Quantos chumbaram por causa do exame do 4.º ano?

Contas feitas pelo IAVE e pelo CNE revelam que a percentagem é residual.

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Na próxima semana há exames para os alunos do 4.º ano do básico PÚBLICO/Arquivo

Os exames de 4.º ano terminam três anos depois de terem começado. O chumbo dos alunos foi um dos argumentos usados na Assembleia da República para justificar que este ano já não sejam feitos. Contudo, segundo dados do Instituto de Avaliação Educacional (Iave), responsável pela sua elaboração, e do Conselho Nacional de Educação, a percentagem de chumbos é residual.

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Os exames de 4.º ano terminam três anos depois de terem começado. O chumbo dos alunos foi um dos argumentos usados na Assembleia da República para justificar que este ano já não sejam feitos. Contudo, segundo dados do Instituto de Avaliação Educacional (Iave), responsável pela sua elaboração, e do Conselho Nacional de Educação, a percentagem de chumbos é residual.

Hélder de Sousa, presidente do Iave, confirma que no primeiro ano de exames, 2013, a percentagem de chumbos foi maior: 2,38% a Português e 1,90% a Matemática. Mas no último ano lectivo desceu drasticamente para 0,03% e 0,08% a Português e a Matemática, respectivamente. “No ano de supressão das provas do 4.º ano, o efeito na aprovação em consequência do exame foi positivo, ou seja, passaram mais alunos do que os que reprovaram”, diz ao PÚBLICO.

O CNE avança com outros números que são também “residuais”, como classifica David Justino, ex-ministro da Educação do PSD e actual presidente do conselho, ao PÚBLICO. A saber: qual é o número de alunos que indo com nota positiva a exame sai com uma negativa que os faz chumbar? Entre 1 e 2%. David Justino acrescenta ainda outro número, a percentagem de crianças que indo a exame com negativa têm positiva: 0,7%.  “Este é um valor que também tem de ser considerado, porque conta para a nota. Temos de olhar para os que vão e perdem, mas também para os que vão e ganham”, defende.

Hélder de Sousa lembra ainda que os alunos com piores resultados tinham a oportunidade, desde o ano passado, de ir a uma 2.ª fase. Embora reconheça que foram pouquíssimos os alunos que conseguiram reverter a sua situação, entre 0,2 e 0,5%, essa segunda oportunidade não foi perdida. Contudo, reconhece que “toda esta arquitectura precisa de ser repensada”.

Portanto, o que se conclui é que o efeito dos exames para a retenção é insignificante. Isso acontece porque valem 30%, mas se tiverem um peso de 25% (como aconteceu no primeiro ano em que foram feitos), então já não têm qualquer influência no resultado final do aluno. “É neutro”, classifica Hélder de Sousa que sugere que os alunos do 1.º ciclo deixem de ser classificados de 1 a 5, mas de 1 a 10. “Permitiria resolver muitos problemas de transição, seria uma questão de justiça perante o sistema que temos. Essa é uma matéria de decisão política”.

Importância da avaliação externa

Ao mudar a natureza da prova, por exemplo, voltar a ser aferida, esta deixa de contar para a classificação do aluno, e, por mais baixa que seja, a taxa de retenção, esta não se altera – segundo o último relatório do Estado da Educação, do CNE, é de 5% no 4.º ano. “É neutra”, define Hélder de Sousa.

“A avaliação externa tem a vantagem de pôr pressão positiva no sistema porque obriga ao cumprimento do programa, ao rigor e, no fim do ciclo, traz equilíbrio”, defende. “Quando não há avaliação externa, independente, há uma tendência para o declínio e para a mediocridade. A avaliação é necessária”, afirma, lamentando que a avaliação tenha ido pelo “sentido errado” porque a preocupação é só com o resultado, quando há “imensos dados” sobre os quais os professores e as famílias deveriam reflectir. O importante é saber o que os alunos não aprenderam, diz. No 1.º ciclo, “a necessidade de haver controlo é maior porque é o ciclo determinante” para o percurso escolar dos alunos, e é o maior de todo o sistema de ensino. Portanto, “tem de ter regulação”, defende.

Recorde-se que o CNE tem defendido, em diversos pareceres, nos últimos anos, a existência de avaliação externa. E essa passa ou por exames nacionais ou por provas de aferição.

Avaliar as Ciências?
A decisão de acabar com a prova de 4.º ano foi, segundo Hélder de Sousa “precipitada” porque “desgarrada de tudo o resto”, dos outros ciclos. Ou seja, é preciso pensar num “modelo integrado de avaliação externa para o ensino básico, do 1.º ao 9.º ano”, que “vá à procura deste lado positivo e qualitativa da avaliação e informação porque todos queremos o sucesso e esse só se consegue se os alunos aprenderem mais e melhor e isso é mais do que a memorização”, diz o responsável.

Hélder de Sousa sugere mais uma prova, a de Ciências – tal como acontece com as provas da OCDE, que analisam a literacia na língua, matemática e ciências. “Não faz sentido”, os alunos fazerem provas internacionais de Ciências e não existir uma internamente", justifica. “Ter provas só a Português e a Matemática é redutor.”