Há mulheres à espreita nos "checkpoints"

Um carro pára e dele saem cinco mulheres na casa dos cinquenta anos. Trazem mochilas onde guardam pequenos cadernos e telemóveis. Pequenos cadernos onde vão apontar o comportamento dos soldados no "checkpoint" que se preparam para visitar, telemóveis para ligarem aos oficiais superiores caso algum soldado pareça desrespeitar direitos fundamentais dos palestinianos com quem lida. As mulheres dirigem-se ao pequeno muro em Abu Dis, onde está uma unidade de polícia de fronteira, três militares encavalitados no pequeno espaço que resta do muro para deixar os palestinianos passar. Um grupo de jovens soldados ri alto e atira copos de plástico, por onde beberam café, para o meio de arame farpado que se encaracola no chão. Uma mulher tenta repreender os soldados, apanhando os copos. O comandante adverte-a: "Ninguém fala com os meus guerreiros.""Nunca tinha ouvido um superior tratar assim os seus soldados", diz Rita Mendesfleur, uma das cinco mulheres da equipa do movimento chamado Checkpoint Watchers, formado há cerca de dois anos e meio, e que conta agora com cerca de 200 membros que se distribuem por turnos nos postos de controlo militar mais movimentados, perto de Jerusalém e Telavive. Os soldados acabaram entretanto os cafés e não se ficam muito tempo por aqui. As mulheres também não. Seguem para o outro ponto em Abu Dis onde e possível passar pelo muro, atrás dos militares. A ideia, explica Rita Mendesfleur, é eles saberem que estão a ser observados. O próprio exército forneceu às Chekpoint Watchers uma lista com os telemóveis dos superiores. "Não estão interessados em comportamentos incorrectos, provocados por raiva, medo ou pelo calor do momento." Como são mulheres é mais fácil não serem vistas como uma ameaça pelos soldados, explica.Rita Mendesfleur aponta os casos que considera piores. "As emergências médicas que são deixadas à espera. Mulheres a dar à luz nos "checkpoints", recém-nascidos a morrer." A justificação para que isto aconteça: "Dizem que há vezes em que aproveitam as ambulâncias para fazer entrar bombistas em Israel."A ideia da associação, sublinha Rita, não é tornar a ocupação mais suportável para os palestinianos, apesar de, por vezes, poder ajudar. No dia em que o PÚBLICO acompanhou um turno das Checkpoint Watchers, um jovem árabe israelita com um táxi era impedido de passar pois tinha perdido o documento de identificação e, apesar de ter ido à polícia, não lhe deram logo um novo, acusando-o de ter vendido o antigo. Depois de dois telefonemas das mulheres, acabou por passar, levando no bolso o cartão com um número de telefone de uma organização que dá apoio jurídico. As mulheres dão a tarefa por terminada por ali. Ainda há que visitar um outro "checkpoint", este já na Cisjordânia, conhecido como "o Contentor", a uma curta distância de Abu Dis. Saindo do táxi colectivo palestiniano (o carro israelita tinha ficado do outro lado do muro), vê-se um homem de cabelos brancos, ao lado de um carro parado no "checkpoint". É um médico de Jericó que seguia para Ramallah, que não podia atravessar pois o seu veículo não tinha autorização. Ele podia ir, o carro não. O fato cinzento do homem de cabelo grisalho tornava-se cada vez mais cor de areia do pó que rodava no ar, enquanto tentava convencer os soldados. Os telemóveis das mulheres começaram a trabalhar. Duas, três chamadas, e nada. O homem teve de voltar, terá de apanhar um táxi se quiser passar. "Às vezes é frustrante não poder fazer nada", diz Yudith Oppenheimer, a mais antiga da organização do turno.Para Yudith, é importante mostrar aos israelitas o que se passa nos "checkpoints", porque a maior parte, diz, não faz ideia. Mas o maior feito que conseguem as "Checkpoint Watchers" é o reconhecimento, por parte dos palestinianos, de que há "outros" israelitas. "Há outros para além dos que votaram em Sharon, há outros para além dos que concordam com a ocupação. Há pessoas que se preocupam o suficiente para sair de casa, tirar umas horas ao trabalho. Todas as mulheres aqui têm empregos", sublinha.

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