Greve geral paralisa a Bélgica de Norte a Sul

Centrais sindicais uniram-se contra cortes previstos para os orçamentos dos próximos anos e aumento da idade de reforma. Transportes pararam e serviços públicos encerraram portas.

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Os transportes públicos pararam e mesmo quem foi trabalhar não escondeu o apoio ao protesto Francois Lenoir/Reuters

Uma greve geral paralisou nesta segunda-feira a Bélgica, onde transportes, serviços públicos e muitas empresas privadas não abriram portas. O protesto, com forte adesão em todo o país, tem por alvo um plano do recém-empossado governo de direita para reduzir em 11 mil milhões de euros os gastos nos próximos anos e aumentar em dois anos a idade de reforma.

Incidentes esporádicos ocorreram em Charleroi, no Sul – onde um automobilista forçou uma barreira montada por grevistas, ferindo três sindicalistas – e  em Bruxelas - onde houve confrontos entre a polícia e manifestantes que lançaram centenas de ovos contra a sede do partido nacionalista flamengo N-VA, que integra a coligação governamental. Os agentes usaram canhões de água e gás lacrimogéneo.

Os efeitos da greve começaram a sentir-se ainda no domingo. A partir das 22h (21h em Lisboa), os controladores aéreos suspenderam o trabalho e nenhum avião aterrou ou descolou dos aeroportos do país. Dezenas de voos foram desviados para aeroportos de países vizinhos e autocarros foram fretados para transportar os passageiros até ao seu destino. Só no aeroporto de Bruxelas mais de 600 voos tiveram de ser cancelados.

Os comboios deixaram de circular também durante a noite de domingo, não se prevendo qualquer trânsito pelo país dos serviços internacionais de TGV e Eurostar. As entradas em dois dos principais portos belgas foram também suspensas por razões de segurança e não havia serviços de transporte públicos na grande maioria das cidades, tanto na região da Flandres como na Valónia, adianta a AFP.

Escolas, infantários, repartições públicas e hospitais – onde só as urgências e serviços de internamento estavam a funcionar – aderiram ao protesto, engrossado com a adesão dos trabalhadores de vários sectores privados. O acesso à maioria das zonas industriais e a muitas empresas foi barrado por piquetes de greve, o que levou as associações patronais a denunciar junto das autoridades a alegada intimidação feita pelos sindicatos.

A verdade, no entanto, é que boa parte da população apoia o protesto das principais centrais sindicais contra a proposta do Governo liderado por Charles Michel que, pouco após a tomada de posse, em Outubro, anunciou cortes draconianos nos orçamentos dos serviços públicos, cultura e transportes no decorrer da actual legislatura. Pretende também aumentar para os 67 anos a idade legal de reforma (contra os actuais 65) e pôr fim já no próximo ano ao dispositivo que permitia a actualização anual dos salários de acordo com a inflação.

“Nunca houve uma greve com esta adesão, uma frente sindical assim unida, do Norte ao Sul, do Leste ao Oeste” do país, congratulou-se Marie-Hélène Ska, secretária-geral da CSC, a maior central sindical belga, de inspiração cristã. Por seu lado, o dirigente do sindicato socialista FGTB, Marc Goblet, avisou o executivo que serão estudadas novas jornadas de protesto “a partir de Janeiro” se o Governo “insistir na mesma lógica autista” de recusa de negociar.

Ainda antes do início do protesto, Bart De Wever, líder do N-VA, que pela primeira vez aceitou integrar o Governo federal, acusou a oposição socialista de, a coberto dos sindicatos, organizar uma “greve política” para pressionar o governo. Acusou ainda as centrais de “divulgarem informações falsas” sobre os efeitos que o plano de cortes terá nos seus orçamentos familiares, o que levou Marie-Hélène Ska a aconselhá-lo a “usar uma calculadora”.

Mas o protesto, idêntico ao que na sexta-feira paralisou Itália numa acção contra as reformas laborais do primeiro-ministro Mateo Renzi, está já a provocar as primeiras tensões na ampla coligação governamental. Nesta segunda-feira, o vice-primeiro-ministro e líder partido democrata-cristão flamengo CD&V criticou as afirmações do seu colega de Governo, ao dizer que “ao fazer declarações assim tão duras, não é possível juntar todos os parceiros sociais à volta da mesma mesa”, afirmou Kris Peeters, citado pela AFP.

Ainda assim, o primeiro-ministro reafirmou o desejo de relançar o diálogo social que há semanas está num impasse.

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