Aimé Barroyer, o "chef" que vive feliz em Lisboa

Aimé Barroyer, 45 anos, o prestigiado chefe de cozinha do hotel de luxo Pestana Palace, instalado no Palácio Valle-Flôr, na Ajuda, vive feliz, rendido a Lisboa, a Portugal, ao sol, à luz da cidade branca, aos cheiros. "Vim para aqui por amor. Casei com uma portuguesa. Não vim para trabalhar numa situação de curto prazo e ir embora. Vim para viver e sou muito feliz aqui".O chefe de cozinha viajou por todo o mundo em representação do famoso Bocuse, uma das personalidades mais marcantes da gastronomia francesa. Foi responsável pelos cursos da Escola de Gastronomia Francesa Ritz Escofier e pela cozinha do célebre Hotel Ritz, em Paris. Viveu e trabalhou durante dez anos nos Estados Unidos, em Los Angeles e Nova Iorque.
Agora, depois de cerca de dois anos na Quinta do Lago, Aimé abraçou com paixão, há cerca de cinco anos, o projecto do Hotel Pestana Palace. O que tem Portugal e Lisboa em especial que o tenha prendido assim? "Os portugueses são espectaculares. Se você for a Madrid ou a Milão vai sentir na pele o facto de ser estrangeiro, aqui não. Há sempre um apoio, uma vontade de ir ao encontro do estrangeiro".
Aimé Barroyer, que já viveu em Paris, L.A. e Nova Iorque e visitou o mundo, adora Lisboa: "Gosto muito da cidade. É cheia de luz, de cheiros, sensual. Há poucas cidades no mundo que podemos comparar às mulheres e Lisboa é uma delas". Quando pretende descansar do apertado horário de trabalho no Palácio Valle-Flôr, Aimé passeia a pé pelas ruas. "Muitas vezes nas minhas folgas dou um passeio em Lisboa. É um encanto. É quase como um dia de férias, andar de eléctrico, visitar um museu, uma igreja".
O chefe de cozinha é um homem de um optimismo contagiante: " Os portugueses têm de deixar de se sentir tristes e coitadinhos e exportar o que têm. Quando eu digo que Lisboa é a cidade mais bonita do mundo e que os portugueses são os mais acolhedores da Europa, eu acredito nisso".
A preocupação pela educação das duas filhas, de 18 e 10 anos, pesou na vinda para Lisboa. "Quero que elas vivam num mundo saudável e aqui estamos longe da agressividade, da tensão das grandes metrópoles. Elas vivem felizes aqui e não se sentem estrangeiras. Eu próprio, nunca me senti estrangeiro. A língua? A língua é um obstáculo em Paris, aqui não é".
Na Quinta do Lago, Aimé Barroyer sentia "saudades de Portugal": "A minha vontade era viver em Portugal e aquilo não servia para mim. Faltava-me a vivência cultural portuguesa". Quando nasceu o projecto do hotel de luxo no Palácio Valle-Flôr, Aimé não olhou para trás: "É um privilégio na nossa vida profissional de inaugurar um espaço como este. Que país da Europa tem o potencial de abrir quase no centro de Lisboa um espaço com esta beleza?"
Ao invés de pretender afirmar num hotel de luxo de Lisboa a cozinha francesa ou a cozinha internacional, Aimé Barroyer preferiu abraçar com paixão a reinterpretação da cozinha portuguesa. "O que eu tento aqui é trabalhar a culinária portuguesa, a essência, a emoção, a riqueza dos produtos e da comida portuguesa. Nos Santos Populares, assámos sardinha aqui no palácio. A sardinha é nobre. Podemos fazer com ela mil e uma coisas. O azeite português, por exemplo, é espectacular..."
Mudar e inovar a cozinha portuguesa numa casa com a responsabilidade e o prestígio de um hotel de luxo é uma tarefa de coragem. "É uma responsabilidade muito forte. Eu posso mudar, ser ousado, mas não engano os portugueses. Não podemos enganar o cliente. Tentamos iniciar algo, um prato, sem tentar enganar. O cliente tem a sua sensibilidade, que vem do fundo dela. A comida é um passeio pleno de emoção, de recordações. Procuramos que as pessoas se identifiquem com ela e que se sintam felizes".
O francês trabalha na cozinha do palácio com uma equipa jovem. "É um privilégio poder trabalhar com paixão, num espaço como este e com esta equipa, esta força por detrás, esse dinamismo, essa força total. É uma gente fantástica. Eles são o futuro da cozinha em Portugal e a cozinha no país é um trabalho de futuro porque esteve tudo parado durante 48 anos. Agora, essa juventude vai acompanhar o crescimento da gastronomia nacional".
Aimé confessa que lhe custa ver os portugueses dizer que "lá fora é melhor": "Os portugueses não se apercebem das qualidades do país que têm. Não é bom ver e viver as coisas pela negativa. Se virmos tudo pelo lado positivo, vamos ter um dia feliz. Temos que lutar para que cada dia seja um dia feliz. Quando criticamos o país, o sistema, esquecemos que o país somos nós".

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