O Tribunal Constitucional é um órgão de soberania

Impõem-se algumas reflexões.

O Tribunal Constitucional (TC) prescinde de quem o louve ou defenda.            

Desde o Governo, passando por Mário Draghi, Durão Barroso, FMI, troika, Eurogrupo, todos se legitimaram para se intrometer na função jurisdicional do TC. Não faltaram as inefáveis agências de rating cujo poder e credibilidade não se sabe de onde vêm. Chegou-se à ignomínia de sugerir que “decide em causa própria”, com a inerente insídia. Anunciaram a catástrofe e o caos.

O Governo prossegue o seu caminho fora da lei. Pressiona, chantageia e pretende impor a lógica da tesoura ao próprio TC! 

Já nada espanta.

A Democracia e o Estado de Direito não se esgotam com governos eleitos, suas assembleias maioritárias, cortejadoras e obedientes.

A base legal do sistema político – A Constituição da República Portuguesa (CRP) – não pode ceder ante as “interpretações actualistas”, ordens e exigências dos credores do país. Os estrangeiros não ditam ao TC como e em que sentido a CRP deve ser interpretada. Adequada aos seus interesses especulativos. De colonos.

O país vive a condição dramática de devedor. Não de servo.

Em 25 de Abril de 1974, foi derrubado o regime totalitário vigente havia décadas. As liberdades foram banidas, as eleições uma farsa. Os tribunais sujeitos à “garantia administrativa”. Sem independência.

Teve-se a noção clara da relevância de um poder judicial independente e imparcial. Do absurdo e arbitrário de “tribunais especiais”. Proclamou-se como princípio essa independência, definidora de um Estado de Direito. A Europa há séculos a conhecia e praticava.

Na Constituição de 1933, a fiscalização da constitucionalidade das leis estava reservada a um órgão político, a Assembleia Nacional. É sabido que nada fiscalizava. A Assembleia não tinha independência, voz ou vontade próprias. Falava pela voz do chefe.

Com a CRP de 1976, após a vigência da Comissão Constitucional, instituiu-se o TC. A Justiça que faz é a de verificar a constitucionalidade das leis. Se estas estão de acordo com aquela. Seus princípios.

No Estado de Direito, o poder político distribui-se por vários órgãos. Presidente da República, Assembleia, Governo e Tribunais. Cada um destes esbarra sempre com os poderes e limites dos seus e os dos outros. A soberania não se vende, troca ou hipoteca. O Estado subordina-se à Constituição e esta não se “acomoda” aos desígnios de um ou outro poder. Prevalece. Tem princípios. Regras. Regras e princípios que estão em todas as Constituições da Europa, a começar por aquela que tanto apreciam. A alemã. Aqui, o TC é religiosamente respeitado. O Governo alemão não lhe passa sequer pela cabeça afirmar o cumprimento das decisões do seu TC. É matéria apodítica.

O TC é um órgão jurisdicional. Independentes, os juízes têm mandato de nove anos. Dos treze, dez são eleitos pela Assembleia da República.

Os princípios de justiça, liberdade, solidariedade, dignidade da pessoa humana, estado de direito, confiança no Estado e outros englobam os constantes da CRP. Os juízes aplicam-nos.

Têm feito lembrar que tais princípios existem. São para respeitar pelos órgãos legislativos.

As “forças de bloqueio”, hoje o TC, já não são novidade. O executivo convive mal com outros poderes. Tem vocação autoritária e centralizadora. As leis cumprem-se quando dão jeito. Se não, abalroam-se e revogam-se ao sabor da conjuntura.

Que querem os políticos?

Governar sem ou contra a Constituição?

Procurador-Geral Adjunto

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