CMVM usa estatuto público para escapar a cortes de dez por cento

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CMVM emitiu um comunicado, depois de questionada pelo PÚBLICO DANIEL ROCHA

Apesar de estar obrigada a aplicar a tabela da função pública, os salários mais elevados só vão ter corte de 6,6 por cento, à excepção dos órgãos de gestão

A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) é uma entidade de regulação e, por isso, de acordo com a Lei do Orçamento do Estado (OE), deveria aplicar cortes salariais iguais aos da função pública, que variam entre 3,5 e dez por cento. No entanto, vai efectuar reduções inferiores, por ser considerada, nos seus estatutos, equiparável a uma entidade pública empresarial. Um documento a que o PÚBLICO teve acesso revela que os cortes em alguns dos vencimentos mais elevados não vão além de 6,6 por cento.

O OE obriga as entidades de regulação e supervisão a seguir a tabela da função pública nas reduções salariais. Foi o que fizeram, por exemplo, a Autoridade da Concorrência (AdC) e a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE). No entanto, a CMVM vai seguir outro modelo. Tendo em conta que, nos seus estatutos, é equiparada a uma entidade pública empresarial, vai optar por fazer uma adaptação dos cortes à sua estrutura, tal como foi permitido para as empresas públicas, como a CGD e a TAP.

Ontem, depois de questionada pelo PÚBLICO, a CMVM respondeu e, posteriormente, emitiu um comunicado às redacções, explicando que vai "proceder à redução média de cinco por cento da despesa em remunerações" - o tecto imposto às empresas públicas que decidissem não seguir a tabela da função pública. Além disso, vai "reduzir em dez por cento as remunerações" do conselho directivo e da comissão de fiscalização e não irá distribuir prémios de desempenho.

Apesar desta redução de dez por cento nos salários do conselho consultivo e da comissão de fiscalização, o PÚBLICO sabe que nem todos os vencimentos mais elevados vão sofrer cortes desse nível, como exigia o OE. Num comunicado interno da CMVM, assinado pelo director de recursos humanos, Francisco Melro, são detalhados os escalões com reduções de vencimento. E, nos salários acima de 4165 euros brutos, é aplicada uma taxa fixa de 6,6 por cento. Nas remunerações entre 1500 e 2000 euros, o corte é de três por cento.

Confrontada com esta tabela e com o facto de a lei ser clara no que diz respeito aos cortes nos reguladores, a CMVM referiu que o documento a que o PÚBLICO teve acesso era "parcial" e que tinha sido "enviado sem autorização do conselho consultivo, que o mandou retirar". A mesma fonte fez questão de salientar que o comunicado de Francisco Melro foi emitido às 17h26 de 24 de Janeiro, enquanto a decisão do conselho directivo só foi tomada às 19h20 do mesmo dia.

Mais tarde, explicou que iria seguir as indicações dadas às empresas públicas, justificando o facto de ser equiparada a estas entidades. E avançou ainda que os cortes vão "resultar uma redução global dos encargos com remunerações de 7,2 por cento". Mas ficou por explicar se, ao contrário de reguladores como a AdC e a ERSE, não vai aplicar reduções de dez por cento nos salários acima de 4165 euros brutos, como manda o OE.

Recorde-se que, em Conselho Geral de Supervisores, composto pela CMVM, Banco de Portugal e Instituto de Seguros de Portugal, decidiu-se seguir as orientações do Governo em matéria de contenção orçamental.

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