Desigualdades salariais continuam a crescer na maior economia do mundo

O salário médio dos presidentes executivos nos Estados Unidos é 331 vezes superior ao salário médio dos trabalhadores. Era 301 vezes maior, há dez anos.

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As empresas valorizam-se am bolsa, mas os salários não aumentam

As desigualdades salariais na maior economia do mundo não têm parado de aumentar. Um estudo realizado pela confederação sindical AFL-CIO, que lançou uma petição nacional para forçar o aumento do salário mínimo, mostra que o salário médio dos presidentes executivos das empresas (CEO) dos Estados Unidos era, em 2013, 331 vezes superior ao de um trabalhador comum. Em 2003, o rácio era de 301 vezes mas se se recuar três décadas verifica-se que, então, o gestor ganhava apenas mais 46 vezes do que o funcionário.

O trabalho de análise lida com remunerações médias, mas mostra alguns exemplos do que são as discrepâncias no leque salarial no tecido empresarial norte-americano. Numa das tabelas publicadas no seu site, a AFL-CIO lembra que o salário médio norte-americano é de 16,94 dólares por hora, mas o presidente executivo da construtora automóvel Ford, Alan Mulally, é de 10.704 dólares por hora – 629 vezes mais do que o valor entregue a um trabalhador.

Uma das razões que têm contribuido para esta situação é o quadro de estagnação em que caiu o salário mínino nacional, que no espaço de dez anos (2003-2013) passou de 6,53 dólares por hora para 7,25 dólares por hora. Se no valor da remuneração mínima tivesse sido incorporada a taxa de aumento da produtividade nos últimos 30 anos, o valor a pagar estaria já nos 18,30 dólares. E cresceria para 31,45 dólares por hora se fosse considerado o valor da inflação, segundo os dados da central sindical.

A AFL-CIO tem em curso uma petição nacional em que reivindica o aumento do salário mínino para 10,10 dólares por hora, o que faria baixar o actual rácio face ao salário médio dos gestores, que está em 774 vezes. A central lembra que um trabalhador da Walmart que aufere o salário mínimo tem que trabalhar 1372 horas para conseguir o mesmo que o presidente, Michael T. Duke, já amealhou.

“A América é conhecida como a terra das oportunidades, um país onde trabalho duro e cumprimento das regras garantirá às famílias níveis de vida considerados de classe média. Mas nas décadas mais recentes, os CEO das empresas têm vindo a ficar a apropriar-se de uma fatia maior do produto económico enquanto os salários estagnam e o desemprego mantém-se em níveis elevados”, acusa a central sindical.

Esta estagnação nos níveis salariais da base face ao aumento assinalado no topo da pirâmide laboral não tem, sequer, justificação nos resultados das empresas, porque apenas nos últimos cinco anos as maiores companhias norte-americanas aumentaram em 38% os proveitos gerados por trabalhador, que estão agora em cerca de 41,249 dólares por ano.

A agência Reuters revelou, recentemente, um estudo que mostra que os 300 presidentes executivos que dirigiram as maiores companhias norte-americanas no período pós-crise (entre 2009 e 2013) acumularam remunerações que, em conjunto, ascenderam a 22 mil milhões de dólares, o equivalente a cerca de 20 mil milhões de euros, ou seja, 26% do valor do resgate financeiro a que Portugal teve de recorrer em 2011 para evitar a bancarrota.

Os dados foram compilados a partir da informação que a empresa Equilar disponibiliza, tendo por base os próprios relatórios oficiais das companhias cotadas. A conclusão é a de que nesses cinco anos os gestores receberam, em média, 73 milhões de dólares (cerca de 70 milhões de euros) em salários, bónus e as chamadas stock options (direito a acções da empresa).

O valor final das remunerações pagas aos 300 CEO é, no entanto, superior ao que à partida estava previsto nos relatórios das empresas em causa – cerca de 6000 milhões de dólares mais. A explicação para esta diferença está no facto de o valor das stock options que são entregues como parte da remuneração variável ser contabilizado à cotação das empresas no momento, mas muitos gestores só as executaram mais tarde e, entretanto, o preço dos títulos disparou em bolsa.

A Reuters sublinha, a este propósito, que o retorno das empresas que integram o índice das maiores cotadas norte-americanas (o S&P 500) – incluindo dividendos – valorizou-se 166% entre o final de 2008 até meados da semana passada, ajudando a engordar o pagamento dos gestores de topo. Enquanto isso, o rendimento médio das famílias caiu cerca de 4%, fazendo aumentar os níveis de desigualdade entre os mais ricos e os mais pobres.

Há analistas que defendem que este quadro resulta, em grande parte, da política de estímulos financeiros massivos a que a Reserva Federal norte-americana recorreu nos últimos anos para tirar a economia da estagnação. Ao valorizar o preço dos activos, este tipo de políticas acabou por ajudar os que já eram ricos, escreve a agência. “Os número podem ser considerados obscenos, especialmente se tivermos uma visão geral sobre os desafios que enfrentamos como economia e sociedade”, afirma Matthew Benkendorf, gestor de activos financeiros.

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