Garantir independência técnica e institucional nas peritagens médicas

Não obstante a sempre desejável conciliação, o recurso a uma segunda avaliação médica pericial faz, cada vez mais, parte do processo.

Segundo os dados estatísticos da ANSR - Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, este ano, no período de 1 de Janeiro a 7 de Julho, foram registados 60.467 acidentes rodoviários.

Foram registados mais 2.708 acidentes do que em 2014. Também os feridos graves (1) aumentaram este ano, tendo ficado gravemente feridas 1.074 pessoas, mais 88 do que no ano anterior. No mesmo período foram também registados 17.680 feridos leves (2), ou seja, mais 198 do que em 2014.

É consensual a importância de uma peritagem médica independente para avaliação das (in)capacidades dos Cidadãos. Tem especial relevância em contexto de avaliação de dano corporal após acidente de viação ou de trabalho.

O resultado de uma peritagem de dano corporal é materializado em relatório pericial elaborado por Perito Médico com formação específica em avaliação de dano corporal pós-traumático. Tem como principal objectivo a descrição e qualificação/quantificação médico-legal de sequelas pós-traumáticas.

O Perito Médico não deve estar sujeito a quaisquer constrangimentos de ordem técnica, financeira ou institucional. Deve executar o acto médico pericial com imparcialidade, isenção e independência, cumprindo as orientações técnicas vigentes para elaboração de relatórios de dano corporal. O eventual desrespeito destas orientações origina críticas depreciativas da peritagem e do respectivo relatório, o que acontece com frequência.

É desejável que o Perito Médico esteja disponível para acompanhar os processos em que intervém.

Estes são alguns dos eventos traumáticos que exigem, frequentemente, avaliação de dano corporal:

- Acidentes de trabalho

- Acidentes de viação

- Acidentes Pessoais

- Doenças Profissionais

- Agressões / Violações

- Procedimentos médico-cirúrgicos

Para que um relatório de avaliação de dano esteja completo, todos os parâmetros de dano devem ser considerados para qualificação.

O eventual pagamento de uma indemnização/compensação por danos corporais decorrentes de um evento traumático varia em função de vários factores. Nomeadamente, incapacidades arbitradas, períodos de incapacidade estabelecidos e implicações que as sequelas têm no dia-a-dia e no futuro da vítima. Varia, também, de acordo com o âmbito do Direito em que decorre a avaliação e com os normativos legais a que está sujeita a respectiva indemnização/compensação.

Numa época em que as restrições e constrangimentos financeiros e económicos se agudizam, o rigor nestas avaliações afigura-se fundamental para a justa reparação de danos físicos e psíquicos, sem benefício assimétrico ou injusto, para o Cidadão lesado e para a Entidade pagadora.

Justiça, imparcialidade, ausência de conflito de interesses e de incompatibilidades técnicas e institucionais, nas actividades periciais médicas, são indispensáveis para as instituições e para os Cidadãos.

A propósito:

"os peritos médico-legais não podem, em alguma circunstância, peritar um sinistrado e simultaneamente trabalhar para companhias de seguros. A exclusividade é, nesta matéria, crucial, e quando o tribunal nomeia o perito do sinistrado, deverá assegurar-se de que não incorre neste risco." - Observatório Permanente da Justiça, 2011

"as funções de médico assistente e médico perito são incompatíveis, não devendo ser exercidas pela mesma pessoa." - Artigo 120.º do Código Deontológico da Ordem dos Médicos

Muitos Cidadãos deixam transparecer a sua preocupação acerca de casos de conflitos de interesse e de objectivos desfocados da real e justa compensação do dano sofrido. Não sendo este clima de desconfiança benéfico para qualquer das partes - Cidadãos e Instituições - ele parece acentuar-se ao longo do tempo.

Assim, a avaliação de dano corporal - alterações na integridade psico-física - também designada por perícia/peritagem médica para avaliação de dano corporal pós-traumático ou de dano na pessoa - é uma actividade médica que permite avaliar, qualificar e quantificar, do ponto de vista médico-legal, sequelas (disfunções/incapacidades permanentes com origem em lesões traumáticas) decorrentes de eventos traumáticos, bem como o eventual estabelecimento do nexo de causalidade entre evento e dano.

Estas peritagens são realizadas, habitualmente, no decurso de processos, muitas vezes litigiosos, entre o Cidadão sinistrado/lesado e uma entidade eventualmente responsável pelo pagamento de indemnização/compensação por danos. Neste contexto, os litígios entre as partes intervenientes resultam, não só de desentendimentos de ordem processual e administrativa mas, fundamentalmente, de divergências de opinião quanto às incapacidades arbitradas e outros parâmetros de dano, tais como dependências (ex. necessidade de ajuda de terceira pessoa).

No entanto, a assimetria da informação, do conhecimento da capacidade financeira e de influência entre as partes envolvidas é uma realidade.

São utilizados os argumentos, instrumentos e estratégias que melhor servem os objectivos de cada uma das partes.

Não obstante a sempre desejável conciliação, o recurso a uma segunda avaliação médica pericial faz, cada vez mais, parte do processo quando não há acordo entre entidade pagadora e Cidadão lesado.

Cabendo ao Juiz a livre apreciação das provas, a valorização de quaisquer relatórios ou pareceres compete, em última instância, ao próprio Juiz que é o “perito dos peritos” (peritus peritorum).*

 

(1) Ferido Grave: vítima de acidente cujos danos corporais obriguem a um período de hospitalização superior a 24 horas e que não venha a falecer nos 30 dias após o acidente.

(2) Ferido Leve: vítima de acidente que não seja considerada ferido grave e que não venha a falecer nos 30 dias após o acidente.

Director da Best Medical Opinion - Pareceres Médicos & Perícias Médicas

 

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