Torne-se perito

Judith Miller deixa o New York Times

A repórter Judith Miller, uma das personagens no escândalo judicial e político provocado pela divulgação da identidade de uma agente secreta da CIA a partir da Casa Branca, vai abandonar o The New York Times, onde trabalhou nos últimos 28 anos. Miller, que cumpriu 85 dias de prisão por se recusar a revelar a identidade da fonte com quem trocou informações sobre a agente secreta Valerie Plame, considerou não ter condições para continuar devido à falta de confiança mútua que se criou entre si e o seu jornal.A decisão de se afastar do New York Times não terá sido fácil, confessou ontem, numa carta aos editores publicada no jornal. Esta forma de divulgação foi, aparentemente, negociada juntamente com os termos de rescisão de contrato, cujos pormenores não foram revelados. "Sinto-me orgulhosa de ter feito parte deste extraordinário jornal, e também orgulhosa dos meus próprios feitos - um Pulitzer, um DuPont, um Emmy e outros prémios", desabafou. "Mas nos últimos meses, fui eu que me tornei a notícia, e isso é algo que um repórter do New York Times não pode ser", considerou.
Judith Miller abandona o jornal onde ganhou a glória e o descrédito, acossada pela pergunta mais terrível com que se pode confrontar um jornalista: será que o que escreve é verdade? O escândalo Plame foi especialmente ingrato para Miller, que à medida que foi esclarecendo a sua actuação, comportamento, ligações e negociações com as mais poderosas fontes políticas de Washington, foi merecendo o ataque da sua classe e a crítica dos leitores.
Depois de sair da prisão, a jornalista publicou um relato extenso do episódio, cuja publicação foi acompanhada por uma inusitada e surpreendente confissão por parte dos editores e directores executivos de Miller, que reconheciam não ter controlo sobre o seu trabalho, e, pior, não terem confiança na sua imparcialidade.
"A verdade é que muito antes de ter sido presa, eu já era o alvo dos ataques de todos aqueles que estavam furiosos com as falhas da informação que conduziram à guerra no Iraque", admitiu ontem Judith Miller na sua carta de despedida. Mas foi na sequência do escândalo Plame que a ira do New York Times se voltou (publicamente) contra ela - o director executivo Bill Keller chamou-lhe mentirosa e insinuou que ela manteria relações amorosas com algumas fontes. Mais tarde, um editorial descreveu-a como "Mulher de Destruição Maciça". Judith Miller não era especialmente considerada pelos colegas, que acreditavam que muito do seu trabalho era feito ao serviço das suas fontes e da sua própria agenda política (muitos chamam a Miller uma neoconservadora; ela descreve-se como uma centrista), e não em função do interesse jornalístico ou nacional dos temas que tratava.
A jornalista, que não revelou os planos para o futuro, antecipou a vontade de se manter activa na profissão e prometeu aos leitores esclarecer os seus motivos, assim como refutar as críticas que lhe são dirigidas, em textos a publicar no seu website pessoal, JudithMiller.org. Rita Siza, Washington

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