"Destruir uma ponte é fácil e rápido, reconstruir é uma tarefa mais complexa", diz Castro a Obama

Presidentes de Cuba e dos EUA estiveram reunidos no Palácio da Revolução. Antes, Barack Obama depositou uma coroa de flores no monumento que homenageia o herói da independência de Cuba, José Martí.

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Era uma imagem que os cubanos não imaginariam ser possível há pouco mais de um ano: o seu Presidente, Raúl Castro, à porta do Palácio da Revolução, a sede do Governo do país, à espera de apertar a mão ao Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, enquanto uma guarda de honra do Exército tocava o hino norte-americano. “É um novo dia”, sublinhou Obama, falando em espanhol.

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Era uma imagem que os cubanos não imaginariam ser possível há pouco mais de um ano: o seu Presidente, Raúl Castro, à porta do Palácio da Revolução, a sede do Governo do país, à espera de apertar a mão ao Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, enquanto uma guarda de honra do Exército tocava o hino norte-americano. “É um novo dia”, sublinhou Obama, falando em espanhol.

“Está a gostar de Havana?”, quis saber Raúl Castro, à entrada do líder norte-americano no edifício mais representativo do sistema comunista da ilha. “Gostei muito do pequeno passeio que fizemos à noite. E o jantar foi excelente!”, respondeu Obama, informando o seu anfitrião sobre a primeira parte informal da sua visita a Cuba. Foram as únicas palavras de circunstância que as câmaras conseguiram captar, antes de os dois se retirarem para a sua reunião oficial.

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O aperto de mão entre Obama e Raúl Castro Carlos Barria/Reuters

Depois de dois anteriores (e breves) contactos bilaterais, no âmbito da cimeira inter-americana do Panamá, de Abril de 2015, e da Assembleia-Geral da ONU, em Setembro passado, a reunião entre Raúl Castro e Barack Obama no Palácio Presidencial de Havana foi uma discussão prolongada, substantiva e “muito proveitosa”, segundo a descrição do líder cubano. Na agenda estavam temas económicos e políticos e as matérias mais delicadas de direitos humanos e democracia; na conferência de imprensa no fim do encontro Castro concentrou-se nos primeiros – os entendimentos e instrumentos bilaterais que foram assinados para a cooperação em áreas como a agricultura, o ambiente, a segurança e o combate ao narcotráfico ou a saúde – e Obama referiu-se aos segundos.

“Temos valores comuns mas também diferenças profundas. Cuba é soberana e o seu futuro depende e será decidido pelos cubanos. Nós não queremos ditar. Mas não deixaremos de falar de direitos humanos, de liberdade de expressão e de reunião, liberdade religiosa, porque são valores em que acreditamos”, afirmou o Presidente dos EUA, sublinhando que apesar do compromisso de ambos os Governos com a normalização e estabilização das suas relações, o seu relacionamento “não se transformará da noite para o dia”.

Raúl Castro reconheceu que “algumas das diferenças não vão desaparecer porque nos dois países as ideias são muito diferentes” no que diz respeito a sistemas políticos, democracia, o exercício dos direitos humanos, a justiça social, as relações internacionais, a estabilidade e a paz no mundo, enumerou. “Podemos aprender a arte de coexistir com as nossas diferenças de forma civilizada”, acrescentou.

A cordialidade com que decorreu a conferência de imprensa só foi interrompida quando um jornalista da CNN perguntou a Raúl Castro porque é que Cuba tinha presos políticos e quando iria libertá-los. “Diz-me quem são, dá-me uma lista. Se eles existem, esta noite mesmo serão todos soltos”, ripostou, exaltado.

Mas o que sobressaiu foi o tom optimista e auspicioso com que os dois Presidentes se referiram ao futuro. “Coincidimos que há um caminho longo a percorrer mas o importante é que começámos a dar passos para um novo relacionamento. Destruir uma ponte é fácil e rápido; reconstruir é uma tarefa mais complexa”, lembrou Raúl Castro. “Este é um novo tempo de esperança no futuro, e como dizem os cubanos, hechar para adelante!”, concordou Obama.

