A lógica do modelo dual

Foto

Em muitos países europeus, como Espanha, França, Itália e Portugal, além das polícias de natureza civil, existem forças militares especialmente formadas e preparadas para o exercício da segurança interna. Forças geralmente conhecidas pelo nome de gendarmeries. Que se saiba, nenhum dos países onde vigora este modelo está interessado em pôr-lhe fim. Pelo contrário, com frequência ouvem-se lamentos de outros países pelo facto de não o possuírem.

Uma vez que existem situações de perturbação da ordem pública e de atividade criminosa que exigem respostas munidas de diferentes capacidades, o modelo dual permite maior eficiência na ação sem afetar a economia de meios. Uma única estrutura organizada para fazer face a qualquer das diferentes situações teria de dispor da totalidade dos instrumentos de força (equipamentos e pessoal devidamente preparado para os utilizar) apropriados a enfrentar todo o leque de ameaças, das mais simples e de menor intensidade às mais complexas e de maior intensidade, o que teria o risco de a transformar num organismo demasiado pesado, pouco rentável e eficiente.

Existem três níveis de intervenção para garantir a ordem e tranquilidade pública. O primeiro nível, que poderemos caracterizar por menos intenso, visa o tratamento da pequena criminalidade do dia-a-dia e a garantia do cumprimento das regras indispensáveis ao normal funcionamento social: poderá ser respondido por forças de segurança interna menos robustas. O terceiro, que reproduz uma situação de desordem social intensa e persistente suscetível de se transformar em anarquia generalizada capaz de pôr em causa a autoridade do Estado e ameaçar o funcionamento das instituições democráticas: só pode ser travado pelas Forças Armadas mediante a declaração de um dos estados de exceção (de emergência ou de sítio).

Entre estes dois níveis situa-se um patamar intermédio, que se caracteriza pela existência de criminalidade organizada e muito violenta, de ameaças de elevada intensidade a pontos sensíveis e da possibilidade de ocorrerem ações que paralisem áreas críticas do funcionamento da sociedade ou perturbem o exercício da autoridade do Estado. Patamar em que, embora se não justifique a declaração de um estado de exceção e o consequente emprego das Forças Armadas, recomenda a utilização de forças militares preparadas para a ação policial em condições de fazer face a ameaças mais elevadas e a perturbações mais profundas do que as que caracterizam o primeiro patamar. Com a vantagem de serem forças cujos homens e mulheres estão comprometidos com uma permanente disponibilidade e a aceitação da limitação de certos direitos e do reforço de certos deveres próprios da condição militar.

Enquanto as Forças Armadas atuam no terceiro patamar, a Polícia de Segurança Pública e a Guarda Nacional Republicana destinam-se a agir respetivamente nos primeiro e segundo patamares. Esta lógica dual da segurança interna, civil e militar, não deve impedir a existência de capacidades comuns às forças, assim como alguma sobreposição limitada de funções. Mas exige que tenham capacidades específicas para, de acordo com elas, ser possível conferir-lhes áreas funcionais e áreas geográficas. Sem uma correta divisão de funções com base em capacidades diferenciadas, serão inevitáveis os conflitos de competências.

Convém pôr fim, urgentemente, à confusão de missões atualmente existente - ambas as forças com idênticas capacidades, podendo desempenhar as mesmas missões. Esta situação, além do desperdício resultante de sobreposições exageradas, torna inexplicáveis os critérios em que se baseiam as áreas geográficas onde atuam e as tarefas que desempenham.

Sugerir correcção