Porto No coração da cidade velha

a Estamos em pleno bairro da Sé, nesse labirinto de ruelas e escadas que desce até à Ribeira. Este é o Largo que hoje se chama da Pena Ventosa, onde vem desembocar a rua homónima. O bocadinho de rua que aparece no lado esquerdo, a uma cota mais alta, é a Travessa da Pena Ventosa, que vai ter ao Largo do Colégio (dos Grilos). Já não existe é o muro alto que se vê no canto inferior esquerdo, junto a uns degraus. Mas, tirando este detalhe, o largo só não está exactamente igual porque foram entretanto restauradas as três casas que se vêem em frente (da do meio, a imagem só mostra uma nesga). Em compensação, a casa que faz ângulo recto com estas, à direita, junto à qual se vê uma mulher a varrer, de costas para a objectiva, está ainda mais degradada do que já estava quando a foto foi tirada. Sendo que não é fácil precisar a que data corresponde esse "quando". Pelo vestuário da dezena de pessoas que aqui se vê, a imagem podia, em rigor, ter sido captada ontem. Só as casas hoje restauradas, decerto por intervenção do CRUARB, permitem concluir que é anterior a 1974. Mas, dado que o fotógrafo morreu em 1973, a informação é um bocadinho redundante. Pode ser dos anos 60, ou até do início da década seguinte, mas também pode ser bastante anterior. Junto à mulher que varre, vemos um senhor que parece encaminhar-se para a porta da casa em frente. O mais provável, todavia, é que tencione contornar a tal casa degradada para enfiar, à direita, na Travessa de Santana. É que existe ali uma rua, ainda que a perspectiva da foto seja enganadora e seja preciso olhar para os telhados para se perceber que as duas casas não formam um canto fechado. Esta travessa vai ter à rua homónima, que faz a ligação entre o Largo do Colégio e a Rua da Bainharia, e que alguns autores admitem ser a mais antiga rua do Porto. Nela existiu o célebre Arco de Sant"ana, popularizado por Almeida Garrett. Mas Rua de Sant"Ana é apenas a sua designação moderna. Enfim, moderna é força de expressão. Parece que já tinha este nome no século XVI, e tinha-o seguramente no século XVIII. No entanto, há documentos quatrocentistas que comprovam que se chamou Rua das Aldas.
Mas não existe ainda hoje, um pouco acima, uma Rua das Aldas?, perguntará o leitor. Pois há, mas chamava-se Rua da Penaventosa. Mas essa não é tal a rua que vem desembocar neste largo? Pois é, mas chamava-se, então, Rua (ou Viela) dos Palhais. O que é que motivou esta trapalhada toponímica? Parece que ninguém faz a menor ideia. De resto, o próprio topónimo Largo da Penaventosa ("pena" é aqui uma corruptela de penha) tem uma história esquisita. Num roteiro do Porto de 1896, manuscrito e inédito, aparece apenas uma Praça da Pena Ventosa, mas que corresponde ao largo do Paço Episcopal. No entanto, guias da cidade publicados nos anos 30, 40 e 50 já incluem o Largo da Penaventosa, e no mesmo sítio em que hoje existe. O estranho não é isto, mas sim o facto de este largo se ter aparentemente tornado anónimo durante as décadas de 60 e 70. Pelo menos não consta dos roteiros desse período que pudemos consultar. L.M.Q.

Manuel Pinheiro da Rocha (1893-1973), Casario típico do Porto, Porto, s/d, Negativo em película a preto e branco, DGARQ/CPF, PDR07. Imagem cedida pelo Centro Português de Fotografia e pela Direcção-Geral de Arquivos.

Sugerir correcção