Portugal e as rotas dos carros roubados

Ascende a cerca de um milhão de contos o valor das burlas que, ao longo de mais de um ano, um grupo organizado, fez com empresas de financiamento. A maior parte desse dinheiro destinou-se à aquisição de automóveis que, por sua vez, acabaram por ser vendidos para África.O processo, recentemente concluído pela 12ª secção da Polícia Judiciária de Lisboa, tem mais de 20 arguidos, grande parte dos quais se encontram presos preventivamente. Em traços largos, o grupo falsificava documentos, tais como bilhetes de identidade e declarações de IRS, com os quais obtinha posteriormente o crédito para aquisição de automóveis em diversos stands. Esses veículos viajam depois até aos portos de Antuérpia, na Bélgica, e Amesterdão, na Holanda, onde eram embarcados com destino a países africanos.Os dois portos acima referidos são, segundo uma responsável da Judiciária, os principais locais de escoamento das viaturas furtadas em Portugal. Segue-se Algeciras, no Sul de Espanha que, ao contrário de anos anteriores, tem vindo a perder algum fulgor.O negócio dos carros roubados tem três vertentes distintas em Portugal. Num primeiro caso há os que são furtados no estrangeiro e negociados com cidadãos nacionais. No segundo, que constitui entre 80 a 90 por cento do total dos crimes anualmente participados, tratam-se de viaturas roubadadas no país e que nunca chegam a sair. São os chamados furtos de uso. Por fim, existem ainda os veículos que sendo roubados em Portugal, acabam por ser vendidos para o exterior.Segundo Paula Sacramento, coordenadora da secção da PJ responsável pelo furto, tráfico e viciação de automóveis, o negócio dos carros roubados "é de milhões de contos". É um negócio que não conhece fronteiras e que se estende por toda a Europa e África.No que se refere aos carros roubados no estrangeiro e que são vendidos em Portugal, os principais fornecedores são os italianos. Os carros são detectados, por vezes, nas alfândegas, onde chegam acompanhados de documentação falsa. São, normalmente, viaturas de topo de gama e cujos preços podem ultrapassam com frequência a dezena de milhar de contos. A PJ tem vindo, nos últimos anos, a recuperar algumas dezenas destas viaturas, acontecendo que os compradores, provando que agiram de boa fé, não são constituídos arguidos nos respectivos processos mas, por outro lado, acabam por perder todo o investimento, uma vez que se procede à devolução dos veículos aos legítimos proprietários. Paula Sacramento, a título pessoal, não concorda com este procedimento, lesivo para os inocentes, e lembra que em Espanha, por exemplo, desde que o registo da posse do carro seja feito anteriormente à divulgação do pedido de apreensão.O grosso dos processos instaurados em Portugal por furto de viaturas reportam-se a veículos das gamas média e baixa. São veículos utilitários que, normalmente, são utilizados para passeios e para a prática de alguns furtos e roubos. A totalidade destes veículos, segundo o parecer dos investigadores policiais, acabam por ser recuperados.Mas, nem todos os desaparecimentos internos são meros furtos de uso. Existem igualmente redes organizadas que desmantelam os veículos, que os alteram, seja nas cores, seja nas numerações dos chassis e motor e que, na posse de documentação falsa ou de salvados (os documentos de um carro que, por exemplo, tenha sido acidentado e recambiado para a sucata) acabam por os revender.Por fim, há também um número significativo de viaturas que são furtadas em Portugal e vendidas no estrangeiro. O destino mais habitual, ainda de acordo com os investigadores da Judiciária, é África. Trata-se, sobretudo, de veículos todo-o-terreno que, nos países de expressão portuguesa são muitas vezes utilizados como transportes colectivos. Há alguns anos esses mesmos carros eram embarcados em portos portugueses e em Algeciras. Actualmente, a rota preferida é a estrada até Antuérpia ou Amesterdão. Acontece, também, que muitos deles, sobretudo os ligeiros de passageiros de maior valor, acabam por ser enviados para os países do Leste, com especial predominância para a Rússia.

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