Em política, o carteiro toca muitas vezes

Troca de cartas entre a coligação e o PS não passa de uma encenação política vazia de conteúdo.

Na última carta que o secretário-geral do PS escreveu ao líder da coligação, António Costa diz, a páginas tantas, que a missiva que recebeu de Passos Coelho no domingo tinha "como único propósito procurar inverter o ónus de pôr o ‘ponto final’ (…) no que designou de conversas entre o PS, o PSD e o CDS com vista a um entendimento que pudesse garantir a estabilidade e a governabilidade". Costa tem razão; como tem razão quem diz que as próprias cartas que são remetidas do Largo do Rato não terão nesta altura outro objectivo que não seja o de tentar passar para o outro lado da barricada o ónus de romper as negociações. Criou-se a ideia, nesta espécie de jogo de política epistolar, que o partido que ficar com uma carta em mãos por responder será aquele ao qual caberá a batata quente de ter virado as costas às negociações.

Nada mais falso. Já todos perceberam nesta altura que negociações genuínas entre PSD, CDS e PS tiveram uma vida curta, se é que alguma vez existiram. No primeiro encontro entre Passos Coelho e António Costa, ambos chegaram de mãos a abanar. Não serviu para nada. No segundo, a coligação levou aquilo a que chamou um “Documento Facilitador de Um Compromisso”, em que se propôs incorporar no programa da coligação algumas medidas que faziam parte do programa eleitoral do PS. Ao que os socialistas responderam com uma carta em que falavam de 17 ou 18 lacunas no tal “Documento Facilitador”, tais como o IVA na restauração ou a necessidade de reavaliar os escalões de IRS. Desde então nunca mais se falou de questões programáticas ou de conteúdo, e ambos os lados limitaram-se a trocar cartas vazias de conteúdo, num jogo de passa-culpas que não serve para absolutamente nada, a não ser para aumentar ainda mais a desconfiança mútua. Confiança que daqui a uns meses fará muita falta para garantir a tal "estabilidade e a governabilidade" que é referida na carta.

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