Na Nablus resignada, já ninguém fala de violência

a Uma das elevações rochosas no pé das quais está Nablus chama-se "a montanha de fogo". É um antigo vulcão e os seus habitantes gostam de dizer que deu à cidade a chama da cólera, a sua lava rebelde, a sua recusa à submissão. Mais que qualquer cidade palestiniana, foi o coração da Intifada e pagou o preço mais pesado.O Exército israelita, que mantém um bloqueio à cidade há oito anos, temeu que o ataque a Gaza desencadeasse uma revolta. É verdade que Nablus, capital económica da Cisjordânia, se manifesta, geralmente à sexta-feira, mas estes desfiles, ao contrário dos de Ramallah, reúnem multidões pouco numerosas e calmas.
Por vezes, o Hamas envia as suas mulheres para gritarem slogans hostis a Mahmoud Abbas, o presidente da Autoridade Palestiniana, mas a população não costuma aderir. Se Khaled Meshaal, o chefe político do Hamas no exílio, apelou a uma "terceira Intifada", não parece ter sido ouvido na cidade, que é dirigida por uma equipa municipal na órbita deste movimento.
"Porque lançaríamos nós uma terceira Intifada, se a segunda nem sequer acabou", ironiza Nasser Juma'a, um jovem deputado da Fatah. Desde há muito um dos líderes da revolta palestiniana, Juma'a passou nove anos na prisão. Mas hoje não quer ouvir falar de violência. As Brigadas dos Mártires de Al-Aqsa, braço armado da Fatah, que dirigiu, estão hoje dissolvidas ou reduzidas a grupos dispersos.
A secreta da Fatah
"É verdade, as acções para apoiar Gaza não correspondem à dimensão da cidade", reconhece. "Mas a população está esgotada. Está enfraquecida pelo bloqueio do Exército israelita. E as pessoas pensam que as manifestações não servem para nada."
Juma'a explica ainda que os serviços secretos da Autoridade Palestiniana são omnipresentes, controlam a rua, "interrogam as pessoas antes mesmo de elas se manifestarem".
Na casa do xeque Ahmed Beitani, um cartaz representa a bandeira palestiniana pendurada numa Kalashnikov, sob os rostos de todos os líderes do Hamas mortos por Israel. Imã na mesquita Al-Aqsa de Jerusalém, este velho religioso foi afastado da cidade pelos israelitas devido às suas ligações ao movimento islamista, e um dos seus filhos está ainda na prisão. Beitani acredita que a terceira Intifada está em hibernação. "Ela vai acontecer aqui e em todo o mundo árabe. Se os serviços secretos palestinianos permitissem manifestações, seríamos centenas de milhares nas ruas", diz.
Assim, Nablus mostra sobretudo resignação. Vemo-la à saída da cidade, nas grandes filas de espera - uma para as mulheres, outra para os homens, uma terceira para quem tem mais de 50 anos - em frente ao checkpoint israelita. Cada pessoa é controlada, os sacos revistados. A passagem pode demorar horas, conforme a boa vontade dos soldados, sem que haja protestos.
Ninguém fala, ninguém sequer sussurra. Mesmo no campo de refugiados de Balata, que esteve na frente da revolta, a Intifada já não é a referência. "Temos toda a família em Gaza. Passamos o tempo todo em frente à televisão para saber que bairro foi bombardeado. Deito-
-me todas as noites com o comando na mão, e tenho o comando na mão todos os dias quando me levanto. Todos os dias compro um novo cartão telefónico para saber se os meus familiares ainda estão vivos. Eles fizeram a mesma coisa, quando nós fomos bombardeados pelos israelitas", diz Mahmoud Subuh, um dos responsáveis do campo.
Surpresa, é o Hamas quem ele mais culpa: "Eles não têm nada que tramar a vida das pessoas, da minha tia que não tem casa e chora todos os dias ao telefone, do meu tio que teve um ataque cardíaco e não pode ir ao hospital. Sabemos do que os israelitas são capazes: se lhes atiramos uma pedra, eles respondem com castigo colectivo. Sabemos que se nos revoltamos, eles bombardeiam-nos assim. O Hamas sabe o que faz", diz.
Hoje, assegura, Nablus tenta recuperar de uma longa guerra de gangs meio mafiosos, meio políticos, consequência do apodrecimento da Intifada. "Ainda há dois anos, era o caos. Felizmente, a Autoridade Palestiniana restabeleceu a segurança. Agora, a máfia acabou. Nablus está calma. As pessoas querem descanso."
"Em Balata", acrescenta Yahyah Jamaal, um outro responsável próximo da Fatah, toda a gente está esgotada: "demasiados mártires, prisões, destruição. Numa população de 24 mil pessoas, mais de 150 foram mortas durante a Intifada. Não há uma criança que não tenha ficado traumatizada, a fazer chichi na cama, com problemas de comportamento. A partir de agora, queremos dar-lhes outra coisa que não violência. Isso não nos leva a lado nenhum."
Exclusivo PÚBLICO/Libération

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