Olha a velha caneta

Quando se avariou a minha caneta mais antiga - uma Pelikan Souveran M200 de 1985 - fui ao Corte Inglés, em Lisboa, comprar outra. A avaria não era pequena: estava partido o mecanismo do extractor de tinta e, para mais, a caneta sangrava tinta.

Não admira. Depois de 30 anos de trabalho diário, muitas vezes impelido a escrever depressa, para apanhar os pensamentos, a caneta tinha morrido com justa causa.

Comprei uma M200 nova, por 80 e tal euros, com a certeza de me durar até 2045. O empregado, entretanto, perguntou-me se não queria reparar a velha. Disse logo que sim, claro, se fosse possível. Para além do valor sentimental da caneta - quase tudo o que escrevi começou com ela - o aparo tinha-se habituado às minhas excentricidades canhotas.

O processo do Corte Inglés é simples: mandaram a caneta para uma oficina especializada em Espanha ou na Alemanha, apetrechada de peças legítimas da Pelikan, e depois telefonaram-me com um orçamento: trinta euros, incluindo todos os portes.

Disse logo que sim e, passado um mês, telefonaram-me a dizer que estava pronta. Levei uns meses a ir buscá-la e, quando finalmente lá fui, duvidei que a caneta pudesse ficar igual ao que era.

Tendo-me entretanto habituado à Pelikan substituta pensei que já não fosse possível lembrar-me da solidária fluidez da antiga. Mal cheguei a casa enchi-a e desatei a escrever. Passados uns minutos, esqueci-me que estava a experimentá-la. Estávamos a escrever outra vez.

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