com Isabel dos Santos para resolver esta questão da exposição excessiva do BPI a Angola. E se o BPI for integrado no banco catalão, uma instituição de maior dimensão, a própria obrigatoriedade imposta pelo BCE da redução da exposição ao mercado angolano poderá sofrer alterações.

A OPA é “um passo lógico”, diz o banco catalão

Num comunicado publicado pela Comissão Nacional de Valores Mobiliários, a contraparte espanhola da CMVM, o Caixabank explica que, ao eliminar o actual limite dos direitos de voto, "alinha os seus interesses económicos e políticos no BPI".

O banco catalão considera que a OPA é “um passo lógico” na sua expansão internacional, “dado o seu conhecimento do BPI e do mercado bancário português, onde o Caixabank está activo desde 1995”. Além disso, e ao ganhar influência sobre o futuro do BPI, o banco garante que “continuará a empregar os seus esforços na procura de uma solução para o excesso de concentração de risco em Angola”.

Do ponto de vista do BPI, uma OPA que chegue a bom porto permitirá ao banco português, segundo o Caixabank, “recuperar a rentabilidade do seu negócio bancário mediante a geração de sinergias de custos”, assim como a geração de sinergias de receitas.

De acordo com as contas apresentadas pela Caixabank, o potencial de sinergia de custos previsto para o terceiro ano após a OPA é “elevado”, estimando-se em 85 milhões de euros. No primeiro ano as sinergias esperadas ascendem aos 40 milhões e no segundo a 70 milhões de euros. Já as sinergias de receitas estimadas chegam aos 35 milhões de euros por ano, tendo em conta as “melhores práticas do Caixabank”.

No resumo que faz sobre a proposta do ponto de vista dos accionistas do BPI, o Caixabank diz que apesar de o preço oferecido por acção estar 16% abaixo da oferta feita no ano passado, representa um “preço razoável para ambas as partes”. E promete uma “melhoria significativa da eficiência futura, como resultado das sinergias de custos e de receitas”.

O capital do BPI, além das tranches detidas pelo Caixabank e Isabel dos Santos, é detido em 8,42% pelos alemães da Allianz e em 2,58% pela família Violas.

O remanescente está nas mãos de mais de 20 mil accionistas. Segundo informação do banco de 31 de Março, “19.866 accionistas são particulares detendo 11,1% do capital, enquanto 473 pertenciam às classes dos investidores institucionais e das empresas e detinham os remanescentes 88,9% do capital”.

O PÚBLICO tentou contactar a CMVM para saber se as acções do BPI vão retomar a negociação, depois de uma semana de suspensão, mas ainda não obteve resposta.