Israel acusado de espiar os EUA nas negociações com o Irão

Investigação do Wall Street Journal diz que primeiro-ministro israelita partilhou informação confidencial com membros do Congresso norte-americano para invalidar acordo com o Irão.

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As relações diplomáticas entre EUA e Israel têm vindo a deteriorar-se nos últimos meses Jason Reed/Reuters

O Governo israelita de Benjamin Netanyahu terá recolhido informações confidenciais das negociações sobre o programa nuclear do Irão a partir de responsáveis norte-americanos, europeus e iranianos. O executivo israelita terá também transmitido parte desta informação a membros do Congresso dos EUA, como parte de uma táctica para minar um possível acordo que permitisse a Teerão continuar com o seu programa nuclear.

Estas informações surgem de uma investigação levada a cabo pelo Wall Street Journal e publicada na noite de segunda-feira (já madrugada em Portugal continental). O diário norte-americano afirma ter contactado mais de uma dezena de diplomatas, deputados e agentes dos serviços secretos dos EUA e Israel.

Responsáveis israelitas ouvidos pelo Wall Street Journal negaram a existência de qualquer programa de espionagem a países aliados e afirmaram ainda que qualquer informação que tenha sido recolhida acerca das negociações nucleares com o Irão partiu de fontes de fora da Casa Branca, nomeadamente de responsáveis iranianos sob vigilância e através de países europeus que participam nas reuniões. Para além dos EUA e Irão, também participam nas negociações a Rússia, China, França, Alemanha e Reino Unido.

Mas quem espiou quem? A relação de espionagem mútua entre os EUA e Israel é conhecida e, como avança o Wall Street Journal, foi precisamente através das suas próprias actividades de espionagem a Israel que os EUA descobriram que o executivo de Netanyahu andava a recolher detalhes confidenciais das reuniões em Genebra. Apesar de o executivo israelita negar ter espiado directamente responsáveis norte-americanos, o Wall Street Journal avança que Netanyahu tinha ao seu dispor relatórios confidenciais da Casa Branca.

Em todo o caso, as acções de espionagem israelita – antecipadas por Washington – não parecem ter causado nenhum mal-estar entre os dois países. O que despertou a fúria da Casa Branca terá sido o facto de o Governo de Netanyahu ter partilhado informações confidenciais com membros do Congresso norte-americano de maneira a interferir com um possível acordo com o Irão, como explicou ao jornal um alto-responsável dos EUA.

“Uma coisa é os EUA e Israel espiarem-se mutuamente, outra coisa é Israel roubar segredos dos EUA e depois entregá-los a legisladores norte-americanos para minarem a diplomacia dos EUA”, afirmou um responsável americano não identificado.  

A relação diplomática entre os EUA e Israel tem-se deteriorado ao longo dos últimos meses e a principal razão prende-se precisamente com avanços nas negociações no sentido de se restringir os avanços do programa nuclear iraniano. Barack Obama afirmou várias vezes que as propostas em cima da mesa impedem o Irão de construir uma bomba nuclear, mas este compromisso é contestado pelo primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, apoiado nos EUA pelo Partido Republicano.

No início de Março, o primeiro-ministro israelita discursou no Congresso norte-americano a convite do Partido Republicano, o que suscitou duras críticas vindas da Casa Branca. De acordo com o Wall Street Journal, Netanyahu partilhou então com vários membros do Congresso várias informações confidenciais sobre as negociações com o Irão.  

Este é outro ponto da investigação do Wall Street Journal refutado por Israel. Em declarações ao diário norte-americano, o porta-voz da embaixada israelita em Washington recusa a ideia de que o Governo de Israel tenha partilhado informações confidenciais com membros do Congresso. Aaron Sagui diz que apenas foi partilhada informação conhecida por todos os países envolvidos nas negociações e que “não foram dados detalhes específicos”.

Ainda sobre a ida de Netanyahu ao Congresso norte-americano, a investigação do Wall Street Journal informa também que Israel antecipava já consequências negativas para a relação diplomática com os EUA. Mas, avança o jornal, o primeiro-ministro israelita calculou no início do ano que a sua melhor hipótese de invalidar um possível acordo com o Irão seria fazer lobby em Washington.

Uma táctica que pode não ter corrido como esperado. Citando altos cargos no executivo israelita, o Wall Street Journal diz que a ida de Netanyahu ao Congresso acabou por deteriorar não só as relações entre o executivo israelita e o Governo de Barack Obama como também os laços com vários membros do Partido Democrata que poderiam ter bloqueado um possível acordo com o Irão. 

Reagindo às informações divulgadas, um membro do Governo de Netanyahu disse ao Wall Street Journal que, para além de "absolutamente falsas", as informações "pretendem claramente minar os fortes laços entre os Estados Unidos e Israel". 

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