Torne-se perito

Quando foi a última vez que comeu um dinossauro ao almoço?

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Os dentes serrilhados do T-rex, com 15 centímetros de comprimento, estavam adaptados para rasgar a carne das presas DANIEL ESPÍRITO-SANTO/CIÊNCIA VIVA

Concebida no Museu de História Natural de Londres, exposição chega a Lisboa e inclui fósseis portugueses - como um mamífero primitivo encontrado perto de Leiria e ovos com embriões de dinossauro da Lourinhã

O T-rex e companhia daqueles tempos longínquos, antes de um meteorito ou um supervulcão, ou os dois em conjunto, terem dado cabo deles há 65 milhões de anos, já estão à sua espera no Pavilhão do Conhecimento, em Lisboa, até Agosto de 2013. A exposição T-rex, quando as galinhas tinham dentes é uma viagem ao passado com fósseis, réplicas, modelos robotizados e muitas perguntas. Será que o T-rex alguma vez pisou o que é agora solo português? E, com ele, terão desaparecido todos os outros dinossauros?

Entre os modelos robotizados trazidos do Museu de História Natural de Londres, que concebeu a exposição, está um T-rex a comer uma das presas, no caso um Triceratops. Se o T-rex metia respeito, com os seus 12 metros de comprimento e 60 dentes serrilhados e pontiagudos, prontos a rasgar carne, o Triceratops não metia menos, ou não fosse detentor de três cornos proeminentes para defesa e, na parte de trás do pescoço, um escudo ósseo o protegesse. Mas nesta cena é o Triceratops que está no chão, ferido de morte.

Como estrela da exposição, e protagonista entre os grandes carnívoros terrestres, o T-rex tem direito a um modelo em tamanho real e à réplica de um esqueleto. Para tocar, e ter uma ideia de como é um fóssil - o processo de fossilização transformou o osso em rocha -, os visitantes têm ainda réplicas de um fémur e de maxilar inferior.

Nem só de reproduções vive a exposição, nem o T-rex é a única vedeta. Descobertas em Portugal marcam presença, com a colaboração do Museu Nacional de História Natural e da Ciência e do Museu Geológico, em Lisboa, e ainda do Museu da Lourinhã. Ao geólogo Galopim de Carvalho, conhecido por causas como a defesa das pegadas de dinossauros, coube a coordenação científica.

Da Lourinhã, há um fragmento (original) do ninho de ovos de dinossauros carnívoros com embriões lá dentro, refere Leonel Alegre, o responsável pela Unidade de Educação do Pavilhão do Conhecimento.

Encontrado em 1998, este ninho de 140 milhões de anos é um achado de importância mundial e tornou o Museu da Lourinhã conhecido. Que dinossauro terá posto estes ovos? Pensa-se que foi o Lourinhanosaurus antunesi, uma espécie cujos ossos foram descobertos pela primeira vez na década de 1980, na Lourinhã. Era carnívoro e bípede e podia chegar aos oito metros de comprimento.

Ainda original, frisa Leonel Alegre, é o fóssil de uma conífera com 110 milhões de anos, estudado por cientistas das universidades Nova de Lisboa, de Évora e Coimbra. "Estava na ribanceira de uma estrada na região de Leiria, até que um investigador percebeu o que era. Conseguem ver-se os nós, a rugosidade da árvore."

Nesses tempos de dinossauros gigantes já havia mamíferos, ainda que muito pequenos. Aliás, apareceram ambos na mesma altura, há cerca de 230 milhões de anos, mas os mamíferos só se tornaram grandes após a extinção da maior parte dos dinossauros.

Da altura dessa convivência chegaram-nos fósseis de mamíferos primitivos, do tamanho de ratinhos e ouriços - e é aqui que a antiga mina (de carvão) da Guimarota, perto de Leiria, assume relevância mundial. Entre as décadas de 1960 e 1980, encontraram-se nela inúmeros fósseis do Jurássico, com 150 milhões de anos, embora seja famosa mundialmente pelos mamíferos. Foi ali que, em 1976, se encontrou o primeiro mamífero do Jurássico, o Henkelotherium guimarotae, que vivia nas árvores e comia insectos.

Outro ex-líbris da Guimarota é o Haldanodon exspectatus, com um estilo de vida como o das toupeiras. Pertencia a um grupo (os docodontes) que se extinguiu completamente, sem deixar descendentes, mas o Haldanodon foi o primeiro deles descoberto em todo o mundo. São os pequenos ossos deste mamífero (que até 2007 estavam na Alemanha, onde estiveram décadas a ser estudados, tal como outros fósseis da Guimarota) que os visitantes também podem apreciar na exposição. Em 2007 alguns dos fósseis foram devolvidos a Portugal, ao Museu Geológico.

E agora a questão que remete para o título da exposição e, igualmente, deste artigo. Sim, as aves já tiveram dentes e hoje, quando almoçamos uma ave, estamos na verdade a comer um dinossauro. Em vez do bico das aves actuais, os fósseis das aves primitivas, os antepassados longínquos das galinhas surgidos há 150 milhões de anos, exibem dentaduras. Mas se esta ideia pode ser estranha, mais estranho é quando se diz que as aves são dinossauros. Pois é assim que são consideradas. Nem todos os dinossauros se extinguiram, por isso, com o T-rex (que nunca teve qualquer osso recolhido em Portugal e só viveu na zona dos EUA e Canadá). Se a sua última refeição foi frango de churrasco, então sim, acabou mesmo de comer um dinossauro.

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