A pequena grande Hungria

O húngaro é uma língua única no centro da Europa: nem latina, nem anglo-saxónica, nem eslava - da família do finlandês. E é falada por uma pequena minoria: 10 milhões de habitantes (mais cinco milhões na diáspora). Se um Prémio Nobel da Literatura dá sempre um grande impulso às traduções, no caso das línguas minoritárias mais ainda. Foi o que aconteceu com o húngaro Imre Kertész em Portugal.Kertész já estava traduzido para inglês, francês, sueco ou alemão antes do Nobel de 2002, mas em Portugal só veio a ser publicado depois. Com tradução de Ernesto Rodrigues, a Presença editou "Sem Destino", "A Recusa" e prepara-se para publicar mais duas obras. O embaixador da Hungria em Lisboa, János Balla - que fala um fluente português -, considera Kertész o mais importante autor húngaro vivo. Destaca ainda os ficcionistas Géza Csáth, Péter Esterházy, Sándor Márai e o poeta Attila József, todos eles (um pouco) traduzidos em Portugal.Sándor Márai (1900-1989) é um caso interessante de recepção entre nós. Há dez anos, Miguel Serras Pereira traduziu para a Teorema "A Conversa de Bolzano", que passou um tanto discretamente pelas livrarias. Em 2001, Mária Magdolna Demeter traduziu para a Dom Quixote "As Velas Ardem Até ao Fim" e o romance - belíssimo - foi um sucesso: três edições sucessivas. Ainda está em destaque em algumas lojas.A mesma visibilidade não teve Péter Esterházy, nascido em 1950, descendente da grande família de príncipes patronos das artes, e um dos mais criativos reinventores da língua, com larga obra traduzida em vários países. Dele saiu em Portugal, há dez anos, na Caminho, o romance "Os Verbos Auxiliares do Coração", traduzido por Maria Jorge Vilar de Figueiredo. Não é fácil localizar um exemplar, agora. E o mesmo se aplica à antologia de poemas de Attila József, "Não Sou Eu Que Grito", com selecção e tradução de Egito Gonçalves, editado em 1986 pela Limiar. A mesma editora publicou em 1991 uma antologia de três poetas húngaros (Lajos Kassák, János Pilinszky, Sándor Kányádi), com tradução de Egipto Gonçalves e Zoltán Rózsa.Muito recente (2002) é a "Antologia da Poesia Húngara", com selecção e tradução de Ernesto Rodrigues, publicada na Âncora.Concluindo um panorama não exaustivo, do ficcionista Géza Csáth (1887-1919), a Cavalo de Ferro - que está a construir um notável catálogo de autores europeus nunca ou escassamente traduzidos - editou recentemente "O Matricídio e Outras Histórias".Quanto aos portugueses traduzidos na Hungria, o embaixador János Balla nomeia Pessoa, Eça, Camilo, Camões, Lobo Antunes, Saramago... e várias antologias (em 2000, "Poetas Portugueses Contemporâneos", que inclui 35 autores pós-Pessoa, em 2002, "Poesia Portuguesa Experimental").Património MundialO coração de Budapeste, seguramente uma das mais belas (e vivas) cidades da Europa, é Património Mundial classificado pela UNESCO desde 1987, dos dois lados do Danúbio - o rio que divide a cidade em Buda (a zona mais antiga) e Peste. Na colina de Buda, a margem e o bairro do Castelo, gótico. Do lado de Peste, a margem, incluindo o impressionante parlamento.A Hungria - cuja história remonta ao século V, quando tribos húngaras vindas dos Urais atravessaram o Volga e o Mar Cáspio, até se instalarem, no século IX, nos Cárpatos - tem mais cinco locais inscritos na lista da UNESCO: a Cidade Velha de Hollókó (séculos XVII e XVIII); a Abadia Beneditina de Pannonhalma, com origem no século X; o Parque Nacional de Hortobágy, o Puszta, que preserva paisagens pastorícias com indícios de há mais de dois mil anos; a Necrópole cristã de Pécs (século IV); e a região vinhateira de Tokaj.Com a literatura e o património, a música será uma das áreas mais expressivas da cultura húngara. Além de Liszt (ver figuras em destaque), nomes fundamentais da música do século XX como Bela Bartók (1881-1945), Gyorgy Ligeti (n.1923) ou Gyorgy Kurtág (n. 1926) são húngaros (os últimos dois, nascidos na Roménia). Pianista e compositor, Bartók fez notáveis pesquisas sobre as origens da música húngara.O Ministério da Cultura húngaro (orçamento de 558 milhões de euros, 1,06 por cento do Orçamento de Estado) tem na sua dependência mais de 40 instituições, incluindo vários teatros e orquestras, para além dos museus e das bibliotecas. Depois da inauguração do novo Teatro Nacional (ver textos em cima), foi aprovado o novo Museu de Arte Contemporâena, que ficará num edifício adjacente. "Tal como o anterior governo de direita, a actual coligação socialista liberal privilegia tanto a renovação do património histórico como o apoio estatal à cultura moderna", diz o embaixador em Lisboa. O "incentivo à informatização da cultura" e a aposta na educação artística são outras apostas em curso, refere. No cinema, István Szábo, autor de "Mephisto" - Óscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1982 - e Marta Mészáros - realizadora de, por exemplo, "Diário Íntimo", 1982 - são os criadores mais internacionais. Na fotografia, todo o destaque será pouco para André Kertész. Nascido em Budapeste em 1894, em Budapeste, foi para Paris em 1925 e para Nova Iorque onze anos depois. A sua vida e obra atravessa todo o século XX (morreu em 1985). É considerado um dos grandes mestres da fotografia.

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