A iblussom dos Trabalhadores do Comércio, 26 anos depois

A banda que levou o sotaque do Porto ao rock português está de volta aos palcos e prepara novo álbum de originais

Iblussom é apenas o título de uma canção nova dos Trabalhadores do Comércio inspirada nos blues mas poderia também espelhar a atitude deste grupo que levou o sotaque do Porto ao rock português. 26 anos passados sobre a fundação de uma banda da qual praticamente já não se conheciam temas originais desde 1990, muita coisa mudou na vida das suas principais figuras: Sérgio Castro radicou-se em Vigo, onde criou um estúdio de gravação; e o "miúdo" vocalista João Luís é hoje um "graúdo" de 33 anos, com um percurso profissional em Londres, onde se especializou na elaboração de redes informáticas para bancos. Porém, nenhum dos elementos da banda quebrou por completo os laços com a música. João Luís, por exemplo, chegou mesmo, nos últimos anos, a tocar em grupos de jazz. "Todos nós evoluímos", referiu Sérgio Castro ao PÚBLICO, "e andámos aqui e acolá a tocar. Isso deu-nos bagagem musical".
O convite que Júlio Isidro lhes dirigiu para participarem no espectáculo comemorativo dos 25 anos do programa radiofónico Febre de Sábado de Manhã foi um estímulo para voltarem aos palcos. Agora na forma de quinteto (além do baterista Álvaro Azevedo, elemento da primeira hora, o elenco completa-se com o baixista Miguel Cerqueira e o teclista Jorge Filipe Santos), os Trabalhadores assinalaram o seu regresso à estrada com um concerto em Julho passado no bar portuense Bela Cruz, ao que se seguiu uma prestação mais informal no espaço Contagiarte. A boa afluência de público destes dois eventos não teve correspondência no concerto de anteontem à noite, que decorreu no Casino de Afife perante uma sala quase vazia.
No entanto, esse panorama desolador não inibiu os músicos, que se empenharam em tocar durante mais de uma hora alguns temas novos, entremeados com versões retocadas dos antigos, como Chamem a polícia ou Tá quetinho. Sérgio Castro manifestou ao PÚBLICO a sua decepção por esta incursão mal sucedida da banda fora dos grandes centros, mas não deixou de atribuir o inêxito a uma divulgação deficiente e também ao facto de muitas pessoas estarem naquele dia a acabar as suas férias.

Novo álbum até ao final do anoO álbum que aí vem não tem ainda título (embora Iblussom seja mesmo uma forte hipótese) e o seu lançamento deverá acontecer até ao final do ano. Sérgio Castro pretende manter a veia satírica e não deixar de reagir aos estímulos da actualidade. Portugal ainda não acabou de arder mas o grupo já tem uma canção sobre o "escândalo" dos fogos florestais, chamada Ardem-me os olhos. Ainda por cima, Sérgio Castro, como vive na Galiza, pôde presenciar de perto os incêndios que assolaram recentemente aquela região espanhola. "Eu tive de fechar as janelas porque a cinza entrava-me pela casa. Aquela região verde que eu adoro estava completamente castanha", conta.
E há determinados temas que não mudam, por mais que o tempo passe. Na opinião de Sérgio Castro, os "políticos" dão sempre "pano para mangas" e são o "bombo da festa", assim como o "sentimento fadista e quase depressivo" do povo português. Vale a pena apreciar Febras de sábado à noite (um dos temas que, juntamente com Cordábida, constituem o single promocional), que, além da paródia ao título do programa de Isidro, é uma ofensiva contra os costumes. "É uma forma de dizermos, com uma enorme ambiguidade, que ainda hoje nas discotecas as mulheres se deixam tratar como gado ao entrarem de graça nas ladies" nights", comenta o músico.

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