Chegou o livro que ensina como fazer o curso "na maior"

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Nuno Ferreira diz que este livro é o que toda a gente sabe, mas não teve coragem de dizer ENRIC VIVES-RUBIO

Não é preciso andar sempre agarrado aos livros para se ter boas notas no ensino superior. Ter vida social é tão importante para o futuro como tirar o curso. Muitos professores são chatos. Quase todos os alunos copiam. Dois antigos alunos universitários (um deles agora professor) escreveram um livro provocatório e didáctico que promete dar que falar. "Não importa o "quanto" estudas, mas sim "como" estudas"

Nuno Ferreira, de 32 anos, tinha dois objectivos quando decidiu escrever um livro sobre a vida académica: reviver os seus próprios tempos de estudante e ajudar os que agora frequentam, ou vão frequentar, o ensino superior. Resolveu a primeira questão trabalhando em conjunto com o seu amigo e antigo colega Bruno Caldeira. A segunda fica em aberto, pelo menos até o livro Faz o Curso na Maior chegar às mãos daqueles para quem foi escrito.

A capa é, assumidamente, provocatória. Sobre uma pilha de livros com títulos sugestivos como Anatomia Aplicada, Política & Teoria do Flirt ou Microrressaca, dois pares de óculos de sol. Um iPod e respectivos auscultadores emolduram o conjunto. Isto é um livro sobre métodos e experiências de estudo? Sim, porque a esta face provocatória corresponde um interior que consegue ser didáctico, mesmo que a obra esteja escrita num tom coloquial. E diga muitas coisas politicamente incorrectas.

A filosofia de base é que a vida universitária e a idade em que ela normalmente decorre são boas de mais para se desperdiçarem a estudar. Perdão?! Escreve-se um livro para dizer à rapaziada que não é preciso estudar? "Nada disso", explica Nuno Ferreira, licenciado em Economia pelo ISEG e mestre em Economia Monetária e Financeira, professor universitário (primeiro no ISCTE e agora na Lusófona) e quadro de uma consultora.

O que ele e Bruno Caldeira, licenciado em Engenharia Florestal e dos Recursos Naturais pelo Instituto Superior de Agronomia da Universidade Técnica de Lisboa e pós-graduado em Energia e Bioenergia pela Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, se propuseram fazer foi, explica Nuno, como "se estivéssemos sentados à mesa a conversar". Sobre como tirar um curso sem abdicar de viver.

Dirigido a uma geração que já tem fama - e proveito, diga-se - de imediatista, extremamente competitiva, incapaz de compreender as virtudes do trabalho continuado e do adiamento do prazer, este pode ser visto como um objecto perigoso. Afinal, garantir o canudo, e com boas notas, pode ser bem mais fácil do que se pensa. Mas por trás desta mensagem aparentemente facilitista está todo um conjunto de experiências que podem servir de base para um verdadeiro método de estudo.

"Não há um método, não gosto de falar de método quando abordo este livro", avisa Nuno Ferreira. "Os cursos são diferentes, as pessoas são diferentes, não há um método universal." A ideia é outra: fornecer pistas sobre regras básicas, truques simples, metodologias lineares que permitam passar exames. Porque é disso que se trata. O objectivo num curso é fazer as cadeiras. E isso não é sinónimo de acumular conhecimento.

Para "pessoas normais"

"Nenhum outro professor te vai dizer o que está escrito neste livro. Sabes porquê? Porque, ao contrário da maior parte deles, eu nunca fui um "cromo" quando era estudante. Mas acabei por chegar aonde eles chegaram. O destino foi o mesmo: tirar um curso superior com boas notas. A viagem para lá chegar é que foi diferente. Enquanto a deles foi uma seca, a minha dava um livro. Agora responde à pergunta: que viagem queres fazer? A deles ou a minha?" E só esta passagem da introdução de Faz o Curso na Maior chegaria para um mundo de polémicas.

Nuno Ferreira não duvida de que alguns professores, "mais conservadores", poderão "não gostar". Tudo bem. "Foi malta que não fez isto [curtir a vida enquanto estudava] e que acha que os alunos também não o devem fazer. Foram "cromos", tecnocratas, académicos. Acham que a universidade é trabalho a tempo inteiro, quando ele só aparece uns anos mais tarde." E os alunos ""cromos" também não se vão rever neste livro". O livro também não é para eles. "Eu e o Bruno somos pessoas normais e este livro é para pessoas normais, não para adiantados mentais."

Ou seja, apesar de "não esperar críticas violentas", mesmo vindas dos sectores mais ortodoxos, Nuno Ferreira já tem uma filosofia para lidar com elas: "Se disserem mal, ainda será melhor publicidade para nós." Esta divisão entre "nós" e "eles" não pode ser novidade para quem quer que tenha frequentado um curso superior. Há sempre aqueles para quem a vida é mais importante do que o curso e aqueles para quem o curso é a vida. E daí não virá grande mal ao mundo, excepto no pormenor de que, por defesa, muitos serão levados a estudar mais do que o necessário. É uma época pessoal de descoberta e emancipação, mas também de exigência académica e de responsabilização individual a que os alunos não estavam habituados no ensino secundário.

