Janelas abertas

"Nem está calor nem está frio" é dito como protesto mas é a melhor temperatura de todas.

Anteontem foi a primeira noite de janelas abertas deste ano. De manhã saudei com o coração a doer de contente o regresso dos andorinhões. Só que este Inverno choveu cá em casa e o bom senhorio substituíu telhas. Dizem que os andorinhões, que fazem os ninhos nas falhas das telhas, não perdoam reparações.

Os andorinhões não voltaram ao fim da tarde. Só tivemos as andorinhas, esplêndidas com a verdade delas, menos exigente talvez. Voam como quem ninguém desenha, com um traço muito mais livre do que o de Picasso.

Anteontem soprou um vento quente a ameaçar chuva quente ou trovoada. Choveu só um pouco mas o transtorno notou-se. O tempo está a mudar mas ainda não é um tempo que alguém queira.

A importância da temperatura é flagrante. Escrevo de janela aberta, só com uma T-shirt vestida. O mundo inteiro entra pelo escritório: os cheiros, os sons, a luz das estrelas e, sobretudo, o ar.

É bom estar à mesma temperatura do que o mundo lá fora. Quando vier o calor fugiremos para as sombras e para a água e para o frio eléctrico. Mas há, por estes dias de agora (e algumas noites) uma sintonia térmica que é a definição da Primavera.

"Nem está calor nem está frio" é dito como protesto (por não estar mais calor) mas é exactamente a melhor temperatura de todas.

É pena durar tão pouco. Ou nem sequer darmos por ela. Como se pode deixar de admirar a dificuldade que há em acertar a temperatura cá dentro (e cá dentro de nós) e a da temperatura lá de fora?

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