Abdullah II da Jordânia: O rei que esperou três décadas para ser príncipe herdeiro

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Tudo terá começado durante as filmagens de Lawrence da Arábia. A inglesa Antoinette Gardiner era assistente da equipa do realizador David Lean quando Hussein bin Talal chegou a um dos locais de rodagem. Queria averiguar se os soldados que havia dispensado para servirem de figurantes estavam a ser “tratados com respeito”. Esta é a versão do jornalista e historiador Adel Darwish. Outra, do general James Lunt, é a de que o pai e a mãe do actual rei da Jordânia se conheceram numa festa em Amã, em 1961.

Vamos acreditar em Lunt, que foi o biógrafo oficial do defunto monarca jordano (Hussein of Jordan), quando ele narra que Tony Gardiner, filha de um tenente-coronel da Força Aérea britânica, ainda não tinha completado 19 anos quando, seguindo o protocolo que impedia o rei de dar o primeiro passo, o convidou para a pista de dança. Ele aceitou e, a partir daí, raramente aceitava outra companheira, até porque a jovem partilhava o seu gosto pela equitação, esqui aquático e karting. Tornaram-se inseparáveis.

Embora as relações anglo-jordanas tivessem melhorado imenso em 1961, a perspectiva de um rei hashemita casar com uma britânica não era bem vista pela mãe de Hussein, a rainha Zein. Em Londres, o Foreign Office também receava complicações, mas Hussein (divorciado da sua prima Dina) e Toni estavam determinados e uniram-se numa cerimónia discreta.

Antoinette recebeu o nome árabe de Muna (Desejo) al-Hussein, naturalizou-se jordana e converteu-se ao islão. Não quis ser rainha e preferiu ser princesa. Em Fevereiro de 1962, deu à luz Abdullah (nome do avô, assassinado em 1951). Foi uma surpresa para muitos quando Hussein se divorciou de Muna, mas a separação, depois de mais três filhos (Faisal e as gémeas Zein e Aisha), foi tão discreta quanto o casamento. Ela manteve os privilégios e ainda hoje vive em Amã, tratada como Sua Alteza Real.

Abdullah, o primogénito, tinha um ano quando Hussein o nomeou sucessor, mas a animosidade da rainha Zein em relação à inglesa e o temor de uma longa regência se os muitos inimigos do rei o assassinassem, fizeram com que Hassan, o irmão mais novo do monarca, se tornasse príncipe herdeiro. Foi preciso esperar até aos 37 anos para que Abddullah recuperasse o seu estatuto. Hassan caiu em desgraça (devido a intrigas palacianas) depois de mais de três décadas à sombra do trono, e foi afastado em 26 de Janeiro de 1999.

Um herói militar

Baixinho como o pai, pele clara e olhos azuis como a mãe, mais fluente em inglês do que em árabe, Abdullah II foi coroado a 7 de Fevereiro mas, dez anos depois, permanece uma figura misteriosa para muitos jordanos. Num passeio por Amã, a capital, onde as fotografias de pai e filho estão quase sempre lado a lado, um residente dizia-nos no Verão passado: “Ainda estamos a aprender a amá-lo, mas ele nunca ocupará o lugar que era de Hussein.”

A biógrafa Heather Lehr Wagner (King Abdullah II) observou que o novo rei foi rápido a chamar a atenção para si e para a sua mulher, Rania al-Yasin, palestiniana (como metade da população), filha de um banqueiro. Casaram-se em 1993 e têm quatro filhos. “Desta forma, ele assegurou que nem Hassan nem a viúva do pai, a rainha Noor, continuariam a servir como porta-vozes ‘oficiais’ [da monarquia].”

Foi ainda mais longe ao retirar, em 2004, o título de príncipe herdeiro ao meio-irmão Hamza, filho varão de Noor, justificando que o queria “libertar de responsabilidades”. Uma decisão incompreensível para muitos jordanos: que Hamza seria o príncipe herdeiro foi o último desejo de Hussein e o primeiro decreto de Abdullah.

Abdullah II, ora viajando sozinho e incógnito, para ouvir as queixas dos súbditos, ora aparecendo em família, nas capas das mais famosas revistas do mundo, nasceu na capital jordana a 30 de Janeiro de 1962. Formou-se em St Edmund’s School, na Sandhurst Academy e na Universidade de Oxford, na Grã-Bretanha; na Escola de Cavalaria de Fort Knox e na Universidade de Georgetown, nos Estados Unidos.

Antes de ascender ao trono, o experiente pára-quedista e mergulhador, amante de motos e corridas de automóveis, coleccionador de armas antigas, “fanático” pela série O Caminho das Estrelas (Star Trek) onde teve uma fugaz aparição (ver http://www.youtube.com/watch?v=YTjJiz9tV-Q), podia dar-se ao luxo de jantar tranquilamente no Hard Rock Cafe de Amã. Agora, tem de ser mais cuidadoso com a segurança pessoal, embora como comandante das Forças Especiais já tivesse feito inimigos. Foi ele o chefe de uma unidade de luta antiterrorista que desmantelou um gang recrutado por Saddam Hussein para assassinar opositores iraquianos na Jordânia. Encarregaram-no também de “acalmar” os tumultos populares, no Sul, quando subiram os preços do pão, em 1996. Foi promovido a general por um pai orgulhoso que, no leito da morte, haveria de lhe oferecer a coroa.

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