Erdogan procura fortalecer serviços secretos na Turquia

Mais uma acção de concentração de poder quando decorre uma investigação de corrupção ao primeiro-ministro turco.

Foto
Recep Tayyip Erdogan quer mais poder para os serviços de informação Susana Vera/Reuters

Primeiro foi a Internet, depois os tribunais, agora os serviços secretos – o Governo de Recep Tayyip Erdogan está a tentar fortalecer os poderes em várias áreas, numa altura em que o primeiro-ministro enfrenta um inquérito por corrupção.

A nova medida, detalhada numa proposta a que a agência Reuters teve acesso, prevê a possibilidade de escutas mais alargadas e imunidade legal para o chefe dos serviços secretos.

O texto da proposta, que ainda não é a versão final, prevê a introdução de penas de prisão até 12 anos para quem publicar documentos classificados que lhe tenham sido entregues.

Se aprovada pelo Parlamento, a lei daria aos serviços secretos autorização para levar a cabo operações no estrangeiro e para escutar chamadas de cabines telefónicas e também telefonemas internacionais. O chefe da agência apenas poderia ser julgado por um tribunal superior, e apenas depois de autorização do chefe de Governo.

Empresas privadas e instituições do Estado teriam de fornecer dados de consumidores e entregar equipamento técnico sempre que lhes fosse requisitado.

Esta medida é vista como mais uma resposta do primeiro-ministro ao escândalo de corrupção, que surgiu em Dezembro com a detenção de empresários próximos de Erdogan e levou à demissão de três ministros. É considerado o maior desafio ao poder do primeiro-ministro, no cargo há 11 anos, quando se aproximam eleições locais em Março e presidenciais em Agosto.

Vantagem à custa de polarização

Erdogan deverá ser o candidato do AKP (Partido da Justiça e Desenvolvimento) às presidenciais, uma hipótese fortalecida na quarta-feira, quando o actual Presidente, Abdullah Gül, assinou a controversa lei da Internet (depois de antes ter expressado “preocupações” com o seu conteúdo). O facto de Gül não ter recorrido ao veto significará, dizem analistas, que não é um rival de Erdogan, e não será uma alternativa para as presidenciais. “Este episódio mostra que há uma cooperação quase total entre os dois”, disse Fadi Hakura, analista do centro de estudos Chatham House, de Londres, ao canal de informação económica Bloomberg. A relação de Erdogan e Gül “envolve manobras menores, não uma luta de poder cataclísmica”.

A resposta de Erdogan ao inquérito (que classificou como uma “tentativa de golpe” e considera, sem o nomear, uma manobra do líder religioso Fethullah Gülen) foi uma purga na polícia e a redistribuição de juízes e procuradores do ministério público. O que provocou preocupação em Bruxelas e Washington e levou a uma diminuição da confiança dos investidores.

A lei da Internet permite que as autoridades bloqueiem e removam qualquer conteúdo que “ataque a vida privada” ou seja considerado “discriminatório ou insultuoso” quatro horas depois de uma denúncia, sem precisar de pedir uma ordem de um tribunal. Não haverá “restrições ou limites legais” à recolha de dados sobre todos os utilizadores de Internet. Provocou protestos em Istambul, com a polícia a usar gás lacrimogéneo para dispersar os manifestantes.

Com a lei do sistema judiciário, que aguarda ainda aprovação do Presidente, o Executivo terá mais poder na nomeação de juízes e procuradores. Durante a sua discussão no Parlamento houve a uma cena de luta entre deputados.

Todas estas medidas parecem ter dado a Erdogan uma vantagem, dizem analistas, mas à custa de uma grande desconfiança externa (tanto a nível político como económico) e de uma maior polarização do país, já dividido após os protestos do Parque Gezi.

Sugerir correcção
Comentar