Rússia promete responder a novas sanções e denuncia apoio ao "partido da guerra" em Kiev

Presidentes da Ucrânia e da Rússia confirmam que o cessar-fogo acordado na sexta-feira está a ser cumprido "de uma forma geral".

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Combatentes separatistas controlam a entrada na cidade de Ilovaisk Maxim Shemetov/Reuters

A Rússia garante que vai responder às novas sanções que a União Europeia está a preparar e que poderão ser implementadas na segunda-feira, se o cessar-fogo acordado entre as autoridades ucranianas e os combatentes separatistas for entretanto violado.

Para além do fim dos combates, a União Europeia garante que irá mesmo aplicar novas sanções se a Rússia não retirar as suas tropas do Leste da Ucrânia – uma condição que dificilmente poderá ser satisfeita oficialmente já que Moscovo nega ter enviado combatentes para a região.

Em grande parte, as novas sanções consistem no reforço das medidas que já afectam os sectores da energia e das finanças da Rússia, como a limitação do financiamento dos bancos nos mercados europeus e a proibição da venda de material tecnológico para a extracção de petróleo. A principal novidade é a inclusão de 24 novos nomes à lista de pessoas cujos bens nos países da União Europeia serão congelados.

O reforço das sanções contra a Rússia foi anunciado no início da semana por Federica Mogherini, a nova responsável pela política externa da União Europeia. A antiga ministra dos Negócios Estrangeiros de Itália disse que as sanções iriam ser reveladas na sexta-feira, mas os líderes europeus adiaram esse anúncio para segunda-feira.

Para o Kremlin, a confirmação de que a União Europeia insiste na aplicação de novas sanções, mesmo depois do cessar-fogo acordado na sexta-feira, mostra que os líderes ocidentais estão interessados em manter a guerra no Leste da Ucrânia. O ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, aponta o dedo em particular os Estados Unidos, que acusa de estar a influenciar os países europeus.

"O reforço da retórica anti-russa a que temos assistido, precisamente quando está em curso um esforço activo na busca de uma solução política, mostra que o partido da guerra em Kiev tem apoio externo muito activo, neste caso por parte dos Estados Unidos", disse Lavrov, no final de uma reunião com o seu homólogo da Quirguízia, Erlan Abdildaev, ainda antes de o cessar-fogo ter sido anunciado.

Os dois ministros estiveram reunidos em Moscovo para discutir a entrada da Quirguízia na futura União Económica Euroasiática, que inclui a Rússia, a Bielorrúsia e o Cazaquistão. Os confrontos nas ruas de Kiev começaram em Novembro do ano passado depois de o então Presidente, Viktor Ianukovich, ter rejeitado a assinatura de um acordo de cooperação com a União Europeia para se aproximar da União Económica Euroasiática, que deverá entrar em vigor a 1 de Janeiro de 2015.

O ministro russo disse ainda que a União Europeia "deveria dar mais apoio à recuperação económica do Donbass [a região que inclui as províncias de Donetsk e Lugansk]" do que "procurar desesperadamente novas formas de prejudicar as economias dos seus próprios países e da Rússia".

Num comunicado publicado neste sábado, o Ministério dos Negócios Estrangeiros russo acusa a União Europeia de andar "perdida numa fantasia política".

"A União Europeia tem demonstrado que as suas autoridades continuam perdidas numa fantasia política, e está na prática a enviar um sinal directo de apoio ao 'Partido da Guerra' em Kiev, que não está satisfeito com o resultado da reunião de Minsk", cita a agência RIA Novosti.

"Na prática, o anúncio da expansão das sanções anti-russas é a primeira reacção da União Europeia ao encontro do Grupo de Contacto para a resolução da situação na Ucrânia, que teve lugar em Minsk no dia anterior, e ao acordo que foi alcançado, que permite pôr a vida de todos os ucranianos no caminho da paz", lê-se no comunicado.

"Calma ansiosa"
A trégua anunciada na sexta-feira parece estar a ser cumprida na generalidade, apesar de haver relatos de alguns combates.

A agência Reuters descreve a situação no terreno como uma "calma ansiosa" e o enviado da BBC a Donetsk, Richard Galpin, disse que a cidade não foi alvo dos bombardeamentos que eram rotina nos dias anteriores. Também nas proximidades de Mariupol, mais a Sul, a situação parecia ser mais ou menos estável, segundo o enviado da BBC, Fergal Keane.

O comandante da Guarda Nacional da Ucrânia, Stepan Potorak, disse à agência de notícias Interfax que "não houve violações [do cessar-fogo] até esta manhã", mas o líder da autoproclamada República Popular de Donetsk, Alexander Zakharshenko, salientou que a trégua "não está a ser observada na sua totalidade".

A relativa calma no terreno foi confirmada pelos presidentes da Rússia e da Ucrânia, numa conversa telefónica neste sábado. Apesar dos progressos, Petro Poroshenko e Vladimir Putin concordaram que é preciso avaliar de que forma o cessar-fogo está a ser acompanhado.

"Os dois líderes salientaram a necessidade do máximo envolvimento da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa no acompanhamento da situação, e de uma cooperação para o envio de ajuda humanitária internacional e por parte da Ucrânia" para as populações do Leste do país, sublinha um comunicado da Presidência ucraniana.

Não é certo se os relatos de confrontos esporádicos após o anúncio de cessar-fogo indica que a região poderá voltar a cair rapidamente na guerra, ou se é a prova de que as dezenas de batalhões de voluntários de um e de outro lado complicam a extensão de uma trégua a todas as zonas de uma forma ágil.

O acordo com vista a um cessar-fogo, anunciado na sexta-feira em Minsk, capital da Bielorrússia, teve como ponto essencial a suspensão dos combates, que já fizeram cerca de 2600 mortos e um milhão de deslocados desde o início de Abril.

O plano inclui ainda uma troca de prisioneiros entre o Exército ucraniano e os separatistas pró-russos, mas nada diz sobre o futuro estatuto político das províncias de Donetsk e Lugansk – se vão continuar sob o controlo dos separatistas, obter uma maior autonomia face a Kiev ou aproximar-se ainda mais de Moscovo.

Em Maio, os líderes dos separatistas promoveram um referendo sobre o estatuto político das províncias, à margem das organizações internacionais. O "sim" à independência e posterior pedido de integração na Federação Russa venceu com uma esmagadora maioria, mas, ao contrário do que aconteceu na Crimeira, Moscovo não respondeu a esse apelo.

A NATO, os Estados Unidos e vários países da União Europeia acusam a Rússia de ter enviado soldados para apoiarem os separatistas no Leste da Ucrânia, principalmente a partir da útima semana de Agosto. Por essa altura, as forças leais às autoridades de Kiev começaram a perder o terreno que tinham conquistado nas províncias de Donetsk e Lugansk, e os separatistas conseguiram ainda lançar uma nova ofensiva mais a Sul, contra a cidade portuária de Mariupol.

A Rússia negou sempre o envolvimento directo na guerra no Leste da Ucrânia, dizendo que qualquer cidadão russo presente nas fileiras dos separatistas está a combater de forma voluntária. Quando as forças da Ucrânia capturaram dez pára-quedistas russos em território ucraniano, em finais de Agosto, Moscovo disse que os soldados perderam a orientação e cruzaram a fronteira "sem intenção".

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