Diplomacia começa a mobilizar-se por Gaza e palestinianos refugiam-se nas instalações da ONU

Na véspera da visita de vários ministros europeus para tentarem conseguir um cessar-fogo, aviso de Israel para evacuar Norte do território governado pelo Hamas gera movimento de fuga em massa.

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Palestinianos procuraram abrigo nas instalações das Nações Unidas em Gaza AFP/MAHMUD HAMS

O ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, Frank-Walter Steinmeier, é esperado segunda-feira em Jerusalém para uma ronda de encontros com líderes israelitas e palestinianos, tal como Federica Mogherini, a sua congénere de Itália, o país que actualmente preside à União Europeia. Mas a complicar os esforços diplomáticos internacionais está a “falta de apetite” de ambos os lados em conflito: nem os líderes políticos israelitas, nem os militantes palestinianos, estão dispostos a “engolir” um acordo de cessar-fogo em Gaza que não lhes permita, internamente, reclamar vitória. Milhares de palestinianos começaram ontem a abandonar as suas casas, no Norte da Faixa de Gaza, e a procurar refúgio em instalações das Nações Unidas, depois das Forças de Defesa de Israel (IDF) terem alertado para a iminência de um ataque pesado contra alvos do Hamas.

A situação só dá sinais de se agudizar. Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Palestiniana, pediu às Nações Unidas que coloquem a Faixa de Gaza sob a sua protecção, quando a escalada da operação militar israelita se mostra imparável.

Milhares de pessoas procuraram abrigo este domingo em instalações das Nações Unidas, depois de Israel ter aconselhado os palestinianos a evacuar o Norte de Gaza - de onde vêm grande parte dos rockets que chovem sobre as cidades israelitas. Em mensagens telefónicas em árabe, e panfletos lançados do ar, as forças israelitas aconselharam a população da cidade de Beit Lahiya a deixar as suas casas e procurar zonas de segurança.

Mas num território que no total tem apenas 40 quilómetros, não é fácil encontrar refúgio para uma comunidade de mais de 100 mil habitantes. “Não há como escapar, Deus já decidiu o nosso destino. Tanto faz ficar aqui ou ir para outro lado, até porque não há lugares seguros em Gaza”, dizia um comerciante local, Yasir Abu Odeh, à CNN.

Segundo o porta-voz da agência das Nações Unidas que apoia os refugiados palestinianos, Adnan Abu Hassna, mais de quatro mil pessoas estavam agora temporariamente alojadas em oito escolas da ONU em Gaza. A organização tenta encontrar outras alternativas para acolher as famílias em fuga das bombas israelitas.

Sábado, o Conselho de Segurança da ONU divulgou um comunicado apelando ao fim das hostilidades, ao respeito pela legislação humanitária internacional, e à retoma das conversações directas para um acordo de paz duradouro, baseado numa solução de dois Estados. Esses termos parecem ser consensuais entre a comunidade internacional – que, no entanto, ainda não foi capaz de designar um mediador credível para liderar as negociações entre israelitas e palestinianos.

Vários governantes estrangeiros mantiveram contactos ou estão de viagem para a região para tentar desbloquear o processo. A Liga Árabe agendou uma reunião, esta segunda-feira, para discutir a situação em Gaza. O britânico Tony Blair, o enviado especial do chamado Quarteto para a Paz no Médio Oriente (EUA, Rússia, União Europeia e ONU) encontrou-se com o novo Presidente do Egipto, Abdel Fattah el-Sisi, no Cairo, para tentar pressionar o país a por fim ao bloqueio da fronteira com Gaza e a envolver-se mais uma vez na negociação de tréguas. De lá, seguiu para a Cisjordânia.

Em Viena, à margem da cimeira P5+1 com o Irão, o ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Laurent Fabius, classificou a assinatura de um acordo de cessar-fogo como uma “prioridade absoluta” .

E no Vaticano, o Papa Francisco exortou “todas as partes interessadas e com responsabilidades políticas a nível local e internacional a não desistir dos esforços para cessar as hostilidades e alcançar a tão desejada paz para bem de todos”. Lembrando o seu encontro do mês passado com o líder da Autoridade Palestiniana, Mahmoud Abbas, e o Presidente de Israel, Shimon Peres, o pontífice sublinhou a importância de manter a comunicação entre os dois lados. “Não devemos resignar-nos ao ódio e à violência em vez do diálogo e da reconciliação”, recomendou Francisco.

Mas é preciso que haja vontade para dialogar. E ambos os lados têm exigências difíceis de aceitar para chegar à mesa de negociações. De acordo com o New York Times, entre as exigências do Hamas está a libertação de dezenas de prisioneiros palestinianos – militantes da organização que saíram da cadeia em 2011 por troca com o soldado israelita Gilad Shalit, preso durante cinco anos em Gaza –, que Israel voltou a encarcerar após o rapto e assassínio de três adolescentes judeus na Cisjordânia.

Pelo seu lado, o Governo de Telavive diz que um acordo com o Hamas já não passa apenas pelo fim do disparo de rockets para Israel. Terá de de prever a total desmilitarização do movimento islamista e restantes grupos armados de Gaza (como a Jihad Islâmica). “O objectivo da operação é restaurar a calma em Israel por um longo período, e ao mesmo tempo enfraquecer o Hamas e restantes organizações terroristas na Faixa de Gaza. É um objectivo que será alcançado pela via militar ou pela via diplomática”, afirmava um comunicado oficial.

Antes de entrar para a reunião do conselho de ministros de domingo, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu admitiu que a ofensiva militar israelita poderá prolongar-se por um prazo indeterminado. “Não sabemos quando vai acabar, ainda pode durar muito.” Israel já lançou mais de 1300 ataques aéreos sobre Gaza, confirmou o porta-voz das IDF, tenente coronel Peter Lerner. Pelo seu lado, o Hamas já disparou mais de 800 rockets para o outro lado da fronteira.

Os mísseis israelitas destruíram mais de 500 edifícios em Gaza – sedes do Hamas, casas de activistas e, desde sábado, também instituições civis que Telavive diz estarem ligadas ao movimento islamista. O número de mortos palestinianos desde o início da campanha aérea, na última terça-feira, já ascende a mais de 160 (segundo a ONU, dois terços das vítimas são civis, dos quais 30% são crianças).

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