Zona euro e FMI acordam ajuda financeira para Chipre

Acordo conseguido na madrugada desta segunda-feira. Depósitos bancários acima de 100.000 euros vão financiar reestruturação dos bancos.

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Cipriotas têm vindo à rua para protestar contra taxas sobre os depósitos Nuno Ferreira Santos

Os ministros das Finanças do euro e o FMI chegaram na madrugada desta segunda-feira a acordo sobre os termos de um pacote de ajuda para Chipre que implicará a participação dos depositantes acima de 100.000 euros no processo de reestruturação dos dois principais bancos, através de perdas dos seus activos.

O acordo abandona uma anterior ideia de taxar todos os depósitos bancários enquanto parte do esforço destinado a gerar 7000 milhões de euros de receitas por parte de Chipre, como contrapartida de um empréstimo de 10.000 milhões de euros.

O acordo implica o desmantelamento do segundo maior banco do país, o Laiki, a par da transferência dos depósitos inferiores a 100.000 euros – que estão protegidos por uma garantia europeia – e dos activos "sãos" para a maior instituição bancária, o Banco de Chipre.

Neste processo, os depósitos superiores a 100 mil euros, os accionistas e os detentores de títulos dos dois bancos vão ter de contribuir para cobrir as perdas sofridas, nomeadamente com a reestruturação da dívida grega operada pela zona euro e FMI no ano passado.

O Laiki, "popular" em grego, fará a maior contribuição. Este banco, que reunirá todos os activos "maus", começará de imediato a ser totalmente desmantelado. "A situação do Laiki é tão séria que [o banco] não podia ser salvo", afirmou Jeroen Dijsselbloem, ministro das Finanças da Holanda, que preside ao Eurogrupo. Segundo disse ainda, a contribuição dos depositantes, accionistas e detentores de dívida do Laiki representará 4200 milhões de euros do total de 7000 milhões que os bancos terão de gerar para assegurar o seu salvamento da falência.

O Banco de Chipre será, por seu lado, reestruturado com o objectivo de construir um núcleo duro de capitais próprios de 9% dos activos totais, precisou o ministro holandês.

A amplitude das perdas que serão exigidas antes de mais aos accionistas e aos detentores de títulos e, se necessário, aos depositantes acima dos 100.000 euros no Banco de Chipre "terá de ser calculada para ver que nível de haircut [corte de activos] terá de ser decidido para conseguir este rácio de capital", afirmou Dijsselbloem. Os dois bancos não receberão nenhuma ajuda dos 10.000 milhões que serão emprestados pela zona euro e pelo FMI.

Por seu lado, Chipre – que impôs o prolongamento de um feriado nacional de segunda-feira passada pelo menos até amanhã – terá de reinstituir de imediato controlos de capitais para evitar fugas maciças de fundos, sobretudo dos depositantes estrangeiros que beneficiam das condições particularmente favoráveis os bancos cipriotas.

Negociações estiverem em risco
O acordo foi concluído às primeiras horas desta segunda-feira pelos ministros das Finanças do euro, que se reuniram a partir do princípio da noite de domingo para aprovar os detalhes que foram sendo negociados ao longo de todo o dia, em Bruxelas, entre Nicos Anastasiades, Presidente cipriota, com os presidentes do Conselho Europeu, Herman van Rompuy, da Comissão Europeia, Durão Barroso, do Banco Central Europeu, Mario Draghi, e do Eurogrupo (e ministro das Finanças da Holanda), Jeroen Dijsselbloem, a par da directora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde.

Segundo vários diplomatas, as negociações estiveram em risco de fracassar, nomeadamente quando Anastasiades ameaçou demitir-se, acusando os seus interlocutores de estarem sucessivamente a subir o grau das suas exigências.

Confrontado com um pedido de confirmação desta ameaça, Dijsselbloem esquivou-se da questão. "Estive presente em todas as reuniões com o Presidente Anastasiades e não vou citar ninguém", afirmou, acrescentando que "foram negociações difíceis e intensas".

A decisão de infligir um haircut aos bancos substitui a controversa ideia de criar uma taxa extraordinária a todos os depósitos bancários – 6,7% sobre os montantes inferiores a 100.000 euros e 9,9% para os superiores – que foi acordada pela zona euro e FMI na primeira versão do pacote de ajuda a Chipre decidida no dia 16 de Março. O Parlamento cipriota recusou três dias depois uma versão mais suave desta medida, que isentava da taxa todos os depósitos até 20.000 euros.

A opção de financiar a reestruturação do sector bancário através de um haircut dos depósitos, acções e títulos em substituição da taxa bancária tem a vantagem de não precisar de ser aprovada pelo Parlamento cipriota, que já votou, no sábado, uma lei de liquidação dos bancos.

Já a criação de um imposto precisaria de ser votada no Parlamento, o que levantava uma grande interrogação sobre a sua aprovação. O próprio Anastasiades reconheceu, perante os seus interlocutores, que poderia não conseguir obter sequer o apoio dos deputados do seu partido conservador (20 num total de 56) para a medida, o que provocaria uma grave crise no país e na totalidade da zona euro.

Olli Rehn, comissário europeu responsável pelos Assuntos Económicos e Financeiros, reconheceu que, "dada a profundidade da crise financeira, o futuro próximo dos cipriotas será muito difícil".
 
 

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