Juíza de Leiria já não tem processos dos colégios

Magistrada já indeferiu uma providência cautelar, mas nos processos em que foi levantada suspeição pelos colégios o tribunal esclarece que não é ela a titular dos casos.

Foto
Colégios manifestaram-se neste domingo em Lisboa Daniel Rocha

O juiz que preside ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria considera inúteis as acções dos colégios a pedir o afastamento da juíza que decidiu contra os interesses destes estabelecimentos de ensino nos processos que os opunham ao Ministério da Educação, uma vez que a magistrada já não tem esses casos em mãos.

Representantes dos colégios Cidade Roda e João de Barros suscitaram um incidente de suspeição relativamente à juíza Eliana Pinto, alegando que tinha ligações ao PS, uma vez que fora assessora de um secretário de Estado, dirigente do PS de Coimbra e vereadora eleita pelos socialistas na Pampilhosa da Serra. O presidente do tribunal, Antero Pires Salvador, explicou, numa nota informativa enviada à Lusa, o percurso dos processos em causa. Em finais de Maio deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria o processo relativo ao Colégio Cidade Roda e em meados de Junho o do Colégio João de Barros. Foram ambos atribuídos à juíza Ana Luísa Borges, que ficou titular dos autos. No entanto, na semana passada, a juíza de turno, Eliana Pinto, "proferiu despachos em ambos os processos a dispensar a produção de prova testemunhal", explica o juiz presidente Antero Pires Salvador.

As requerentes dos dois colégios suscitaram o incidente de suspeição relativamente a esta juíza, mas uma semana depois os processos já estavam nas mãos de um outro magistrado de turno, que iniciou funções esta quinta-feira. A juíza em causa nunca foi titular desses processos, tendo estado apenas alguns dias com os processos, enquanto juíza de turno. "Não sendo a senhora juíza, Drª Eliana Pinto, titular desses processos, terminando o seu turno a 3/8/2016, nunca mais voltaria a proferir qualquer despacho nesses processos, assim se verificando a inutilidade objectiva e superveniente dos incidentes deduzidos pelos colégios", explica o presidente do tribunal.

Despedir é solução

Mas no  caso de um outro estabelecimento com contrato de associação, o Colégio Senhor dos Milagres, a juíza decidiu não aceitar a providência cautelar, numa sentença datada de 25 de Julho, por considerar que não foi dado como provado que aquele estabelecimento iria sofrer “prejuízos de difícil reparação” com a aplicação das novas normas de matrícula - que, de acordo com aquele estabelecimento, levaria à perda de 11 das 15 turmas financiadas pelo Estado.

Segundo a juíza Eliana Pinto, o colégio não demonstrou em que medida tal “poderá ocasionar uma situação de insolvência”, frisando também a este respeito que o estabelecimento poderá sempre realizar os “necessários reajustes, sobretudo em matéria de gestão de recursos humanos, adequando-os a menos turmas”. Apesar destas ressalvas, dá como possível “ a existência de um fundado receio de se constituir uma situação de facto consumado”, uma vez que a “perda de 11 turmas financiadas e de cerca de 263 alunos não poderá ser mais reparada, pois o tempo não volta para trás”.

Este receio de facto consumado concretizar-se-á caso o colégio consiga provar em tribunal que as novas normas de matrículas são ilegais, questão que constitui o objecto da acção principal. Ora, para a juíza Elaina Pinto, também este processo parece estar condenado, prognóstico que contribui para ter indeferido a providência cautelar.

A propósito, a magistrada de Leiria defendeu que um dos normativos do novo Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, e evocado nas acções dos colégios contra o Ministério da Educação, “é de duvidosa constitucionalidade por um lado, e claramente contraditório com a Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo”.

Em causa está o entendimento dos contratos de associação como “oferta pública de ensino”, conforme consignado no novo estatuto aprovado em 2013, e que segundo a juíza viola a lei de bases por não restringir a existência de colégios financiados pelo Estado às zonas com carência de escolas públicas. Acontece que a lei de bases do ensino particular e cooperativo, datada de 1979, também refere que estes contratos poderão existir mesmo em regiões onde haja oferta pública, o que não é referido na sentença de Leiria.

Guerra jurídica

Este é mais um episódio na guerra que opõe os estabelecimentos de ensino privado com contrato de associação ao Ministério da Educação, por causa do despacho assinado este ano pela secretária de Estado Adjunta e da Educação, Alexandra Leitão, para limitar os apoios financeiros apenas às zonas onde existe carência de oferta pública de escolas. Muitos colégios avançaram judicialmente para contestar o diploma legal, que veio introduzir limitações ao financiamento consoante a origem geográfica dos alunos matriculados nos estabelecimentos privados.

Na segunda-feira foram conhecidas mais duas sentenças, desta vez do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que vieram dar razão aos colégios do Centro de Desenvolvimento Educativo de Cantanhede e Centro de Estudos Educativos de Ançã, decretando a suspensão do despacho da secretária de Estado. Nesse mesmo dia, o Ministério da Educação anunciou que tinha suscitado um incidente de suspeição relativo ao juiz responsável pelas sentenças, por este ter anteriormente avançado com um processo contra o próprio ministério.

No dia seguinte foi a vez de os representantes das escolas particulares com contratos de associação anunciarem que também eles tinham suscitado um incidente de suspeição relativamente à juíza de Leiria, que decidira não decretar a providência cautelar na questão dos contratos de associação. 

Sugerir correcção
Comentar