Estado devolveu 85,7 milhões de euros em IVA à Igreja Católica entre 2005 e 2009

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A Igreja Católica recebe mais que as restantes confissões religiosas radicadas em Portugal Nuno Ferreira Santos

Deputado socialista Vera Jardim diz que actual sistema é para fugir às regras da UE e defende fim do benefício fiscal, trocando-o por donativo no IRS

Entre 2005 e 2009, o Estado devolveu quase 86 milhões de euros a instituições da Igreja Católica ao abrigo do benefício do IVA de que as confissões religiosas podem usufruir. De acordo com o Ministério das Finanças, as restantes igrejas e confissões religiosas radicadas em Portugal receberam, no mesmo regime, pouco mais de 1,6 milhões de euros.

No caso da Igreja Católica, os valores devolvidos anualmente variaram entre os 12,7 milhões de 2006 até aos 22,4 milhões de 2008, a uma média de 1200 entidades por ano. A gigantesca diferença entre a Igreja Católica e as outras religiões prende-se com o facto de a primeira incluir as instituições de solidariedade social que lhe estão agregadas e que realizam obras com valores de investimento avultados.

Quanto aos montantes pagos entre 2008 e 2010 (mas referentes ao período 2006-2008), a título da consignação fiscal no IRS às restantes igrejas e confissões religiosas radicadas em Portugal, os números são baixos, mas têm vindo a aumentar. No primeiro ano, os contribuintes deram quatro mil euros, no seguinte o dobro e 10.546 euros em 2008. Se se somarem as instituições particulares de solidariedade social (IPSS), então os valores ultrapassam a fasquia dos 3,5 milhões de euros em 2009, distribuídos por um total de 116 entidades.

Os números foram facultados ao PÚBLICO pelo deputado socialista Vera Jardim, que os pediu em Outubro ao ministério de Teixeira dos Santos, quando o Governo anunciou querer acabar com os reembolsos do IVA às religiões e instituições não católicas, incluindo as IPSS. As Finanças estimavam que representasse uma poupança de 100 milhões de euros. Vera Jardim, um dos autores da lei da liberdade religiosa de 2001, considerava mesmo a proposta inconstitucional pela discriminação religiosa que criava.

Questionado sobre se estes valores justificam o fim dos benefícios em nome da contenção orçamental, o deputado socialista prefere defender uma mudança de sistema. "Era mais simpático e justo fazer como a Espanha: fixar um período transitório de três ou quatro anos para acabar com a devolução e depois passar a ser apenas a consignação nos impostos, que lá é de 0,8 e aqui de 0,5 por cento." Até porque este regime de devolução existente em Portugal "é para fugir à proibição da UE de isentar a Igreja de IVA. É um sistema um pouco esdrúxulo", disse ao PÚBLICO.

"A Igreja Católica tem medo de mudar porque não sabe quanto dinheiro conseguiria. E assim já sabe com o que pode contar ao fim do ano", além de que "teria que se esforçar mais por mobilizar os seus fiéis", realça o deputado, lembrando os montantes muito baixos das consignações anunciadas.

Em Outubro, o presidente da confederação das IPSS calculava que o fim da devolução do IVA "colocava em causa obras em curso no valor de pelo menos 200 milhões de euros". O que significaria, no final do ano passado, quando a taxa ainda era de 21 por cento, um bolo de IVA de 42 milhões de euros. De acordo com o padre Lino Maia, muitas obras das IPSS "só conseguem ser feitas ao abrigo dos programas PARES e POPH por causa da vantagem da devolução do IVA. As IPSS têm ao seu encargo 50 a 60 por cento do valor das obras que, passando para 70 ou 80, se tornam absolutamente incomportáveis".

No âmbito da negociação do OE com o PSD, o Governo recuou e definiu que as confissões religiosas devem passar a optar entre o benefício da devolução do IVA ou o valor da consignação fiscal que os contribuintes lhes podem atribuir na sua declaração anual de IRS.

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