O jogo das sanções contra a Rússia é lento e o prémio não é uma catástrofe económica

Vários analistas afirmam que a economia russa está “à beira do caos”, mas há quem seja mais prudente, até porque o objectivo das medidas decretadas pelos Estados Unidos e pela União Europeia não é esse.

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Um supermercado em Moscovo, há dias: há lacticínios que vêm agora da Bielorrússia e do Cazaquistão Maxim Zmeiev/Reuters

Quando se pergunta se as sanções decretadas pelos Estados Unidos e pela União Europeia à Rússia estão produzir efeitos e a forçar o Presidente Vladimir Putin a mudar a sua estratégia em relação ao conflito na Ucrânia, há duas respostas possíveis: sim, a economia russa está a ressentir-se, e não, a política de Moscovo não está a aproximar-se daquilo que é o desejo de Washington e Bruxelas.

A curto prazo, os danos causados por sanções económicas e a sua tradução em mudanças políticas é quase impossível de analisar. A variedade de opiniões está espelhada nos títulos de análises feitas por especialistas europeus e norte-americanos ao longo dos últimos meses, que variam entre a certeza absoluta de uma coisa e do seu contrário, e as dúvidas sobre uma e outra coisa.

No dia 29 de Abril, poucas semanas depois do início dos combates no Leste da Ucrânia – e já depois da aprovação de dois pacotes de sanções contra a Rússia por causa da anexação da Crimeia –, o The Washington Post tentava explicar "Por que as sanções contra a Rússia provavelmente não irão resultar".

No texto, o analista Pavel Molchanov, do fundo de investimento norte-americano Raymond James, incluía já na equação o cenário de um corte de relações total com a Rússia, após uma hipotética invasão da Ucrânia.

"Mesmo que a Rússia entrasse na Ucrânia, seria difícil imaginar um embargo total às exportações russas, porque o mundo precisa do petróleo." E dava como exemplo o Irão, que foi forçado a reduzir as suas exportações de petróleo de 2,5 milhões de barris por dia para entre 1 e 1,5 milhões – mas nunca a sua totalidade.

"O mundo pode perder um milhão de barris por dia do Irão, porque isso não é particularmente doloroso. Mas se perder nove milhões de barris por dia da Rússia, essa perda não pode ser compensada imediatamente. Se as exportações russas ficassem a zero amanhã, haveria uma crise global de petróleo", disse o analista.

Um dia antes, no site da revista norte-americana Forbes, o título era mais assertivo, mas em sentido contrário ao do The Washington Post: "Eis como as sanções de Obama à Rússia vão destruir Vladimir Putin."

A explicação estaria num lento – mas inevitável – crescimento da insatisfação entre os cidadãos russos: "A economia russa deverá entrar em recessão, e as aventuras de Putin apenas vão agravar os custos. Em breve, os bens importados vão escassear e os pagamentos das prestações sociais terão de ser cortados. Os russos vão começar a lembrar-se do que era na realidade a União Soviética."

A economia russa está, de facto, a ser penalizada pelas sanções aprovadas pelos Estados Unidos e pela União Europeia – e poderá também vir a sentir os efeitos do seu próprio embargo a produtos alimentares europeus e norte-americanos –, mas tudo dependerá da duração do actual conflito no Leste da Ucrânia e, acima de tudo, do tempo que as partes envolvidas continuarem de costas voltadas.

Já depois da chamada "fase 3" das sanções dos Estados Unidos e da União Europeia e do anúncio do embargo russo, o especialista em economia russa Mark Adomanis lembrava, também na revista Forbes, que a economia da Rússia continuava a crescer.

"Tendo em conta a recente trajectória da política externa russa, é fácil perceber por que razão tantas pessoas querem que a Rússia pague um preço. No entanto, há uma diferença significativa entre querer que a economia russa sofra, e que ela sofra de facto. Apesar de os resultados mais recentes não serem fantásticos, também não têm sido catastróficos", escreve Adomanis, referindo-se ao crescimento de 0,5% anunciado a 11 de Agosto.

O especialista norte-americano salienta que um crescimento de 0,5% numa economia como a russa é "francamente mau", mas de uma coisa diz ter certeza: não é "uma prestação económica tão catastrófica que possa vir a causar agitação na sociedade civil e a queda de Vladimir Putin e do seu Governo".

Mais uma vez, a questão do tempo torna-se essencial para analisar com clareza os efeitos das sanções. "Uma Rússia a crescer menos do que 2% ao ano irá de facto entrar em sérias dificuldades, mas esse processo será longo e incerto, e não rápido e previsível", considera Mark Adomanis.

Em resumo, escreve o especialista, "fazer de conta que a economia da Rússia está 'à beira do colapso' não ajuda ninguém, porque ela não está à beira do colapso. Qualquer política formulada com base na expectativa de uma implosão económica russa a curto prazo irá falhar porque a economia russa está a crescer e irá provavelmente continuar a crescer".

A questão é que o objectivo dos Estados Unidos e da União Europeia é precisamente que as sanções não tenham consequências imediatas graves, ao contrário do que aconteceu com o Irão, por exemplo.

"A ideia não é matar a economia", considera Lubomir Mitov, economista-chefe na Europa do Instituto de Finanças Internacionais – a ideia é "acumular pressão sobre as autoridades na Rússia e sobre os homens de negócios próximos de Putin para que eles percebam os custos do que estão a fazer".

No seu relatório, intitulado "Rússia: as sanções começam a morder", o economista afirma que as sanções aplicadas pelos Estados Unidos e pela União Europeia a empresas russas (como a proibição de financiamento a médio e longo prazo no mercado financeiro norte-americano de gigantes da energia como a Rosneft e a Novatek) podem ser geridas com sucesso a curto prazo, mas o alvo primordial é globalidade da economia russa, que sofrerá efeitos "muito mais abrangentes e duradouros" no futuro.

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