Não resolvida ficou para já, a questão do embargo comercial que vigora desde 1962 e que, insistiu Raúl Castro, “é o obstáculo mais importante para o progresso e desenvolvimento do país. A sua eliminação será essencial para a normalização das relações entre os dois países, e também para a emigração cubana que deseja o melhor para as suas famílias e o seu país”, declarou. O líder cubano reconheceu a postura de Obama e da sua Administração contra o bloqueio, “e os seus repetidos apelos para a acção do Congresso”. Inquirido sobre o tema, Obama limitou-se a prever o fim do embargo: “Vai acabar, não sei quando, mas sei que vai acabar, porque não serve os nossos interesses”.

O Presidente dos Estados Unidos chegou a Havana no domingo à noite, para uma visita oficial a todos os títulos histórica. Os dois países, inimigos depois da revolução liderada por Fidel Castro para depor o Presidente Fulgêncio Batista, puseram de parte décadas de antagonismo e anunciaram o “descongelamento” das suas relações diplomáticas em Dezembro de 2014. Desde então, têm dado passos significativos no sentido da normalização da sua ligação política e económica, através da reabertura das respectivas embaixadas em Washington e Havana, e de iniciativas administrativas para facilitar as trocas comerciais, o investimento e as transferências financeiras, as viagens e o turismo.

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O encontro entre os dois Presidentes Carlos Barria/Reuters

Os resultados do trabalho destes 15 meses não se fazem sentir da mesma maneira nos dois países, embora o entusiasmo das populações cubana e norte-americana com esta nova fase de abertura esteja ao mesmo nível. De um lado e do outro, a nova política goza de um imenso apoio popular, que só esbarra na desconfiança e resistências da classe política tanto nos EUA como em Cuba.

Nas suas primeiras horas em Cuba, no domingo à noite, o Presidente norte-americano cumpriu um itinerário turístico – com a diferença de que todos os pontos de interesse estavam vedados ao público e à sua inteira disposição. O programa oficial começou de manhã cedo, com uma cerimónia breve mas simbólica na vasta Praça da Revolução. Barack Obama depositou uma coroa de flores junto do monumento a José Martí, o poeta e revolucionário que é o herói da independência de Cuba, e deixou uma mensagem no livro de visitas oficiais. “É uma grande honra poder prestar tributo a José Martí, que deu a vida pela independência do seu país. A sua paixão pela liberdade e a auto-determinação perdura até hoje no espírito do povo cubano”, escreveu.

Na mesma praça, mais esculturas gigantes dedicadas a outros heróis da nação cubana acentuavam o carácter histórico do momento – olhando para o horizonte, Obama podia ver as efígies de Ernesto “Che” Guevara ou de Camilo Cienfuegos, dois companheiros de Fidel Castro e símbolos da revolução e da resistência ao imperialismo, nas fachadas dos edifícios ministeriais.

A primeira e última vez que um Presidente norte-americano esteve em Havana para conversações ao mais alto nível foi em 1928: como lembrou Barack Obama, o Presidente Calvin Coolidge demorou três dias a viajar entre os Estados Unidos e Cuba, a bordo de um navio de guerra, o USS Texas; o seu avião Air Force One aterrou ao fim de três horas.

Como há quase 90 anos, Obama foi a Havana com uma missão precisa: manifestar a abertura e a boa-vontade do seu país relativamente a Cuba, e a sua dedicação aos valores da paz, liberdade e democracia como a base do seu relacionamento. “Chegou o momento de trocarmos as espadas pelos arados”, declarou Coolidge em 1928. No século XXI, Obama prometeu outra tecnologia, anunciando um acordo com a Google para desenvolver a rede de banda larga e de Wi-Fi na ilha.

As autoridades cubanas fizeram um esforço para manter o Presidente e a comitiva norte-americana relativamente isolada da população cubana. Não há imagens de banhos de multidão em Havana, ao contrário do que aconteceu por exemplo com a visita do Papa Francisco, mas é notória a curiosidade e o entusiasmo dos habitantes da capital com a visita de Obama – o batalhão de jornalistas internacionais que acompanha em Havana a visita histórica de Obama também não esconde a sua emoção. É desconcertante ver tantas bandeiras dos EUA em Cuba, e não ouvir os habituais slogans que mandam os “ianques de volta a casa”, reparam.

Os momentos de maior euforia popular deverão acontecer na terça-feira, o dia que Barack Obama reservou para o contacto mais directo com a população cubana. O Presidente dos EUA faz um discurso no Parque Central de Havana, com transmissão em directo pela televisão estatal; reúne-se com dissidentes políticos e assiste a um jogo de baseball – ou “beisból” – entre a selecção de Cuba e a equipa dos Tampa Bay Rays, da Florida.