Obama critica abrandamento das reformas na Birmânia

Presidente diz que "processo de democratização é real" mas avisa que "o trabalho não está acabado" e pede que eleições de 2015 sejam "livres e inclusivas".

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Obama denunciou as “restrições” impostas a ex-presos políticos e “as detenções” de jornalistas. Kevin Lamarque/Reuters

Dois anos depois da visita que assinalou o fim do isolamento do país, o Presidente norte-americano, Barack Obama, regressou à Birmânia, mas desta vez para avisar que as reformas que o regime militar iniciou há quatro anos – e que levaram ao levantamento de parte das sanções internacionais que lhe tinham sido impostas – estão a marcar passo.

Obama, que participou como convidado na cimeira da ASEAN (Associação de Nações do Sudeste Asiático), foi diplomático e disse que “o processo de democratização na Birmânia é real”. Mas sublinhou que “o trabalho não está acabado” e que os Estados Unidos não se vão contentar com um processo que fique a meio caminho. “A transição democrática tem de ser concluída”, afirmou, no final de um encontro com deputados, entre eles a líder da oposição e Nobel da Paz Aung San Suu Kyi.

Ainda em Naypydaw – a cidade que a junta militar construiu para sua capital –, Obama encontrou-se com o Presidente Thein Sein, líder do primeiro governo civil da Birmânia em quase meio século, e nesta sexta-feira volta a encontrar-se com Suu Kyi, já em Rangum. Mas o tom da visita foi marcado logo à chegada, numa entrevista à imprensa local em que afirmou que “os progressos alcançados não estão a ser tão rápidos quanto muitos esperavam”. “Em alguns domínios há um abrandamento e mesmo um recuo das reformas”, avisou, dando como exemplo as “restrições” impostas a antigos presos políticos e “as detenções” de jornalistas.

Estas foram, precisamente, duas das áreas em que as reformas prometidas por Thein Sein, um ex-general que governa com o beneplácito dos seus camaradas, deram mais frutos: no final de 2013, um decreto presidencial amnistiou todos os opositores ainda na prisão e pôs fim aos processos por delito de opinião; antes disso, a censura sobre jornais e a Internet foi levantada. A Liga Nacional para a Democracia (LND), com Suu Kyi à cabeça, concorreu e venceu eleições intercalares de 2012 para o Parlamento, o regime pôs fim a várias restrições – reconhecendo o direito de manifestação, a existência de sindicatos – e iniciou uma liberalização da economia que hoje permite, por exemplo, aos birmaneses comprar telemóveis que antes estavam apenas ao alcance da elite militar, recorda a BBC.

Mas nenhuma destas reformas mexeu no essencial dos poderes do Exército, a quem a Constituição de 2008 garante um quarto dos lugares no Parlamento e o direito de veto sobre todas as alterações à lei fundamental. A mesma Constituição que impede quem tenha familiares com nacionalidade estrangeira de se candidatar à presidência – uma disposição feita a pensar em Suu Kyi, viúva de um britânico e cujos filhos tem passaporte do Reino Unido.

A LND é apontada como favorita à vitória nas eleições gerais do próximo ano, mas ainda em Junho uma comissão parlamentar recusou levantar as restrições que bloqueiam as aspirações presidenciais de Suu Kyi. A própria dirigente não escondeu o seu desânimo quando, a dias da chegada de Obama, disse que as reformas estão “paralisadas” e acusou Washington, que desde 2012 levantou o essencial das sanções impostas nas duas últimas décadas, de ser “excessivamente optimista” sobre a situação no país.

Após o encontro com o homólogo birmanês, Obama, o primeiro Presidente americano em funções a visitar a Birmânia, repetiu que as eleições de 2015 têm de ser “livres, inclusivas e transparentes”. Insistiu também no fim da discriminação dos rohingya, minoria muçulmana a quem a Birmânia não reconhece o direito à cidadania – apátridas que a ONU descreve como a minoria mais perseguida do planeta. Thein Sein respondeu que o seu governo está a trabalhar nas questões levantadas por Obama, mas a sua resolução “vai demorar tempo”.

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