"Vamos assumir Viseu como uma cidade a sério"

"Vamos assumir Viseu como uma metrópole, uma cidade a sério. Depois de um fosso de 40 anos, as pessoas estão empenhadas neste desafio lançado à cidade e sentem que pertencem a este projecto". As palavras de Paulo Ribeiro, director do Teatro Viriato, sede do Centro Regional das Artes do Espectáculo da Beira (CRAEB) e espaço de acolhimento da Companhia Paulo Ribeiro, manifestam de certa forma um rumo que, desde há poucos anos, está a ser trilhado pelos habitantes da cidade beirã. O fenómeno de actividades culturais regulares tem vindo a influir positivamente no ritmo de uma cidade que, a passos cautelosos, começa a constar nos roteiros artísticos nacionais. As mutações não apenas se pressentem, como também se evidenciam nas opiniões dos viseenses, nas acções que se desenrolam a olhos vistos, e, mais recentemente, no desejo de o Instituto Politécnico abrir uma escola de artes. Regido por uma autarquia social-democrata há mais de uma dúzia de anos, o concelho tem mais de 90 mil habitantes, segundo registos do Censos 2001, e uma população maioritariamente jovem. Embora os equipamentos culturais da cidade prossigam um inventário de acções periódicas, muitas delas realizadas com alunos das escolas locais, falta ainda organizar um plano de estruturas que vá ao encontro das exigências de um público cada vez mais fiel às práticas culturais. "Não podemos pensar em amanhã, sem criar as bases de hoje", nota Paulo Ribeiro, acrescentando que é indispensável uma metodologia pedagógica que acompanhe os eventos artísticos. "É preciso que exista uma aprendizagem, porque aqui no interior ainda se sente muita ignorância". Apesar desta afirmação, o coreógrafo já não se sente tão pessimista como há um ano atrás, até porque, diz, "a pouco e pouco tudo está mudar". Prova desta transformação é a percentagem de ocupação - mais de 70 por cento - do Teatro Viriato até ao final do ano transacto.Entre as cidades mais importantes da província, Viseu assume-se hoje como um paradigma daquilo a que Ricardo Pais chama um "esforço descentralizador" (ver inquérito). A fórmula consiste numa profícua rede de articulações entre as mais variadas instituições. Da câmara municipal ao Cine-Clube local, está traçado um mapa de parcerias que têm vindo a desenvolver um sem número de iniciativas e outras tantas propostas inéditas na cidade. É uma verdadeira teia de acordos que envolvem toda uma constelação cultural, pressentida mesmo no quotidiano viseense. "Nunca tantos turistas procuraram a cidade como agora", diz Paula Santos, empregada de uma florista situada defronte do Teatro Viriato. "A estreia da peça ["Hamlet"] vai valorizar muito Viseu, mas desde há alguns anos que vêem muitas pessoas de fora visitar o museu [Grão Vasco] e o centro histórico", aponta. Para além de um roteiro de galerias, encontram-se entre os equipamentos mais importantes o Teatro Viriato, o Museu Grão Vasco - actualmente em obras de restauração, num projecto assinado por Souto Moura -, a Casa-Museu Almeida Moreira, o Teatro Mirita Casimiro, o Cine-Clube de Viseu, um dos mais antigos e dinâmicos do país, e os cinemas Paraíso, Ícaro e S. Mateus. Todas estas instituições, a par da autarquia, firmam protocolos de cooperação. Mas não se julgue que os acordos concentram-se unicamente neste eixo. Promove-se uma política de continuidade de acordos com vários estabelecimentos de ensino, organizam-se intercâmbios culturais e há uma tendência para organizar acções em colaboração com parceiros do resto do país. Neste âmbito, uma das propostas mais interessantes partiu da edilidade, que quer transformar a Quinta da Cruz - uma grande parcela de terreno que possui raros exemplares arbóreos e uma casa do séc. XVIII - numa extensão da Fundação de Serralves. A ideia, segundo José Moreira, vereador da Cultura, já se encontra em negociação, estando prevista as conversões da casa num centro de arte contemporânea e do terreno num itinerário ambiental e numa quinta pedagógica. O "pontapé de saída" acontece já este ano, adianta o vereador, com a inauguração de uma exposição que inclui obras do acervo de Serralves. Para a Quinta da Cruz estão ainda idealizados eventos promovidos em conjunto com o Teatro Regional da Serra de Montemuro, o Viriato, a ACERT ou o Museu Grão Vasco, entre outros.Transferida para a Casa-Museu Almeida Moreira, a direcção do Museu Grão Vasco, presidida por Dalila Rodrigues, não cessou as suas actividades devido às obras de restauro do espaço museológico. No sentido de "reforçar a área da formação cultural numa região que tem tido uma abertura muito boa", todos os domingos a equipa do Grão Vasco orienta visitas guiadas ao centro histórico e à exposição patente na igreja da Misericórdia, onde estão reunidas pinturas de retábulo do artista viseense. De destacar que a única mostra portuguesa representada em Salamanca, Capital Europeia da Cultura 2002, é organizada pelo Museu e intitula-se "Grão Vasco - Pintura Portuguesa do Renascimento" (de 12 de Julho a 15 de Setembro). Uma produção que Dalila Rodrigues traduz como uma projecção internacional da cidade, tendo também convidado o Cine-Clube de Viseu para a realização de um vídeo sobre a exposição. Agora, sublinha, "estou a tentar que Paulo Ribeiro encerre a mostra com a apresentação do seu último espectáculo 'Tristes Europeus'".

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