Por que fogem os jornalistas do Zimbabwe?

Se a vida de um jornalista independente e/ou estrangeiro já era difícil no Zimbabwe de Robert Mugabe, agora passou a ser quase impraticável. A aprovação da nova lei de imprensa, na passada sexta-feira, representa mais um passo numa longa sucessão de atentados contra a liberdade de imprensa e de expressão por parte do partido no poder, a ZANU-PF de Robert Mugabe, que já levou muitos jornalistas estrangeiros e zimbabweanos a fugir do país. Joseph Winter, jornalista da BBC, abandonou o Zimbabwe há um ano, depois de ter trabalhado durante muito tempo no país (desde então, a BBC está proibida de trabalhar no Zimbabwe). Porque o fez? "Porque as linhas de orientação da BBC dizem que nenhuma história é suficientemente valiosa para colocar em risco a vida de um jornalista", recorda Winter num texto recente na BBC On-line. No dia em que Winter fugiu com a mulher e o filho, Mercedes Sayagues, uma uruguaia de 47 anos que escrevia para o jornal sul-africano "Mail and Guardian" decidiu ficar. Apesar de ter recebido um prazo de 24 horas para sair do país porque a sua "licença de trabalho" tinha caducado, e depois de uma década a trabalhar no Zimbabwe, pareceu-lhe mais do que justo tentar combater esta decisão nos tribunais e passou à clandestinidade, levando a filha. Passada uma semana também ela fugiu do país.Basildon Peta, o correspondente do "Independent" em Harare, num artigo publicado neste jornal britânico em Agosto de 2001, deixou bons exemplos das razões que levam tantos jornalistas a abandonar o país de Mugabe. Num domingo de manhã, Peta comprou o "Zimbabwe Standard" para ler a notícia sobre a existência de uma "lista de alvos dos 'media'". Descobriu, aterrorizado, que o seu nome era o primeiro da lista de jornalistas que deveriam ser "fisicamente molestados" antes das eleições presidenciais de 2002. Em casa, com a mulher, Basildon Peta recordou os sacos com balas que tinham sido deixados à porta de sua casa, as muitas cartas obscenas que recebera ameaçando-o de morte antes das eleições, os telefonemas anónimos renovando as ameaças, e os sete jornalistas presos na semana anterior, acusados de "difamação criminosa". Na sexta-feira seguinte, depois de passar vários dias a evitar a polícia, levou a sua família para "um local onde se pudesse acalmar".Gerry Jackson trabalhava para a rádio pública do Zimbabwe em 1997, no canal de música pop, quando uma manhã houve uma manifestação em Harare contra o aumento dos preços que foi violentamente reprimida pela polícia. A estação foi inundada por telefonemas e Jackson decidiu abrir as linhas telefónicas para deixar as pessoas falar. Muitas condenaram a violência da polícia e a jornalista foi despedida no próprio dia.Depois de uma longa batalha nos tribunais, Jackson conseguiu ganhar, em 2000, autorização para abrir uma estação de rádio independente. Rapidamente arranjou um transmissor e começou a emitir a partir de um quarto de hotel. Seis dias depois, a polícia foi ao local fechar "a rádio" - um dia depois de Mugabe ter utilizado os seus poderes presidenciais para tornar ilegal a posse de transmissores. Hoje, Gerry Jackson vive em Londres, de onde transmite todos os dias para o Zimbabwe, onde é para muitos "a única fonte de informação não controlada pelo Estado".Mais recentemente, já em Janeiro, o regime de Robert Mugabe lançou uma verdadeira "caça ao homem" contra quatro jornalistas estrangeiros - do "Daily Telegraph", "Guardian", "Economist" e o sul-africano "Sunday Times" - acusando-os de terem entrado ilegalmente no país e de terem "apoios dos serviços secretos de um Estado hostil". O jornal "Zimbabwe Herald", diário oficial do regime, disse que os jornalistas estavam instalados em hotéis ou "casas seguras" propriedade do partido da oposição, o Movimento para a Mudança Democrática. Para trás ficaram acusações de "terrorismo" contra vários jornalistas e pelo menos 12 tristes histórias, no espaço dos últimos seis meses, de jornalistas espancados por apoiantes da ZANU-PF, de Mugabe.Na sexta-feira, Jonathan Moyo, o ministro da Informação que criou a nova lei de imprensa, nem sequer tentou disfarçar as verdadeiras razões que estão por trás deste crescente clima de repressão à liberdade de informação. "Thomas Jefferson [antigo Presidente dos EUA] disse que era melhor ter jornais sem Governo. Ele estava muito, muito errado. E muito melhor ter Governo sem jornais".- Os jornalistas zimbabweanos são acreditados por uma "comissão dos 'media' e da informação" que lhes impõe um código de conduta que, a ser violado, pode significar prisão para o jornalista "desviante";- Imposição de limites ao exercício da profissão pelos jornalistas estrangeiros que receberão autorizações temporárias de permanência;- Para trabalhar em permanência como jornalista no Zimbabwe é necessário ser "cidadão zimbabweano" ou "residente permanente".

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