Sampaio empenhou-se na aprovação do perdão de penas

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O comprometimento de Jorge Sampaio com o processo legislativo foi revelado na altura Bruno Rascão (Arquivo)/PÚBLICO

O Presidente da República desvalorizou o seu próprio papel na aprovação parlamentar, em 1999, de um perdão de penas que abrange crimes de pedofilia, mas o facto, recordado pelos participantes do processo, é que se empenhou directamente na aprovação desse diploma, a qual teve lugar, por unanimidade, em 23 de Abril desse ano, precisamente para assinalar os 25 anos da "revolução dos cravos".

O comprometimento de Jorge Sampaio com esse processo legislativo foi revelado na altura, nomeadamente por Mota Amaral, então "apenas" deputado do PSD. Num artigo publicado no "Diário de Notícias" em 1 de Maio desse ano, Mota Amaral falou no "empenho" do Presidente da República na elaboração de uma lei de amnistia, bem como o "impulso pessoal" do então Presidente da Assembleia da República, Almeida Santos.

O artigo de Mota Amaral não é o único dado que confirma que o envolvimento de Jorge Sampaio foi muito mais além da simples promulgação. Ontem, em conversa com o PÚBLICO, António Costa - então ministro dos Assuntos Parlamentares, hoje líder da bancada socialista - confirmou que de facto "isso foi um assunto tratado entre o Presidente e os deputados". Acrescentou que o seu próprio envolvimento enquanto governante na elaboração da lei foi inexistente.

Tendo havido uma amnistia - polémica devido às FP-25 de Abril - pelos 20 anos do 25 de Abril, esperava-se que houvesse uma medida semelhante para os 25 anos. Contudo, o Governo não queria para não ser acusado de laxismo. E os grupos parlamentares também não estavam para aí virados. Mas, num encontro com os líderes parlamentares de então, Jorge Sampaio falou no assunto, manifestando, assim, a sua vontade de que o Parlamento fizesse uma lei.

Sampaio também queria que fosse aprovada por unanimidade, o que levou a negociações entre os partidos que terminaram com a aprovação do perdão genérico e amnistia de pequenas infracções que permite que os crimes de abuso sexual tenham beneficiado de reduções de penas. E que poderá fazer com que aconteça o mesmo aos arguidos do caso Casa Pia que venham a ser condenados por crimes cometidos até 1999.

Ontem, o advogado de Carlos Silvino, Dória Vilar, disse que o seu cliente não será abrangido por tal lei. Também não se aplicaria ao deputado socialista Paulo Pedroso, já os testemunhos existentes no processo se referem a finais de 1999 e a 2000.

Vera Jardim, então ministro da Justiça, ainda avisou os deputados para o facto de os abusos sexuais sobre menores poderem vir a ter um perdão de pena e lembrou que na Bélgica o assunto da pedofilia estava na ordem do dia. Mas a lei foi aprovada, abrindo excepções para crimes relacionados com a toxicodependência e com o alcoolismo. Neste caso, para evitar que acidentes rodoviários provocados por condutores embriagadas pudessem vir a beneficiar de amnistia. Este era um assunto que então estava entre as preocupações dos políticos.

Alberto Martins, o socialista que, então, presidia à comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, repetiu ontem uma explicação que tem vindo a ser avançada, tanto por PS como por PSD, para o facto de não terem excluído os crimes de abuso sexual: não fazia parte das preocupações sociais da altura.

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