Torne-se perito

Amadurecer ovócitos

Pela Universidade do Porto já passou o desenvolvimento de uma técnica que permite fazer crescer em laboratório espermatozóides imaturos, tornando possível a paternidade a homens cuja infertilidade não tinha tratamento. Agora, a equipa procura fazer o mesmo com ovócitos e as taxas de sucesso são muito promissoras.

Os tratamentos de infertilidade implicam sempre a estimulação hormonal da mulher, para induzir a ovulação. Mas, mais ou menos um em cada seis ovócitos produzidos não são geneticamente maduros e, logo, não podem nunca resultar num embrião. Uma equipa que integra investigadores da Universidade do Porto desenvolveu uma nova técnica para amadurecer ovócitos imaturos em laboratório, que é apresentada no Congresso da Sociedade Europeia de Reprodução Humana e Embriologia, que decorre em Tours (França), até amanhã.O sucesso da equipa de Alberto Barros, do Departamento de Genética Médica da Universidade do Porto e do Centro de Genética da Reprodução, que trabalhou com investigadores do Instituto Bernabeu de Fertilidade e Ginecologia, de Alicante (Espanha), foi muito significativo: 90 por cento dos ovócitos mais imaturos amadureceram no prazo de 24 horas e o mesmo aconteceu, em apenas 12 horas, a 98 por cento dos ovócitos que estavam numa fase de maturidade mais avançada.O processo de amadurecimento do ovócito implica que esta célula perca metade dos 46 cromossomas humanos, de maneira a que, se a fertilização pelo espermatozóide acontecer, metade do património genético do embrião seja do pai e outra metade da mãe, fornecendo cada um 23 cromossomas. "Os ovócitos imaturos não tiveram tempo para expulsar num globulozinho os restantes 23 cromossomas. O que nós conseguimos, 'in vitro', foi fazer com que o ovócito os libertasse", explicou ao PÚBLICO Mário de Sousa, do Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar, no Porto, um dos elementos desta equipa e também percursor de uma técnica equivalente, de amadurecimento de espermatozóides imaturos, que deu os primeiros resultados em Agosto de 1998. O trabalho foi publicado em Maio na revista "Human Reproduction", editada pela Sociedade Europeia de Reprodução Humana e Embriologia."Como estimulamos pouco a ovulação - aliás, a nova Lei da Procriação Medicamente Assistida diz mesmo que não podemos inserir mais do cinco ovócitos no útero -, é importante poder aproveitar todos os ovócitos", disse Mário de Sousa. O que os investigadores fizeram foi colocar os ovócitos imaturos num pratinho de laboratório forrado com uma camada de outras células, chamadas Vero - células de cultura que são uma importante fonte de factores de crescimento. "São as mesmas células que se usam para produzir vacinas; são isoladas do rim e tratadas em cultura de forma a tornarem-se inócuas, isto é, a não poderem transmitir qualquer doença", adiantou Mário de Sousa.Já tinham sido feitas outras tentativas do mesmo género, nomeadamente na Bélgica, em 1995, conta o investigador, mas as taxas de sucesso foram mais modestas - ficaram-se pela casa dos 60 por cento e o prazo de maturação alcançou as 38 horas. E o tempo é vital neste processo - os ovócitos assim obtidos podem apenas ser utilizados na técnica de reprodução assistida por microinjecção intracitoplasmática, que implica a colocação de um único espermatozóide num único ovócito, e a microinjecção deve ser feita, idealmente, entre 16 a 24 horas depois da colheita das células.Mas, embora os resultados sejam bons, o trabalho não está terminado. "Ainda não conseguimos isolar as substâncias que terão sido responsáveis pela maturação dos ovócitos. É essa uma das coisas em que estamos a trabalhar. Penso que devem estar envolvidos vários factores de crescimento, que até agora não identificámos. Mas, estive a ver com atenção o trabalho da equipa belga e penso que a grande diferença reside num novo soro sintético que utilizámos", disse Mário de Sousa.Para passar à fase clínica também ainda é preciso verificar se os ovócitos que amadureceram fora do corpo da mulher são geneticamente normais. Se tudo estiver bem, esta técnica poderá vir a ser até mais importante do que a do amadurecimento de espermatozóides imaturos (ainda sem cauda ou apenas com uma cauda muito pequenina). "As técnicas são algo equivalentes, mas a maturação de ovócitos parece ter muito mais sucesso. Para as células masculinas mais imaturas, ainda redondas, a taxa de sucesso é de dez por cento, enquanto para os espermatídeos alongados (já com forma oval e uma pequena cauda) é de 30 por cento", afirmou Mário de Sousa.Além disso, a frequência do surgimento de células imaturas é muito maior entre as mulheres do que nos homens: apenas em um por cento da população masculina este problema é responsável pela infertilidade, enquanto cerca de 15 por cento de todos os ovócitos conseguidos depois de estimulada a ovulação são imaturos.

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