Nada disto é novidade. Tal como nenhum dos truques ou metodologias apontados no livro é "a descoberta da roda ou do fogo": "Este livro é o que toda a gente sabe mas não teve coragem de dizer." É como se os caloiros ou candidatos ao superior tivessem "uma conversa com alunos mais velhos" - um deles, entretanto, também professor. Daí o tom coloquial, em que se usa a segunda pessoa do singular para passar a mensagem. E as referências a exemplos - ouvir música, beber umas cervejas, namorar, curar ressacas, ver jogos de futebol - e personagens que são do domínio comum - Cristiano Ronaldo, Diana Chaves (esta na "única passagem do livro que é ficção")...

O livro parte de dois pressupostos: há que gozar a vida e há que garantir que isso não nos impede de conseguir boas notas no curso, um passo essencial para um futuro profissional. Quanto ao segundo, alinham-se conselhos, sugestões, truques e "dicas". Sobre o primeiro, apenas uma certeza: "É nesta idade que estabelecemos uma rede de contactos, fazemos amigos para a vida. E esses amigos e contactos serão fulcrais no nosso futuro pessoal e profissional."

A importância da partilha

No meio disto emerge uma noção importante: a partilha. "Cada geração é mais competitiva do que a anterior. E isto é mau. Na faculdade, é preciso olharmos para a turma como uma comunidade em que todos têm o mesmo objectivo", resume Nuno. Ou seja: tirar o curso. "O sucesso dos outros em nada diminui o meu. Ser individualista não faz sentido!" Trocar cadernos, deixar copiar nos exames ou passar enunciados a alunos que vêm a seguir são exemplos desse espírito colectivo.

Se já começou a torcer o nariz, prepare-se. O livro também fala de cábulas. Ensina como se fazem, elogia a sua utilidade como instrumento de estudo, método para treinar a capacidade de síntese, até como "calmante" na hora de entrar para os exames. Mesmo que não sejam utilizadas, as cábulas servem para dar aos estudantes um sentimento de segurança. E quando são utilizadas? Nuno Ferreira não ilude a questão: "Isso não vou defender, porque é batota. Mas não posso deixar de constatar que, segundo estudos feitos, 70 por cento dos alunos copiam nos exames. Escrever um livro sobre como tirar um curso e não falar de cábulas seria hipócrita."

Escrito por um tipo que "não falhava uma festa", praticou desporto e faltava a muitas aulas e por outro que foi trabalhador-estudante durante toda a sua vida académica no ensino superior, Faz o Curso na Maior é um livro que explica como se pode "estudar menos, mas melhor". Avança uma cartilha, o PODER (Preparação - "Não sejas apanhado desprevenido"; Organização - "Maximiza os teus recursos"; Determinação - "Sincroniza-te com o objectivo"; Enfoque - "Diz não para dizeres sim"; e Realização - "Faz acontecer"), dá conselhos, desfaz mitos.

Entre estes últimos, avultam alguns que nos habituámos a ouvir sempre e que parecem leis basilares. Mas que, dizem os autores, são falsos. "É preciso ir às aulas para passar de ano" - verdade no secundário, mentira no superior: "O sucesso depende dos teus objectivos e da tua motivação e nunca da assiduidade nas aulas." Ou então que "é preciso estudar a matéria toda" - nada disso: "A melhor forma de saberes o que vai sair no exame é olhares para os exames dos anos anteriores"; "Estudar a matéria toda é importante porque te dá oportunidade de adquirir conhecimentos sobre todo o programa da disciplina. Mas estudar a matéria toda não te garante o sucesso no exame! Lembra-te sempre que o tempo é limitado e que o segredo é seres eficaz."

Na base de tudo está o princípio 80/20, descoberto em 1906 pelo economista italiano Vilfredo Pareto. E ele diz-nos que 80 por cento dos resultados são gerados por 20% do esforço investido. Isto é válido para as mais variadas áreas e o rendimento académico não foge à regra - o que Nuno e Bruno nos dizem é que é possível só estudar a sério durante um quinto do ano para obter bons resultados. Mas quando se fala em estudar a sério, é mesmo a sério!

Testemunhas vivas do sucesso do seu, digamos, "método", os autores do livro, que saiu para as bancas já a 1 de Outubro, garantem não estar sozinhos. Nuno promete mesmo que a apresentação da obra (no dia 13, na FNAC do Chiado, em Lisboa) contará com a presença de "gente nova e conhecida que se deu bem com estas ideias". Cada um com a sua história. Afinal, como se lê na conclusão da obra, "um curso superior é um daqueles casos em que a viagem é mais importante do que o destino final".

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